Terapeuta explica

Terapia da fala: “mitos" impedem diagnóstico e intervenção adequada

Atualizado: 
06/03/2019 - 09:58
É sempre difícil falar de uma profissão que me dá tanto todos os dias e que o seu campo de atuação é mais vasto que o seu próprio nome. No meu dia-a-dia, verifico que as pessoas associam o Terapeuta da Fala apenas a crianças e a problemas de “dicção” ou de gaguez, contudo, são muitas as áreas de atuação assim como a faixa etária da nossa intervenção.

O Terapeuta da Fala, é um profissional de saúde, com competências para intervir desde o nascimento, i. é, intervém em recém-nascidos, na área da alimentação e no desenvolvimento de competências comunicativas, junto dos seus pais e equipa multidisciplinar nas Unidades de Cuidados Neonatais; com crianças em idade pré-escolar, centrando-se na prevenção, diagnostico e intervenção na promoção das competências linguísticas, vocais e de comunicação assim como na intervenção das suas perturbações.  Por sua vez, em crianças e jovens em idade escolar a nossa intervenção centra-se nas perturbações da leitura e da escrita, patologia vocal, na potencialização da comunicação e na gaguez. Sendo que nos dois últimos grupos etárias é essencial desenvolvermos o nosso trabalho junto dos educadores, professores, médicos e da família.

Finalmente, na idade adulta, o nosso campo  de atuação é maioritariamente em perturbações da linguagem adquiridas, após acidente vascular cerebral (AVC), demências, tumores, Parkinson ou traumatismo crânio encefálico (TCE), patologias vocais e da deglutição (dificuldade a beber e/ou engolir líquidos), sendo que mais uma vez o trabalho em equipa multidisciplinar é essencial.

É importante que as pessoas estejam atentas a vários sinais de alerta, para que seja possível, ao Terapeuta da Fala, avaliar e diagnosticar precocemente possíveis patologias e intervir adequadamente.

Existem algumas ideias preconcebidas que oiço diariamente, e que levam a que o diagnóstico seja feito tardiamente e que inviabilize o sucesso da intervenção. Ou seja, a intervenção precoce ajuda a prevenir problemas que podem comprometer uma aprendizagem saudável, um normal desenvolvimento, uma comunicação eficaz assim como a qualidade de vida da pessoa.

Ao contrário do que muitas vezes é sugerido podemos recorrer a um Terapeuta da Fala, mesmo quando ainda não sabemos falar, se a criança tem dificuldades em mastigar ou fazer uma boa sucção devemos pedir uma avaliação por um Terapeuta da Fala; se troca sons ao falar ou se aponta para fazer pedidos, junto da família ou dos seus pares na escola, não se deve rotular como “preguiçosa” ou “trapalhona” e uma avaliação atempada é essencial.

Há, ainda, a ideia de que antes dos 5 anos não vale a pena pedir uma avaliação contudo, se esta ideia não é aceitável aos 3 anos está completamente errada aos 5 anos. Há guidelines que apontam os indicadores linguísticos e comunicativos e os fatores de risco para cada etapa de desenvolvimento e que nos permitem identificar e diagnosticar uma perturbação e/ou orientar a família a estimular adequadamente a criança. Se a criança não se faz entender com os seus pares ou se os pais não percebem o que ela diz com 3 anos é um sinal de alerta importante, assim como ter dificuldade em ter interesse para os sons do ambiente ou para o seu nome. Nem todas as crianças ficam em intervenção direta precisamente porque temos conhecimentos técnicos que nos permitem realizar uma prevenção primária e secundária para cada caso. Muitas vezes não irá ser trabalhado logo a fala, mas sim um conjunto de competências essenciais ao desenvolvimento da comunicação e da linguagem, que irão preparar a criança para produzir sons e usar as palavras. Pedir ajuda quando uma gaguez que já dura há mais de um ano também não é aconselhado. Uma rouquidão que dura há mais de 15 dias não é normal, e aqui também devemos pedir uma avaliação por um Otorrinolaringologista.

Como se verificou, o campo de atuação de um Terapeuta da Fala é muito vasto e simplificar corremos o risco de tornar leviano o problema. Há muitas questões que não foram abordadas e patologias concomitantes que podem levar a dificuldades na Comunicação Humana, seja ela verbal ou não-verbal.

Neste dia Europeu da Terapia da Fala, gostaria de enaltecer que a idade não é o fator determinante para procurar ou não a opinião de um Terapeuta da Fala, mas sim as dificuldades que a criança ou o adulto poderá apresentar. Eu costumo dizer que não há que ter medo dos diagnósticos, eles não são permanentes assim como a terapia da fala não é para sempre. Não fazer nada é que não é solução.

Autor: 
Lina Marques de Almeida - Terapeuta da Fala Hospital Lusíadas Lisboa
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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