Observatório acusa Governo de negar impacto da crise sobre a saúde
Há vários dados que indiciam o impacto da crise sobre a saúde das pessoas, mas continua a haver, quer da União Europeia, quer do Governo “um manifesto esforço” em negar esta evidência, conclui o Relatório de Primavera 2014, divulgado esta segunda-feira pelo Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS).
O documento, intitulado “Saúde - Síndrome de Negação”, sublinha que, à semelhança do “silêncio das autoridades europeias”, em que as evidências parecem ser “intencionalmente ignoradas, votadas ao esquecimento”, “também por cá prevalece o silêncio e/ou a tentativa de demonstração de que não há impacto negativo da crise de forma significativa para a saúde das pessoas”.
O controlo da diabetes, a evolução da infecção por VIH/Sida e Tuberculose, a evolução das doenças respiratórias, os estilos de vida, a saúde mental, o acesso ao medicamento, os cuidados de saúde primários são algumas das áreas críticas analisadas pelo OPSS, num relatório que coincide com o fim da intervenção formal da “troika” em Portugal.
Os Cuidados de Saúde Primários, “sistematicamente referidos no discurso político como a área a privilegiar”, “não se têm constituído como prioridade”, prevalecendo dificuldades no dia-a-dia dos profissionais que “dificultam muito a prestação de cuidados”, critica o OPSS.
O estudo é feito com base nos dados disponibilizados, o que leva os relatores a realçar que é um exercício “cada vez mais difícil na medida em que o acesso e a transparência da informação estão, cada vez mais, condicionados”.
“Podemos dizer que há actualmente mecanismos que impedem ou limitam os investigadores em saúde de aceder a dados do SNS, o que, entendemos, torna a governação menos transparente e consequentemente menos participada”.
Numa análise às políticas de saúde, o OPSS critica as diversas medidas de centralização adoptadas pelo Ministério de Paulo Macedo - lei dos compromissos, burocratização dos processos de aquisição e contratação, controlo central dos investimentos e da informação - considerando que “desmotivam e desresponsabilizam as lideranças das organizações de saúde”. Manuel Lopes, Felismina Mendes e Ana Escoval, coordenadores do Relatório de Primavera 2014, entendem que “através do centralismo silencia-se um conjunto diversificado de players e por essa via esta opção representa hoje um elevado factor de risco no desempenho futuro do SNS”.
“Ao transformarem-se as estruturas regionais e locais, e as suas organizações, em simples correias de transmissão de decisões centralmente tomadas, retira-se eficácia, massa crítica, experiência e capacidade de inovação, para encontrar soluções que só a proximidade e o conhecimento dos problemas permitem resolver”, sublinha o documento.
Governo nega acusação de estar a esconder efeitos da crise na saúde
O ministro da Saúde, Paulo Macedo, recusou, estar a esconder os efeitos da crise na saúde, lembrando que “as situações existem” e reiterando que pediu à Organização Mundial de Saúde estudos sobre esse impacto.
“As situações existem, não são minimamente escondidas”, afirmou aos jornalistas, em Lisboa, assinalando que “a crise tem consequências negativas na saúde”, nomeadamente na saúde mental.
O ministro reiterou, a este propósito, o pedido feito à Organização Mundial de Saúde (OMS) e à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para avaliarem o impacto da crise na saúde em Portugal.
Numa breve declaração à imprensa, à margem do I Conselho Interministerial para os Problemas da Droga, das Toxicodependências e do Uso Nocivo do Álcool, o ministro da Saúde enalteceu, não obstante a contenção orçamental, que o sector da saúde teve “um conjunto de fundos, sem paralelo, nos últimos três anos”.
Reconheceu, no entanto, que “é preciso investir mais em recursos humanos, em infra-estruturas” e na prevenção de comportamentos nocivos para a saúde.