Eu pego? Não pego?

Suplementos anunciados na TV

Atualizado: 
30/10/2015 - 13:51
Enquanto consumidor deve saber distinguir se há benefícios para a saúde nos produtos que diariamente lhe procuram vender na TV, pela internet ou revistas. Se não sabe como, a solução é pedir ajuda a um profissional de saúde. Há sempre efeitos secundários com qualquer produto tomado.

Ultimamente tem-se assistido na televisão portuguesa ao crescimento acentuado de anúncios a suplementos alimentares (vitaminas e minerais) que prometem acabar com as dores articulares, regenerar a cartilagem, curar a osteoporose, etc.

Muitas pessoas questionam-se sobre a real eficácia dos ditos produtos. Frequentemente baseiam a sua atitude e avaliação na experiência de alguém conhecido, ou do conhecido de um conhecido, ao invés de profissionais de saúde.

Neste artigo abordarei alguns aspetos deste problema, apontando algumas formas de o cidadão tentar avaliar convenientemente estas situações.

O “filtro” científico por profissionais de saúde ao acesso a medicamentos reduziu significativamente desde 2005, ano em que foi liberalizado o mercado de venda de medicamentos não sujeitos a receita médica. Sabe-se hoje que, só nos últimos cinco anos, a venda deste tipo de medicamentos mais do que duplicou em Portugal1. Está, inclusivamente, neste momento em discussão o alargamento dos pontos de venda destes medicamentos, por exemplo a quiosques e gasolineiras...

Como diferenciar o que é credível, ou não? Consulte um profissional de saúde
A principal questão que se coloca é como pode o cidadão comum, sem conhecimento específico na área da saúde, diferenciar se determinado produto é credível ou não?

Esta não é uma tarefa fácil, sendo que até os profissionais de saúde precisam, quer de treino acrescido em metodologia científica, quer de sentido crítico para conseguir interpretar os resultados dos estudos publicados em revistas científicas.

Ao contrário do que muitas pessoas possam pensar, nem todos os artigos publicados nestas revistas são credíveis. Algumas delas possuem uma “capa” de cientificidade mas integram empresas recentes, de credibilidade duvidosa e centradas no negócio em detrimento da ciência. Nestas é possível, a troco de 2000-3000€, publicar de forma relativamente fácil (não me refiro ao pagamento de taxas para disponibilizar os artigos de forma gratuita na internet)2,3. Como tal, o primeiro e principal conselho que dou ao cidadão é para consultar um profissional de saúde antes de comprar estes medicamentos.

 Muitas vezes existem suplementos muito mais baratos e que passam por processos de produção muito mais rigorosos. Não se esqueça que nenhum produto é inócuo. Também por isso deverá referir a toma de “produtos naturais” quando lhe é pedido que informe da sua “lista de medicamentos”.

Deve ter ainda em mente que a informação transmitida na TV e noutros meios de comunicação (revistas, internet, etc.) é cada vez mais “cuidadosa e trabalhada”.

Verdadeiros apenas 23% dos anúncios a medicamentos na TV americana
Numa análise à veracidade do conteúdo das mensagens e slogans publicitários de anúncios a medicamentos na TV Americana, constatou-se4 que apenas 23% dos anúncios a medicamentos de venda livre eram objetivamente verdadeiros, 60% eram potencialmente enganadores e 17% eram falsos. De sublinhar que os Estados Unidos da América são dos poucos países no mundo onde a publicidade a medicamentos que necessitam de receita médica é também possível. Contudo, o debate alarga-se já a vários outros países, nomeadamente ao Brasil#.

Seja um consumidor informado. Saiba interpretar os anúncios da TV
Assim, a melhor maneira de se proteger contra produtos e serviços de saúde questionáveis é ser um consumidor informado. Existem alguns sinais de alarme que deverá avaliar em termos de técnicas de venda e publicidade, nomeadamente se5:

  • O vendedor promete resultados imediatos, garantidos e sem esforço;
  • O anúncio contém palavras como “revolucionário”, "milagroso", "especial" ou "segredo" – estes termos são utilizados para apelar às suas emoções e não são terminologias médicas ou científicas;
  • O produto ou serviço é um "remédio secreto" ou uma “descoberta recente” que não encontrará em qualquer outro lugar;
  • O produto é promovido como "natural", afirmando que vai ajudar a "desintoxicar", "revitalizar" e "purificar" o seu corpo;
  • O produto é promovido por figuras públicas destacadas;
  • O vendedor reivindica que o produto é eficaz para uma larga variedade de doenças, um "cura tudo" – quanto mais amplas as indicações, menos provável é que sejam verdadeiras;
  • Os anúncios apresentam depoimentos ou estórias de pessoas que foram "curadas";
  • O vendedor afirma que o produto está disponível em quantidades limitadas e apela à rapidez na compra, ou oferece vantagens (como o “dois por um”) a quem ligue primeiro;
  • Existe a promessa de satisfação total e de "garantia de reembolso".

O conselho final que reitero é de que procure o seu médico, farmacêutico ou enfermeiro para se aconselhar e encontrar soluções para o seu problema, que vão frequentemente além de medicamentos/suplementos.

Referências bibliográficas:
# Pode assistir a um debate televisivo muito interessante sobre “Propaganda de Medicamentos” em http://tvbrasil.ebc.com.br/vertv/episodio/propaganda-de-medicamentos
[1] “Consumo de MNSRM mais do que duplicou”. SIC Notícias (25/07/2015). Acessível em http://sicnoticias.sapo.pt/pais/2015-07-25-Consumo-de-medicamentos-de-venda-livre-duplicou-desde-2010-
[2] van Noorden, R. (2013). Open access: The true cost of science publishing: Cheap open-access journals raise questions about the value publishers add for their money. Nature, 495, 426–429 (28 March 2013). Dísponível em http://www.nature.com/news/open-access-the-true-cost-of-science-publishing-1.12676
[3] “Quanto custa publicar em acesso aberto?”. SciElo em Perspectiva (18/09/2013). Disponível em http://www.ufrgs.br/bibicbs/noticias/quanto-custa-publicar-em-acesso-aberto
[4] Faerber, A.E. e Kreling, D.H. (2014). Content analysis of false and misleading claims in television advertising for prescription and nonprescription drugs. J Gen Intern Med, 29(1): p. 110-8. Disponível em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3889958/
[5] Bellows, L. e Moore, R. (2013). Nutrition Misinformation: How to Identify Fraud and Misleading Claims. Disponível em http://www.ext.colostate.edu/pubs/foodnut/09350.html


Ricardo Ferreira

Enf. de Investigação. Serviço de Reumatologia – Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra EPE. Estudante de Doutoramento em Ciências da Saúde: Enfermagem - Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Vogal do CD da SRC da OE. [[email protected]]

Autor: 
Ricardo Ferreira
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro e/ou Farmacêutico.
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