Empresa portuguesa desenvolve tecnologia

A revolução da reprogramação celular

Atualizado: 
19/02/2018 - 16:45
Na última década, assistimos a inúmeros progressos na área da medicina, sobretudo, no que diz respeito ao conceito de medicina personalizada. A reprogramação celular poderá muito bem ser uma das grandes responsáveis pela mudança de paradigma ao direcionar o tratamento para o doente e não somente para a doença. Em Portugal, a tecnologia está a ser desenvolvida pela BRT Blood Reprogramming Technologies, empresa que venceu a última edição do concurso Acredita Portugal, e que espera conseguir tratar doentes com cancro dentro dos próximos anos.

Em 2007, o investigador japonês Shinya Yamanaka conseguiu, pela primeira vez, “reprogramar" células humanas, fazendo-as assumir características de células-tronco embrionárias, através da edição do seu código genético, abrindo as portas para a era da medicina personalizada, com o desenvolvimento de novas possiblidades de tratamento e fármacos.

A grande revolução causada a partir do seu trabalho, levou a que, em 2012, este investigador fosse distinguido com o prémio Nobel da Medicina ou Fisiologia.

“Na última década temos presenciado uma evolução drástica em diversas áreas,  em particular no conceito de «medicina personalizada». Assim como conseguimos editar um código de software para um determinado fim, conseguimos igualmente editar a informação genética das nossas células utilizando ferramentas biotecnológicas”, começa por explicar Fábio Fiúza Rosa, o diretor de operações da BRT Blood Reprogramming Technologies, empresa portuguesa que desenvolve o conceito de reprogramação celular em Portugal.

Com a utilização destas ferramentas, o especialista revela que é possível “criar sistemas (como por exemplo, vírus) capazes de inserir informações genéticas específicas (“genes”) nas células promovendo a sua reprogramação”.

A tecnologia desenvolvida pela BRT permite converter células da pele em células estaminais do sangue “capazes de gerar todo o tipo de células que compõem o nosso sistema sanguíneo”.

De acordo com Fábio Rosa, esta tecnologia dispõe de inúmeras vantagens face ao trabalho desenvolvido por Yamanaka, sobretudo por “permitir a conversão direta das células da pele para células estaminais do sangue sem passar por um estadio intermédio “pluripotente”, associado normalmente ao risco de desenvolver cancro”.

“As células estaminais do sangue têm uma enorme utilidade clínica visto serem células que são transplantadas num “transplante de medula óssea”, o único tratamento curativo para várias doenças que afetam o processo de produção de sangue, tais como a leucemia e o mieloma”, acrescenta.

As principais aplicações desta nova tecnologia estão, deste modo, associadas ao conceito de medicina personalizada, uma vez que esta permite gerar células autólogas (do próprio paciente) que podem vir a ser utilizadas para o desenvolvimento de terapias celulares inovadoras, bem como na “criação de modelos de doença personalizados” e no desenvolvimento de novos fármacos.

Tendo sido estabelecida no passado mês de março, a BRT Blood Reprogramming Technologies pretende que o seu trabalho seja aplicado nas áreas de transplante de medula óssea e imunoterapia, no combate ou tratamento de doenças como a leucemia, linfomas, mielomas, anemia ou falência de medula óssea e espera que, dentro de 10 anos, a aplicação da reprogramação celular no tratamento de doentes com cancro seja já uma realidade.

“Assim como qualquer medicamento, o produto que a BRT se propõe a desenvolver tem de passar por um conjunto de ensaios clínicos antes de ser comercializado. De acordo com as nossas previsões, dentro de três anos estaríamos preparados para iniciar a primeira fase dos ensaios”, justifica o COO da empresa.

Ultrapassada a fase de prova do conceito, uma vez que já conseguiram validar a capacidade funcional das células estaminais, através do transplante de células reprogramadas “num modelo de ratinho «imuno-comprometido»”, espera-os ainda longo caminho para percorrer.

BRT destaca-se no concurso Acredita Portugal

De acordo com Fábio Rosa, a atribuição do prémio na área da saúde no concurso da Acredita Portugal foi, acima de tudo, “uma forte validação da nossa estratégia de negócio e de desenvolvimento de produto”. “Foi satisfatório perceber que as necessidades de mercado que nos propomos satisfazer são reais e representam em enorme problema para a sociedade. Mais importante ainda, permitiu-nos divulgar a nossa ciência e tudo de bom que dela poderá vir”, assegura.


A equipa da BRT Blood Reprogramming Technologies venceu o prémio "Saúde" na última edição do concurso Acredita Portugal 

Lançado em 2010, o concurso da Associação Acredita Portugal distingue os projetos que mais se destacam em sete áreas: Empreendedorismo Social, Mobilidade, Tecnologia, Saúde, Serviços, Indústria e Produtos.

“A Associação Acredita Portugal (AP) é uma associação sem fins lucrativos que tem por objetivo encorajar todos os portugueses a apostarem nos seus sonhos empreendedores, seja qual for a sua formação ou experiência passada, indústria ou objetivos”, explica Pedro Queiró, CEO da Acredita Portugal. Para isso, todos os anos desenvolve um programa anual de educação e desenvolvimento de projetos, “onde qualquer pessoa pode aceder à educação e às ferramentas necessárias para desenvolver os seus projetos, desde ONGs a empresas de alta tecnologia, ou até na àrea de saúde”.

O primeiro concurso de empreendedorismo, em 2010/2011 contou, enquanto presidente do juri, com o atual Presidente da Republica, Marcelo Rebelo de Sousa, e deste então tem distinguido inúmeros projetos.

“Em termos de prémios, distribuímos um cabaz de serviços que vale cerca de 500 mil euros no total e que está desenhado para acelerar o lançamento dos projetos. Tem de tudo, desde cartões de visita até serviços jurídicos e contabilísticos, espaço de escritório, treino em diversas áreas, alojamento online, comunicações , tudo o que precisa para avançar com a sua ideia”, enumera Pedro Queiró.

No caso particular da saúde, o principal valor do concurso, diz o diretor-geral, “tem sido a aprendizagem em termos de sustentabilidade e financiamento”.

“Nesta área os promotores tipicamente têm um percurso mais académico e, no momento de procurar financiamento e estruturar a parte financeira do projeto, costumam ter algumas dificuldades... Para além disso apoiamos os projetos na procura de financiamento privado, encaminhando o acesso a investidores, fundos de capital de risco e outras entidades capazes de financiar os projetos”, explica.

De acordo com Pedro Queiró, foi a qualidade científica e o potencial do projeto que levou à atribuição do 1ª lugar à BRT Blood Reprogramming Technologies, na última edição deste concurso.

“2017 foi um ano muito, muito forte em projetos na área da saúde e a Blood Reprogramming Technologies destacou-se num campo altamente competitivo, demonstrando um trabalho científico prévio de topo a nível global, com o potencial de salvar milhões de vidas humanas, apoiado numa equipa de enorme qualidade – o que aumenta a probabilidade de sucesso e concretização desse impacto”, justifica acrecentando que não só este projeto era uma carta de intenções como tinha uma validação laboratorial acima de qualquer suspeita e uma equipa completamente capacitada para liderar o processo de ensaios clínicos.

A próxima edição do concurso começa oficialmente a 14 de Janeiro de 2018, estando já abertas as incrições. “Esperamos seguir a trajetória que já temos dos últimos anos: mais projetos, de maior qualidade, e com mais impacto na sociedade portuguesa”, conclui Pedro Queiró. 

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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