Atividade física, exercício físico e desporto na idade sénior
Inicialmente, convém rever os seguintes conceitos:
- Atividade Física: movimentos corporais com contração de músculo-esquelético e que aumentam o dispêndio energético.
- Exercício físico: atividade física planeada e estruturada.
- Desporto: exercício físico que envolve competição.
Se, por exemplo, para definirmos o período da adolescência nos guiamos pelo inglesismo dos ‘teens’, quando é que realmente podemos dizer que a idade sénior se iniciou? No âmbito deste artigo em que esclareceremos questões relacionadas com a prescrição de exercício físico consideraremos os 65 anos como a idade de entrada na idade sénior. Também importa ressalvar que indivíduos com mais de 50 anos com doenças crónicas, com impacto clínico significativo ou com limitação funcional podem também seguir o mesmo tipo de recomendações.
Mas o que de facto acarreta este passar dos anos a que denominamos envelhecimento?
Resumidamente, exponho alguns dos seus principais efeitos no organismo humano que habitualmente se iniciam tão precocemente como entre os 25-30 anos de idade:
- Perda da capacidade do sistema cardiovascular em resposta ao exercício de cerca de 10% por década.
- Perda de 10% da massa muscular até aos 50 anos que é considerada a idade crítica para o músculo. Após esta idade o declínio da força muscular aumenta substancialmente sendo na ordem dos 15% nas décadas 60 e 70 e 30% nas décadas seguintes.
- Perda de mobilidade articular na ordem dos 7% à década.
- Alteração da composição corporal em favorecimento do ganho de gordura sobretudo a visceral (abdominal)
- Perda gradual da massa óssea sendo esta mais relevante na mulher pós-menopausa onde atinge percentagens de 3% ao ano.
Com um simples raciocínio será facilmente compreensível o que acarretam estas alterações. Uma perda da capacidade de adaptação a uma atividade física e uma diminuição da força muscular pode facilmente ter repercussões nas atividades da vida diária, inclusive na sua própria independência funcional e, consequentemente, na qualidade de vida do indivíduo.
Se associarmos, a estes fatores que levam a uma perda de capacidade para gerar energia, um aumento da percentagem de massa gorda (maior peso corporal que não contribui para a mobilidade do indivíduo) e, se a este cenário, já pouco favorável, ainda associarmos uma perda da mobilidade articular, podemos aumentar drasticamente o risco de quedas que num corpo que perde 3% de massa óssea ao ano pode levar a consequências muito relevantes como são as fraturas ósseas que, muitas vezes, nestas idades, deixam sequelas graves e podem mesmo levar à morte.
Também é sobejamente conhecido e cientificamente comprovado que o processo de envelhecimento acarreta muitas outras alterações (fora do âmbito deste artigo) que levam a uma correlação positiva entre uma grande maioria das doenças crónicas (responsáveis por uma elevada taxa de mortalidade e morbilidade) e a idade. Neste grupo de doenças, que são transversais aos vários órgãos e sistemas, encontramos as Doenças Cardiovasculares e Cerebrovasculares, a Hipertensão, os Diabetes Tipo II, a Obesidade, vários tipos de Cancro, a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica, a Insuficiência Renal Crónica, a Osteoporose e a Osteoartrose, a Demência e a Depressão.
Parece claro que o envelhecimento condiciona alterações estruturais e fisiológicas com repercussões significativas na qualidade de vida do indivíduo. A sociedade atual compreende bem a importância do envelhecimento de forma saudável e é aqui que entra o exercício físico (EF), como um dos principais pilares deste paradigma.
No contexto deste artigo, o EF pode ser dividido em 4 categorias diferentes:
- Treino aeróbio (TA): que aqui será referido a exercícios que perdurem no tempo que envolvam grandes grupos musculares de forma rítmica.
- Treino de Fortalecimento Muscular: exercício com trabalho muscular contra uma força/peso aplicado.
- Treino de Flexibilidade (FX): atividades que promovem a manutenção ou aumento das amplitudes articulares
- Treino de Equilíbrio (EQ): atividades para melhoria da força e da reação muscular dos membros inferiores que reduzem a possibilidade de quedas.
Estudos em populações envelhecidas de forma saudável revelam que estes indivíduos são, geralmente, socialmente ativos, otimistas, com cuidados alimentares e de higiene do sono e com elevada atividade física.
Também muito bem documentados estão os efeitos do exercício físico nesta população e nestas doenças que citamos:
- Relativamente às patologias que enumerei acima, o EF tem 2 papéis fundamentais: 1º previne o seu aparecimento; 2º atua como ferramenta terapêutica se a patologia já estiver instalada.
- A perda de capacidade cardiovascular pode facilmente ser atenuada com exercícios de treino aeróbio (TA) de moderada intensidade.
- A perda da massa muscular e, consequentemente, da força muscular podem facilmente ser combatidas por programas de fortalecimento muscular (FM).
- A manutenção das amplitudes articulares pode ser atingida com exercícios regulares de flexibilidade.
- O EF é um dos principais fatores que permite conservar uma composição corporal adequada, tanto através do TA como através de programas de FM.
- É possível limitar a perda gradual da massa óssea sobretudo com programas de FM.
Se o envelhecimento é inevitável e trás consigo efeitos biológicos deletérios e uma maior propensão à aquisição de patologias que, em ambos os casos podem por em causa a nossa saúde e, em última análise, a nossa qualidade de vida;
Se o exercício físico demonstrou grande eficácia na atenuação desses efeitos bem com um papel preventivo e mesmo terapêutica na grande maioria das doenças que se correlacionam com a idade;
Então deveremos concluir que a fase da vida em que mais beneficiamos da prática regular do EF é na idade sénior.
Feitas todas estas considerações, as próximas linhas do artigo são destinadas às recomendações para obtermos os efeitos desejáveis com a prática do EF. Na tabela 2, encontram um resumo das mesmas.
Treino Aeróbio:
(Caminhadas, Corrida, Natação, Hidroginástica, Ciclismo, Aulas de ‘cardiofitness’…)
- Principiantes deverão iniciar estas atividades com intensidade moderada (Tabela 1) com uma frequência de 5 dias/semana com duração superior a 30’ e inferior a 60’.
- Indivíduos com capacidade para optar por atividades de alta intensidade (7-8 Escala de Perceção de Esforço - EPE) deverão realizá-las 3 dias/semana numa duração entre 20’ a 30’.
Caso haja interesse ou necessidade em aumentar a carga total, esta não deverá exceder os 5% por semana.
Treino de Fortalecimento Muscular:
Pode ser realizado com pesos livres, materiais de resistência variável (elásticos) ou máquinas mais ou menos funcionais. Nestas faixas etárias são preferidos exercícios em máquinas que controlem o movimento por serem, pelo menos numa fase inicial, mais seguros.
- Entre 2 a 3 vezes/semana sendo que obrigatoriamente deverá existir um período de 48 horas entre sessões.
- As sessões deverão contemplar 8 a 10 exercícios utilizando os principais grupos musculares e durando uma média de 30’.
- Cada exercício deverá ser realizado 1 ou 3 vezes (séries) com intervalos de recuperação de 2’ a 3’ e terá de 10 a 15 repetições sendo que a última repetição deverá ser realizada em fadiga (correspondente a 65-75% de uma repetição máxima - RM).
As primeiras 4 semanas deverão ser feitas com supervisão e carga reduzida (sem fadiga às 25 repetições) para familiarização com o exercício, preparação do sistema músculo-esquelético e, dessa forma, reduzir o risco de lesão.
O ajuste de cargas (quando necessário) deve ser feito mensalmente.
Treino de Flexibilidade:
- Mínimo de 2 dias/semana, englobando os principais grupos musculares.
- Mínimo de 30 segundos/alongamento com sensação de desconforto - repetir 3 a 4 vezes.
Treino de Equilíbrio:
Também conhecido como treino propriocetivo ou de coordenação neuromuscular, tem particular interesse em grupos com risco acrescido de queda.
O Tai Chi é um dos melhores exemplos deste tipo de treino.
- Idealmente num total de 20’, 3 dias/semana.
Tabela 1
Tabela 2