Leucemia Mieloide Crónica: que doença é esta?
A Leucemia Mieloide Crónica (LMC) é uma doença oncológica caracterizada por uma desregulação da medula óssea (local onde se produz o sangue) que se traduz numa proliferação desmesurada dos progenitores dos glóbulos brancos, mais particularmente dos que dão origem aos neutrófilos, eosinófilos e basófilos, chamados de granulócitos. Esta doença é mais frequentemente diagnosticada acima dos 65 anos de idade. Embora tenha um nome ao qual se associa um estigma de gravidade, esta doença actualmente é controlada com medicação oral, fazendo com que as pessoas com LMC tenham uma vida perfeitamente normal.
Esta proliferação é equilibrada entre os vários tipos de células, com presença de todos os estádios de maturação destas, havendo muito poucas células ditas indiferenciadas (blastos). Nas análises ao sangue é frequentemente possível também observar formas mais precoces dos glóbulos brancos, tais como os promielocitos, mielocitos e metamielocitos. Estes 3 tipos de células habitualmente não andam a circular no sangue, encontrando-se somente na medula óssea. Mas, como a medula está a produzir tantas células, fica “cheia e transborda” células para a corrente sanguínea. Além dos glóbulos brancos, também as plaquetas podem estar aumentadas (também por proliferação dos percursores plaquetares).
Há vários anos, as pessoas, não tendo disponível os cuidados de saúde que agora têm, eram frequentemente diagnosticadas já em fases mais avançadas, quando a doença já se manifestava com mais sintomas.
Os sintomas são relativos às alterações orgânicas que a LMC produz: cansaço (devido a anemia), dor abdominal, enfartamento (devido a baço aumentado), febre e perda de peso.
Atualmente, a maioria das pessoas que são diagnosticadas com Leucemia Mieloide Crónica, são-no de uma forma incidental, ou seja, fazem análises de rotina que mostram um aumento do número dos glóbulos brancos, à custa de uma produção aumentada de neutrófilos, basófilos e eosinófilos.
Houve um grande progresso no estudo desta doença e dos mecanismos que estão na sua origem. Atualmente sabe-se que a LMC é provocada por uma alteração genética específica que leva a uma sinalização permanente na medula para as células proliferarem.
Essa alteração genética é “visível” numa alteração cromossómica, com partilha de material entre dois cromossomas (o 9 e o 22), ao qual se dá o nome de cromossoma de Filadélfia.
Há 30 anos, após o diagnóstico desta patologia, os doentes tinham uma expectativa de vida de cerca de 20 anos, acabando por falecer por progressão para leucemia aguda. Os tratamentos não mudavam a história natural da doença, à exceção do transplante alogénico de medula que tinha potencial curativo, mas à custa de muita toxicidade e só acessível a indivíduos mais jovens.
Com a descoberta da causa subjacente para o aparecimento da LMC, foi desenvolvido um fármaco que actua especificamente sobre a alteração genética, fazendo “desligar” o sinal que faz as células proliferarem, o imatinib.
Desde então, houve uma revolução completa no tratamento da LMC e a sobrevivência dos doentes, fazendo com que, com um comprimido diário, haja uma total normalização da medula e, enquanto este for tomado, a doença mantém-se “adormecida”.
A forma como se foi aprendendo como é que esta doença aparecia e se criou um medicamento que tem um alvo molecular específico, que “corta” o efeito do Cromossoma de Filadélfia e induz o desaparecimento das células doentes, continua a ser um marco importantíssimo na oncologia no geral, sendo esta doença o paradigma do que a investigação nesta área deve tentar almejar.