Autismo – Uma doença rara
Os últimos dados relativos à prevalência a nível internacional apontam para que 5 em cada 10 mil indivíduos apresente "autismo clássico" e que os valores se elevam a 1 a 2 por 1.000 quando o diagnóstico alargado, ou seja, quando se consideram todas as "Perturbações do Espectro Autista" (PEA). É de realçar que o autismo é mais frequentes no sexo masculino do que feminino, numa razão de 5:1
O Autismo é uma perturbação do desenvolvimento global da criança, caracterizada pela presença simultânea de uma tríade de perturbações (tríade de Wing):
- Défice na interação social;
- Défice da comunicação;
- Défice da imaginação/capacidade simbólica (comportamentos, interesses e atividades repetitivas e estereotipias).
Apesar deste tronco comum de dificuldades, estas expressam-se em cada criança de forma diversa, tornando-se necessária uma observação cuidada para identificar as suas necessidades individuais, assim como áreas fortes. A forma e a intensidade com que cada uma destas áreas de dificuldade se expressa, resultam numa imensa variabilidade dentro do diagnóstico das Perturbações do Espectro do Autismo (PEA).
Etiologia
Desconhecem-se as causas que conduzem ao autismo. No entanto, e apesar de diversas teorias que colocam hipóteses explicativas, há um consenso generalizado na comunidade científica de que se trata de uma perturbação neurodesenvolvimental em que haverá uma predisposição ou determinação genética associada.
Sinais do autismo
Um diagnóstico precoce e uma intervenção adequada são fundamentais para que se consiga um desenvolvimento mais harmonioso das crianças com autismo.
Um diagnóstico seguro de Autismo é geralmente feito pelos 3 anos de idade. Aos 18 meses já é possível detetar nestas crianças um conjunto de características, cuja presença é um indicador bastante seguro de perturbação autística.
Sinais de Alarme
(A pesquisar na avaliação da criança aos 18 meses)
- Isolamento – falta de interesse pela relação com os outros;
- Ausência de jogos de imitação – dizer adeus; jogo do cu-cu …
- Ausência do jogo do faz de conta – o brinquedo não é usado na sua função simbólica;
- Ausência da atenção partilhada – não chama a atenção do outro para objetos ou acontecimentos, não mostra dói-dói e nem vai mostrar um brinquedo;
- Ausência de apontar protodeclarativo – não usa o dedo para apontar no sentido de partilhar interesse/mostrar alguma coisa;
- Apontar protoimperativo – usar o dedo para apontar mas com o objetivo de pedir/exigir algo. Pode estar presente.
Sinais inespecíficos mas preocupantes
(Podem estar presentes desde o nascimento)
Até aos 18 meses:
Por vezes podem ocorrer:
- Alterações alimentares (dificuldades de sucção, recusa do seio/biberão, anorexia e vómitos);
- Alterações do sono (insónia);
- Choro persistente (“bebé terrível”) ou ausência de choro (“bebé modelo”, especialmente se deixados sós);
- Apatia (indiferença ao que rodeia);
- Ausência de comportamentos de ligação:
- Contacto visual (não comunicam pelo olhar – olhar fugidio e evitamento do olhar)
- Não manifesta desejo de ser pegado ao colo (estender os braços e sorrir)
- Não responde com um sorriso do outro;
- Perturbações do tónus (é difícil pegar nestes bebés são rígidos ou moles, não se moldam ao corpo);
- Não manifestam medo de estranhos (como acontece geralmente com bebés sem problemas pelos 6-8 meses);
- Vocalizações muito pobres ou inexistentes;
- Respostas inconsistentes aos sons (surdez aparente);
- Movimentos estereotipados (balanceio do corpo, abanar a cabeça, posições bizarras não usuais noutras crianças);
- Estes bebés parecem mais satisfeitos se deixados sós e mantendo o ambiente inalterado.
Cada pessoa com Autismo tem a sua própria personalidade, sendo um indivíduo único. As pessoas com autismo não constituem necessariamente um estereótipo, podendo revelarem-se muito diferentes umas das outras.
Manifestações mais comuns
- Isolamento
- Ausência/alterações ao nível da linguagem
- Evitamento do contacto visual
- Desinteresse pelas pessoas e/ou jogos (brincar)
- Medos pouco usuais
- Uso inadequado de objetos
- Resistência a aprendizagem
- Girar obsessivamente objetos
- Riso ou choro sem motivo aparente
- Ausência da consciência do perigo
- Inconsistência nas respostas aos sons
- Ligação obsessiva a objetos
- Rejeição do contacto físico
- Resistência à mudança
- Comportamentos e atividades repetitivas e estereotipadas.
Isolamento
Crianças com autismo manifestam um aparente alheamento relativamente ao meio, não mostrando interesse no contacto com outras pessoas. Não interage com outras crianças ou adultos, mas quando interagem fazem-no de forma inadequada.
Ausência/alterações ao nível da linguagem
Cerca de 50% das pessoas com autismo não desenvolvem a linguagem (às vezes este é o primeiro sinal de alarme para os pais). Os que têm linguagem apresentam alterações significativas, nomeadamente dificuldade ou incapacidade de usar a linguagem na comunicação com o outro. Dificuldade ou incapacidade de falar na primeira pessoa (não dizem o “eu”, referem-se a si próprios na segunda ou terceira pessoa). Respondem repetindo a pergunta ou parte dela (ecolalia). Alterações no tom e ritmo do discurso. Dificuldades na compreensão da linguagem, interpretação no sentido literal, dificuldade em “apanhar o segundo sentido”, p.ex., um comentário do tipo “o ar hoje está pesado” é entendido no sentido literal, ou seja a criança entendeu que o ar pesa – quilogramas.
Evitamento do contacto visual
Normalmente não estabelece contacto visual direto (olhos nos olhos) com as pessoas e/ou atividades do momento (p.ex., quando pintam não olham para o papel), dependendo mais do olhar periférico “pelo canto do olho”. Por vezes olham o outro mas aparentemente sem o ver (como se fosse transparente).
Desinteresse pelas pessoas e/ou jogos
Crianças com autismo não têm capacidade espontânea para iniciar um jogo com significado que envolva a imaginação – jogo simbólico, faz de conta. Tendem a envolver-se em atividades repetitivas não interagindo com as outras crianças ou adultos, p.ex., preferem atirar uma bola contra a parede do que para outra pessoa. Preferem brincar sozinhas.
Medos pouco usuais
Crianças com autismo respondem aos estímulos sensoriais (visão, olfato, tato, paladar e audição) de maneira pouco previsível, p.ex., estímulos visuais com cores brilhantes podem fascinar algumas e provocar ansiedade ou medo irracional noutros. Estas crianças têm dificuldade em regular os estímulos sensoriais.
Uso inadequado de objetos
Crianças com autismo parecem fascinadas por partes de brinquedos, como as rodas de um carro, não mostrando interesse pelo brinquedo em si.
Com frequência desenvolvem uma ligação obsessiva com determinados objetos, podendo a perda destes causar um estado de grandes ansiedade e excitação.
Resistência a aprendizagem
Crianças com autismo têm grandes défices na área da comunicação, isto é dificuldades em compreender tanto as instruções verbais como não verbais, (gestos, mímica, expressões faciais, etc.)
Parecem mostrar pouco interesse e rejeitar as tentativas de aprendizagem, especialmente quando não há uma recompensa imediata.
Girar obsessivamente objetos
Objetos redondos e suscetíveis de poderem rodar produzem uma enorme atração, p.ex., colocam um carro de perna para o ar e fazem rodar incessantemente as rodas.
Riso ou choro sem motivo aparente
Crianças com autismo podem rir, chorar ou gritar em situações inapropriadas e sem motivo aparente, p.ex., riem-se quando alguém grita ou ficam com medo quando alguém ri.
Em algumas crianças estas atitudes desajustadas prolongam-se criando situações de grande ansiedade, tanto para elas como para os pais.
Ausência da consciência do perigo
Ausência de receio de perigos reais e medo irracional de situações comuns. Isto poderá ser consequência da falta de compreensão das situações ou seja, não estabelecem a correlação entre causa e efeito.
Inconsistência nas respostas aos sons
Crianças com autismo podem ignorar sons altos e reagir a um murmúrio ou ao roçar das folhas de papel. Em muitas circunstâncias poderá parecer que têm problemas de audição (surge então a hipótese da surdez).
Ligação obsessiva a objetos
Muitas crianças com autismo estabelecem ligações bizarras a certos objetos ou a partes de objetos, como pedras, peças de brinquedos, etc. Poderão ficar fascinados por objetos que produzam som (copos, campainhas, …). Os objetos são muitas vezes selecionados por uma característica particular (cor, textura e forma) e são transportados para toda a parte. Ficam tensas ou mesmo em pânico se alguém pretende tirar-lhos.
Rejeição do contacto físico
Muitas crianças com autismo podem resistir ou mostrar desagrado a serem pegadas ou tocadas. Não é raro os pais dizerem “ele estava tão feliz quando estava sozinho, mas começou a gritar e a chorar quando o peguei ao colo”. Muitas crianças não exibem movimentos de antecipação para serem pegadas ao colo, adotando a postura de boneco”. Com frequência, mesmo em situações geradoras de stress, não procuram o necessário conforto, ajuda ou segurança junto de adultos ou de outras crianças. A sua capacidade em mostrar empatia é invariavelmente deficiente, traduz-se numa perturbação da interação social e dificuldades no estabelecimento de relações de amizade.
Resistência à mudança
Com muita frequência estas crianças aderem de forma inflexível a determinadas rotinas, geralmente não funcionais, e que assumem uma forma doentia, p.ex. quando vão para a escola têm de ir sempre pelo mesmo caminho e para se vestirem têm de seguir uma determinada sequência.
Há uma intolerância às mudanças de ambiente (pequenas mudanças verificadas no quarto poderão produzir uma grande irritabilidade).
As crianças com autismo sentem-se mais seguras e confortáveis em ambientes estruturados e previsíveis. Qualquer alteração ou desvio à rotina não planeada podem causar ansiedade e conduzir a comportamentos bizarros ou a um estado de extremo stress.
Comportamentos e atividades repetitivas e estereotipadas
Tendência a manterem-se em atividades repetitivas, estereotipadas e rotineiras. Podem tratar-se de rotinas simples ou extremamente complexas, p.ex., bater em superfícies, balancear, cheirar pessoas e coisas, abanar os braços, torcer os dedos, com os braços fletidos fazer batimentos repetitivos das mãos, colecionar os mais diversos objetos/partes de objetos/lixos, alinhar objetos, etc.
O autismo é uma doença. Os autistas são crianças e adultos com sentimentos e muitas outras características além do autismo. É preciso respeitar a diferença e apoiar quer a criança/adulto quer os seus familiares. Este apoio faz toda a diferença...
Texto autorizado pela Farmácia Fátima Marques