4 de Dezembro - Dia Nacional

Esclerose Múltipla: a segunda maior causa de incapacidade nos jovens adultos

Atualizado: 
04/12/2014 - 09:51
Assinala-se hoje, o Dia Nacional da Pessoa com Esclerose Múltipla, este ano uma data especial já que no mesmo dia a Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla comemora 30 anos de existência.
Esclerose Múltipla

A existência de um Dia dedicado à Esclerose Múltipla (EM) representa “uma enorme ‘ajuda’ na divulgação da Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM), da doença e das necessidades e apoios de que carece”, explica Manuela Duarte Neves, Secretária Geral da SPEM, acrescentando que, “normalmente nesta data os meios de comunicação dão-nos uma atenção que não temos durante o resto do ano e a realização de actividades são um bom pretexto para o aumento da visibilidade externa, tanto no que diz respeito à Sociedade Civil como da parte de entidades públicas das áreas da saúde e social”.

A EM é uma doença desmielinizante crónica, inflamatória e degenerativa, que afecta o Sistema Nervoso Central (cérebro e espinal medula) através do ataque e destruição da mielina, a substância que cobre os nervos. “É a rapidez dos impulsos nervosos que permite o fluir normal de funções como o equilíbrio, andar, falar, controlo da bexiga, visão, etc.”, descreve fonte médica da SPEM.

Assim, para assinalar o Dia Nacional da Pessoa com Esclerose Múltipla a 4 de Dezembro (o Dia Mundial comemora-se na última quarta-feira do mês de Maio) a SPEM realiza várias actividades um pouco por todo o país a partir das várias delegações.

“Aqui em Lisboa, teremos um lanche convívio onde os utentes do Centro de Actividades Ocupacionais que farão um recital de poesia, sob a coordenação da actriz Amélia Videira”, diz Manuela Duarte Neves. É também neste dia que a Associação de doentes comemora 30 anos de existência. “Uma data importante, pelo longo caminho percorrido pela instituição e pelo papel que já consolidou na sociedade portuguesa”, refere a responsável. Um papel em luta e defesa do bem-estar dos doentes portadores desta doença ainda sem cura, mas com tratamento que permite atrasar a progressão da doença na maioria dos casos, sobretudo se forem iniciados logo nas primeiras manifestações.

“Felizmente, com os progressos da medicina, os tratamentos vão sendo cada vez mais eficazes. Deste modo, podemos afirmar que, o diagnóstico de EM nos nossos dias é substancialmente diferente do que acontecia à 20 anos atrás, em que representava, quase sempre, uma notícia de incapacidade futura e maior sofrimento”, esclarece o especialista médico da Associação, sublinhando que, são muitos os doentes que fazem a sua vida perfeitamente normal, a nível de trabalho, família e relações sociais.

Sabe-se que a EM afecta mais mulheres do que homens, na proporção de 3 para 1, sendo que o diagnóstico surge frequentemente entre os 20 e os 40 anos de idade. Segundo o especialista “esta doença neurológica é a segunda maior causa de incapacidade nos jovens adultos, logo a seguir aos acidentes de viação”.

Nas comemorações da efeméride, Manuela Duarte Neves destaca como ‘ponto alto’ das comemorações a realização do XI Congresso, na Faculdade de Farmácia, em Lisboa, que este ano debaterá o tema do ‘Acesso’ na mais alargada perspectiva. Ou seja, sob o prisma do medicamento, médico, inovação científica, barreiras arquitectónicas, etc. “O tema foi-nos proposto para ser desenvolvido, durante o ano de 2014, pela Federação Internacional de Esclerose Múltipla, de que a SPEM é membro. Teremos também, no Congresso, a presença de ilustre entidades portuguesas na área da saúde, como é o caso do Senhor bastonário da Ordem do Médicos do Senhor Director Geral de Saúde”.

Sintomas e diagnóstico
Os sintomas mais comuns da doença são “a visão enevoada ou dupla, fraqueza nas pernas e braços, desequilíbrios, alterações cognitivas e fadiga”. Porém, as manifestações variam muito de pessoa para pessoa, não só porque cada caso é um caso, mas porque “o sistema imunitário ataca a mielina e existe, em paralelo, um processo degenerativo de causas ainda desconhecidas, pelo que ficam comprometidas diferentes funções consoante a localização das lesões. Estes factos fazem com que cada doente tenha manifestações diferentes ao longo da vida, apesar da doença ser a mesma”, explica o especialista da SPEM.

A evolução da doença é imprevisível e algumas pessoas atravessam períodos de surto, que correspondem ao agravamento de um ou mais sintomas, e voltam a recuperar quase na totalidade. “Esta é a forma de EM por Surto Remissão, a mais comum, mas em alguns doentes, o padrão é progressivo logo desde o início ou agrava-se com o passar do tempo, ditando a acumulação de incapacidade e consequente perda de autonomia”, comenta o responsável médico.

Habitualmente o diagnóstico da EM é feito em média entre os 20 e os 40 anos. “Realiza-se com base nos sintomas e história clínica da pessoa e com recurso a exames complementares: Ressonância Magnética Nuclear (RMN), Estudo de Potenciais Evocados (visuais, auditivos e sensitivos) e Punção Lombar”.

Uma vez que a EM pode manifestar-se com sintomas idênticos aos de outras patologias do Sistema Nervoso Central, o diagnóstico terá de ser feito excluindo primeiro outras doenças. “Isto acontece por várias razões, nomeadamente a doença não ser muito prevalente, logo confundida com outras doenças de sintomatologia semelhante (como o caso da depressão ou problemas da coluna) e a pessoa desvalorizar os primeiros sintomas”, alerta o especialista.

Existem ainda casos em que a EM é diagnosticada ‘por acaso’, quando uma pessoa faz uma RMN por outros motivos e são descobertas lesões desmielinizantes características da doença, embora não seja o mais frequente. “O normal é serem determinados sintomas que forçam a ida ao médico de família ou de outra especialidade”, diz o mesmo especialista.

Dificuldades e constrangimentos dos doentes
“São de vária ordem as dificuldades com que se debatem os doentes de EM. Desde logo, trata-se de uma doença de gente jovem e que pode ser incapacitante”. Por essa razão existe uma elevada prevalência (número de casos) de doentes que nunca teve uma vida profissional activa, ou se a teve foi por pouco tempo. “Desta situação resulta uma carreira contributiva curta ou inexistente e, logo, pensões de valores reduzidíssimos”.

Também no que toca à aquisição de medicamentos, para além dos específicos para a doença que são 100% gratuitos para os doentes, é muito vulgar que os doentes tenham que recorrer a medicação de outras especialidades, como por exemplo, urologia ou psiquiatria. “Nestes casos, não há qualquer benefício adicional para o doente, por ter EM”.

Além do mais, a Secretária Geral da SPEM refere que, “importa não perder de vista que as necessidades de um doente que esteja incapacitado são maiores e substancialmente mais caras. Refiro-me a situações de necessidade de apoio domiciliário, seja para higiene pessoal, seja para higiene de habitação, tratamento de roupas e confecção de refeições. Por outro lado, alguns doentes têm necessidades especiais decorrentes da própria condição de incapacidade, das quais resultam graves constrangimentos económicos”.

É verdade, infelizmente, existem constrangimentos em função das dificuldades económicas do país: “Desde logo, na quantidade de medicamento disponibilizado pelos hospitais, que obriga o doente a várias deslocações à farmácia hospitalar, tantas vezes com enorme sacrifício económico e de saúde; Por outro lado, no que toca ao transporte de doentes, cada vez mais dificultado, o que acarreta, muitas vezes, a absoluta impossibilidade de deslocação dos doentes; Também pelo facto do elevado número de doentes e reduzido número de neurologistas, que impedem que as consultas a todos os doentes se processem a níveis convenientes”.

Manuela Duarte Neves explica que “chegou a haver uma tentativa, sobretudo da parte de alguns hospitais do norte, para terem apenas um medicamento disponível para todos os doentes, independentemente da decisão de prescrição do médico. Tudo isto para permitir aquisições aos laboratórios mais competitivas, sem a atenção devida à condição de cada doente”.

Graças à intervenção da SPEM junto dos poderes políticos – um dos papéis essenciais da Associação – na defesa dos direitos dos doentes de esclerose múltipla, a decisão dos hospitais “retrocedeu” e continuam a ser disponibilizados os medicamentos que existem no mercado. São sete os medicamentos disponíveis no Sistema Nacional de Saúde para a esclerose múltipla e compete ao médico que segue cada doente a prescrição do medicamento específico e adequado a cada doente.

Incidência e prevalência em Portugal
Existem poucos estudos nesta área e falta um estudo epidemiológico nacional. A estimativa aponta para que a prevalência se situe acima dos 8 mil doentes com EM.

A informação mais recente sobre a prevalência tem por base a tese de doutoramento do Prof. João Correia de Sá, intitulada ‘Captura-recaptura como método epidemiológico a aplicar à Esclerose Múltipla’. Citando o autor: "A taxa bruta de prevalência estimada, 46,3/100.000, confirma a hipótese formulada, segundo a qual a frequência da EM em Portugal havia sido previamente muito subestimada (pág. 191). Este valor sobe ligeiramente para 49,1/100.000, quando se procede ao ajuste directo à população básica europeia o que é conveniente para permitir estabelecer comparações fidedignas com outros estudos." (pág. 147, 2014).

Em 2011, o site da SPEM e o jornal Público fizeram referência ao estudo ‘EMCoDe: Esclerose Múltipla - Conhecer e Desmistificar’ da autoria do Grupo de Estudos de Esclerose Múltipla, com o apoio da Merck Serono. O estudo foi feito através de entrevistas por telefone a 20.057 indivíduos, uma amostra aleatória representativa da população portuguesa. Foram encontrados 22 doentes confirmados. Extrapoladas para a população nacional com mais de 18 anos, as contas apontam para 4.287 portugueses afectados com esta doença degenerativa. São, na maioria, mulheres: 3.163 contra 1.171 homens.

“Uma vez que se estima que actualmente mais de 5 mil doentes com EM estejam em tratamento, a prevalência deverá ser maior que os dados anteriores. Coincidente com esta informação, encontra-se o estudo sobre ‘Acesso a Tratamentos Inovadores na Esclerose Múltipla na Europa’, realizado por Gisela Kobelt e Frida Kasteng, em 2009. Segundo estas autoras, a prevalência da EM em Portugal é de 83,8/100.000, com base numa extrapolação e ajuste com os dados epidemiológicos de Espanha”, esclarece a especialista.

Com base nos dados da Organização Mundial da Saúde e do Atlas da EM existem no mundo cerca de 2.300.000 pessoas com EM.

Fontes:
www.spem.pt/esclerose-multipla/o-que-e-a-esclerose-multipla
www.msif.org/about-ms/what-is-ms
www.atlasofms.org

Estudos:
2009 – Access to innovative treatments in Multiple Sclerosis in Europe
Maior estudo de sempre descobre genes associados à esclerose múltipla
2011 - EMCode: Esclerose Múltipla – Conhecer e Desmistificar (GEEM)
Esclerose Multipla - conhecer e desmistificar
Maior estudo de sempre descobre genes associados à esclerose múltipla
www.publico.pt/Ci%C3%AAncias/maior-estudo-de-sempre-descobre-genes-associados-a-esclerose-multipla_1507215
2014 - Captura-recaptura como método epidemiológico a aplicar à Esclerose Múltipla (Prof. João Correia de Sá)
Tese - Captura-recaptura como método epidemiológico a aplicar à Esclerose Múltipla

Autor: 
Célia Figueiredo
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro e/ou Farmacêutico.