Proteínas descobertas por investigadores de Coimbra convertem células da pele em sentinelas do sistema imunitário
O estudo, liderado por um grupo de investigação do Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra (UC), é o tema de capa da edição deste mês da revista Science Immunology, que já se encontra nas bancas.
Este trabalho de investigação, com a duração de três anos, apostou no potencial da reprogramação celular para, pela primeira vez, controlar as respostas do sistema imunitário.
Segundo informações da UC, foram descobertas três proteínas (PU.1, IRF8 e BATF3) capazes de converter células da pele em células dendríticas (CDs), conhecidas como as sentinelas do sistema imunitário, porque são capazes de procurar e capturar agentes patogénicos e células cancerígenas.
"A investigação demonstrou que as células dendríticas induzidas [com uso das proteínas] apresentam uma notável semelhança com as CDs naturais do organismo", descreve Filipe Pereira, coordenador do estudo.
O investigador do Centro de Neurociências e Biologia Celular acrescenta que as células obtidas capturam os elementos estranhos, digerindo-os em pequenos pedaços, conhecidos como antigénios.
"Este processo de vigilância e captura permite ensinar as células T (os soldados do nosso sistema imunitário) quais são os agentes perigosos e como podem ser atacados", descreve o coordenador do estudo.
Esta investigação do CNC pode dar origem a novas estratégias de imunoterapia para o tratamento do cancro, vaticinam os investigadores, lembrando a técnica galardoada este ano com o Prémio Nobel da Medicina/Fisiologia, na qual os componentes do sistema imunitário do próprio doente são utilizados para direcionar um ataque às células cancerígenas.
"Usando células reprogramadas, a probabilidade de rejeição do organismo será menor, por estas serem geradas a partir das células da pele do próprio paciente", descrevem.
O coordenador do estudo avança que há mais caminhos a explorar.
"Numa perspetiva mais criativa, pretendemos também adaptar a famosa estratégia utilizada pelos gregos para derrotar os troianos, na obra ‘Ilíada’ de Homero: queremos desenvolver um ‘Cavalo de Tróia', baseado em reprogramação celular, para administração no interior de tumores sólidos", avisa Filipe Pereira.
Deste modo, acrescenta, "ir-se-á introduzir as três proteínas identificadas neste estudo nas células do tumor, convertendo-as em CDs, forçando o próprio cancro a apresentar as suas características estranhas e perigosas às células do sistema imunitário, o que poderá contribuir para a sua erradicação".
Na sequência destes resultados, a equipa pretende averiguar quais são os mecanismos genéticos através dos quais as três proteínas identificadas impõem a identidade celular de uma célula dendrítica. A investigação irá ainda utilizar este método de reprogramação celular para perceber como outros tipos de CDs, com funções especializadas, são geradas.
Por fim, apresenta-se o desafio de validar a utilidade clínica das CDs geradas como uma nova imunoterapia para o cancro.
"Tendo em conta o potencial desta tecnologia no mercado em crescimento da imunoterapia oncológica", a equipa submeteu em abril de 2017 um pedido de patente internacional para proteger esta propriedade intelectual de forma a assegurar o seu desenvolvimento comercial, o que no futuro pode levar esta tecnologia aos doentes com cancro, conclui o investigador.