Reformados ativos em busca de um envelhecimento saudável
No Centro, que a Comissão Europeia reconheceu como “região de referência” para o envelhecimento ativo e saudável, o cozinheiro Camilo Paiva, de 83 anos, e a voluntária Fátima Familiar, de 68 anos, juntam-se ao médico Polybio Serra e Silva, presidente da Fundação Portuguesa de Cardiologia na região, e ao investigador Jorge Paiva, do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra (UC).
Camilo é dono e trabalha desde a meninice no restaurante Fika Keto, em Miranda do Corvo, distrito de Coimbra, que pertencia aos pais, quando verdadeiramente não havia na vila estabelecimentos com esta designação, apenas tabernas e casas de pasto.
Apoiado pela mulher e pelo filho na cozinha, é ele o principal obreiro de uma das melhores chanfanas das redondezas.
Há quase 70 anos, começou a ajudar a mãe no negócio, devido à morte do pai, e nunca mais ficou quieto, admite a sorrir.
Além da carne de cabra assada com vinho carrascão, os fregueses elogiam-lhe a dobrada e o bacalhau com grão, entre outras iguarias regadas com vinhos da região.
A este propósito, o professor Polybio salienta a importância do vinho na saúde, em detrimento de outras bebidas alcoólicas. “Vinho tinto, pouco e bom, ao almoço e ao jantar”, preconiza.
Advertindo que o néctar da videira “deve ser bebido com conta, peso e medida”, no máximo três decilitros por dia, o catedrático reformado da Faculdade de Medicina da UC admite que “uma extravagância uma vez por semana não tem grande mal”.
“Vinho de uva tinta e feito por maceração da película”, que possui “um antioxidante fundamental, o resveratrol, que existe mais na tinta do que na branca”, esclarece.
Tendo publicado em novembro o livro em verso “Um Poético Cafezinho”, onde faz o elogio desta bebida, o cardiologista chega a tomar seis cafés por dia.
Está agora a preparar a edição da obra báquica “Vossemecê, senhor vinho”, desta vez a enaltecer as virtudes do tinto, desde que bebido com moderação.
“Naquele tempo”, em meados do século XX, “vendia-se mais vinho do que hoje”, recorda o gastrónomo Camilo, que aos 83 anos está “sempre a mexer” em redor dos tachos no Fika Keto.
Adversário do sedentarismo, Polybio Serra e Silva rejeita o tabaco e a má alimentação e recomenda “atividade física diária, regular e progressiva”.
Passa horas ao computador, em casa, a preparar intervenções públicas na área da cardiologia e da medicina preventiva, a convite de entidades diversas.
Mas, de vez em quando, monta a bicicleta fixa que tem ao lado: “faço várias vezes 20 minutos de pedalada” todos os dias. Ou ele não fosse, também, autor do livro “Aprender a não ser velho”.
Apesar de reformado, Jorge Paiva reparte a vida entre Almada, onde reside, e Coimbra, em cuja universidade continua a trabalhar, viajando sempre nos transportes públicos.
“Tomo banho de água fria logo de manhã. Hoje, apanhei o autocarro às cinco da manhã, do lado de lá do rio Tejo, e às oito e pouco estava no gabinete”, conta.
O antigo atleta da Associação Académica de Coimbra não dispensa a sua corrida matinal, de, pelo menos, 10 quilómetros.
“Faço sempre abdominais e umas flexões, para minha manutenção. Precisamos de ter atividade física e intelectual para termos alguma qualidade de vida na velhice e não estarmos à espera da morte”, defende.
Aos 83 anos, o professor universitário já não participa como outrora em manifestações de rua por causas ecológicas.
Continua, no entanto, a produzir trabalho científico, sem nunca abandonar a atividade cívica ambiental, sempre que é convidado.
“Temos de ter os neurónios a trabalhar, senão enferrujam”, sugere, enquanto cita a neurologista italiana Rita Levi-Montalcini, Prémio Nobel da Medicina em 1986, falecida com 103 anos.
Professora de Educação Visual, agora aposentada, Maria de Fátima Familiar trabalha há cinco anos como voluntária na cooperativa cultural Arte-Via, na Lousã.
Diariamente, incluindo alguns fins de semana, apoia na aprendizagem 15 crianças de diferentes idades.
“Acompanho-as no estudo, a pintar e a brincar e até as levo à piscina”, explica Fátima, que todos tratam por Necas na Arte-Via, instituição que tem igualmente a funcionar a Universidade do Autodidata e da Terceira Idade da Lousã, uma das primeiras da região.
Entre os alunos, há filhos de imigrantes ucranianos e russos. “Quando alguns meninos vão ter testes, venho também ao domingo”, refere.
A ex-docente, que queria “fazer mais alguma coisa e não ficar parada em casa” na reforma, optou por este trabalho social gratuito.
As solicitações das crianças surgem de todas as mesas da sala. Também Necas não fica quieta e atende por igual.