Raquitismo Hipofosfatémico: apesar de raro e incapacitante tem tratamento
O termo raquitismo talvez o remeta para uma das principais complicações do défice de vitamina D nas crianças. No entanto, a doença que descrevemos hoje - o Raquitismo Hipofosfatémico - trata-se de uma patologia genética rara “em que os rins perdem fosfato originando falta de mineralização do osso em crescimento”. Segundo a nefrologista pediátrica, Isabel Castro, “os níveis elevados de FGF 23 (fator de crescimento do fibroblasto 23) são os responsáveis diretos pela perda tubular de fósforo e ainda por redução da produção de vitamina D ativa (calcitriol) que no seu conjunto são responsáveis pela não mineralização óssea”.
Embora maioria das doenças hipofosfatémicas sejam hereditárias, “frequentemente com transmissão ligada ao cromossoma X”, há casos (poucos!) em que estas se devem à existência de tumores benignos produtores do fator de crescimento do fibroblasto 23, e que dão origem a quadros semelhantes ao que estamos a retratar. A principal diferença é que estes se resolvem “completamente com a extirpação do tumor”.
No que diz respeito aos sintomas, estes só poderão tornar-se evidentes a partir de determinada idade. “Mesmo quando há história familiar de raquitismo hipofosfatémico, é muito raro o diagnóstico nos primeiros meses de vida. Assim, embora o diagnóstico precoce seja crucial para se obter melhor crescimento e menores deformações ósseas, na prática ele ocorre acima dos 6 meses, sendo necessário um elevado nível de suspeição”, explica a especialista apontado como as principais manifestações clínicas a redução da velocidade de crescimento – “geralmente o comprimento ao nascer é normal surgindo progressivamente perda de velocidade de crescimento e baixa estatura”; o atraso na erupção dos dentes, com os primeiros dentes a nascer depois dos 12 meses e a presença de alterações dentárias.
Por outro lado, pode observar-se atraso do desenvolvimento psicomotor, “nomeadamente sentar, levantar ou andar”, ou existir regressão no desenvolvimento destas competências.
Segundo Isabel Castro, podem observar-se ainda deformações esqueléticas, tão características do raquitismo, na “cabeça, punhos, costelas e /ou principalmente pernas arqueadas após início da marcha”.
O atraso no encerramento da fontanela anterior e fraturas espontâneas são outros dos sinais desta doença.
“O diagnóstico é essencialmente clínico, através da observação, complementado por exames laboratoriais (função renal, função hepática, cálcio, fósforo, PTH, vitamina D - 25(OH)D3 e doseamento urinário de fósforo e cálcio, por exemplo), exames radiológicos e estudo genético”, explica a especialista.
Quanto ao tratamento, e ao contrário do que acontece com muitas doenças raras, ele existe e passa, “essencialmente pela administração oral de doses adequadas de fósforo e calcitriol”. “Atualmente já existe um anticorpo monoclonal anti FGF 23 que constitui uma arma terapêutica específica” contra a doença.
A cirurgia ortopédica corretiva pode ser necessária sobretudo “nos casos de atraso diagnóstico ou não cumprimento da terapêutica”. Neste último caso podem surgem ainda outras complicações para além daquelas tão características da doença. A nefrocalcinose ou o hiperparatiroidismo surgem habitualmente na sequência do mau controlo terapêutico.
A nefrocalcinose (caracterizada por depósitos intrarrenais de cálcio) é muitas vezes responsável pela insuficiência renal crónica e o hiperparatiroidismo secundário e até terciário pode levar ao desenvolvimento de hipercalcemia, complicações cardiovasculares e hipertensão arterial, explica a especialista.
Embora o raquitismo hipofosfatémico possa ser uma doença incapacitante, segundo Isabel Castro, nefrologista pediátrica, quando “detetada e tratada precocemente” permite o normal desenvolvimento e crescimento da criança, sem a presença de alterações ou deformações a nível ósseo.
No entanto, para atingir um bom prognóstico, a médica adverte que é “fundamental a monitorização da terapêutica com adequação das doses dos medicamentos de acordo com a clínica e exames do doente (…) e paralelamente controlar e prevenir eventuais complicações da medicação”.
O acompanhamento destes doentes dever ser feito por uma equipa multidisciplinar “constituída por Nefrologista, Ortopedista, Endocrinologista, Fisiatra e Estomatologista”.