Porque temos insónias?
Destinado a recuperar as nossas capacidades físicas, intelectuais e mentais, o sono assume extrema importância. Sabe-se hoje que a alternância entre a vigília e o sono resulta da acção de diversas substâncias intimamente ligadas ao ritmo circadiano de 24 horas.
Todos precisamos de dormir, embora essa necessidade possa variar de pessoa para pessoa. Para alguns, 6 horas podem bastar... Para outros são precisas 9 para que se sintam em forma no dia seguinte. Apesar destas variações, uma coisa é certa: todos precisamos de um mínimo de horas de sono diárias.
Considera-se que o sono é suficiente quando produz um estado de alerta total e uma sensação de bem-estar no dia seguinte. A grande maioria parece necessitar de uma média de cerca de 8 horas de sono em cada noite. As razões biológicas para estas variações não são inteiramente conhecidas. As pessoas que trabalham durante a noite, por seu lado, enfrentam problemas particulares. O trabalho nocturno gera uma situação de conflito com o nosso relógio interno.
Horários irregulares, trabalho por turnos, abuso de estimulantes, alimentação incorrecta são erros cometidos um pouco por todas as casas portuguesas. E são geralmente os motivos para que praticamente 1 em cada 3 portugueses sofra de insónia. Especialistas referem que cerca de 70 por cento das pessoas que dormem mal é por terem más rotinas. Dormir mal ou durante poucas horas tem reflexos a nível físico, mental e laboral: Esta faixa da população tem grandes perdas de concentração e memória, é mais irritável e tem mais riscos de depressão e ansiedade.
Uma vez que a falta de horas de sono também debilita o sistema imunitário, estas pessoas são mais propensas a enfermidades, além de que a sua pele regenera muito menos, o que explica as olheiras, por exemplo. No trabalho, o risco de acidente é 10 a 20 por cento superior devido à fadiga e cansaço. Também no aspecto económico há gastos a considerar, uma vez que "estas pessoas gastam 20 por cento mais dinheiro público em visitas ao médico e em fármacos".
O que são as insónias?
A insónia é um sintoma e não uma doença e é a mais comum desordem do sono na Europa e Estados Unidos e igualmente a mais incompreendida. Insónia caracteriza-se pela dificuldade em iniciar ou manter o sono. Acompanha-se da sensação de sono não reparador notada na manhã seguinte. Como consequência, no dia seguinte apresenta fadiga, irritabilidade e agressividade.
A duração da insónia varia, podendo ser desde a insónia de poucos dias de duração; até a insónia de longa duração por meses ou anos (insónia crónica).
Tipos de Insónia
Insónias transitórias
As insónias transitórias são as que duram poucas noites, são muito comuns, ubíquas. A maior parte das pessoas apresenta esta insónia em algum período de tensão, stress, expectativa ou excitação.
Insónias de curta duração
As insónias de curta duração são as que duram de poucos dias até três semanas. Geralmente são causados por stress grave ou persistente como preocupações com a saúde própria ou de familiares; luto ou perda substancial; problemas familiares, profissionais ou de relacionamento. A relação entre o stress e a insónia é nítida.
Insónias de longa duração
As insónias de longa duração ou crónicas são as que duram mais de três semanas. Podem ser relacionadas a stress continuado, depressão, abuso de álcool ou drogas e hábitos inadequados para dormir, como o excesso de café (cafeína).
O mecanismo do sono
Numerosos estudos científicos demonstraram a existência no cérebro de estruturas que controlam os mecanismos do despertar e outros que intervêm na aparição do sono. O sono prepara-se durante o dia pela acção exercida por certos neuromediadores sobre o hipotálamo, o que leva à produção de substâncias que permitem a chegada do sono à noite. Quando adormecemos, a nossa temperatura baixa, favorecendo o acto de dormir. Por volta das 3 horas da madrugada, a glândula pineal (situada no centro do cérebro) liberta a melatonina, hormona responsável por "abrir as portas ao sono"e melhorar a qualidade do sono paradoxal.
Ao alvorecer, a luz inibe a actividade da glândula pineal que abranda a produção de melatonina. Numerosos trabalhos demonstraram que em função da intensidade da luz recebida pela retina e da hora da exposição, a melatonina é produzida à noite a uma hora certa. Desta maneira, quando nos expomos ao sol desde a manhã, a melatonina é segregada um pouco mais cedo à noite, enquanto uma exposição apenas durante a tarde provocará uma secreção mais tardia.
O nosso corpo obedece a relógios internos escondidos no hipotálamo. Quando os ritmos naturais são alterados, o organismo sente-se confuso. O trabalho nocturno, a maneira de viver, a longa madrugada do fim-de-semana ou as viagens que implicam grandes mudanças horárias, podem provocar distúrbios de sono.
Os ciclos do sono
Todos os seres humanos possuem um relógio interno destinado a regular uma série de funções como o sono, a temperatura e a produção de hormonas. As perturbações deste ritmo de sono acontecem em pessoas que mantêm uma escala de sono dessincronizada com o seu ritmo interno. Uma noite de sono é uma sucessão de vários ciclos, cada um dos quais compreende duas fases: o sono lento, que se divide em 4 estádios progressivamente mais profundos, e o sono paradoxal, um sono leve, com sonhos, que marca o fim de cada ciclo. As crianças passam a maior parte da noite em estágios profundos de sono, enquanto os mais velhos vivem os seus sonhos em estágios mais leves.
As pessoas que viajaram de avião através de vários fusos horários conhecem bem a perturbação dos ciclos do sono conhecida por jet-lag. Aos viajantes que sofrem de jet-lag os especialistas aconselham que procurem dormir à mesma hora que o fariam em casa. Problemas semelhantes acontecem a quem trabalha em horários nocturnos. Em casos mais raros, o relógio interno de uma pessoa pode trabalhar irregularmente por razões ainda desconhecidas. Indivíduos que mudaram o seu trabalho para escalas nocturnas devem escolher uma hora apropriada para se deitarem e dormir apenas 5 horas por dia. Após alguns dias, o sono deve ser prolongado mais 15 minutos até a adaptação completa ao novo horário.
Assim, quando adormecemos, entramos no sono não-REM (75 por cento da noite), que é composto por 4 fases:
Fase 1
Sono leve, entre estar acordado e adormecer; há um relaxamento dos músculos, os batimentos cardíacos abrandam e o corpo prepara-se para entrar num sono profundo;
Fase 2
Sono intermédio, quando o despertar é mais difícil; nesta altura, estamos desligados do ambiente exterior, a respiração e o ritmo cardíaco estão regulares e a temperatura do corpo desce;
Fases 3 e 4
Sono mais profundo e reparador; a tensão arterial baixa e respiramos mais devagar.
Enquanto dormimos, passamos por diferentes estádios. Esta "arquitectura do sono" segue um padrão de sono REM (rapid eyes movement ou movimento rápido dos olhos, durante o qual ocorre a maior parte dos sonhos) e de sono não-REM (mais profundo). Geralmente, o sono de um adulto começa com um ciclo de 80 minutos de sono não-REM, seguidos por 10 minutos de sono REM. Este ciclo de 90 minutos (que pode ir de 70 a 110 minutos, conforme as pessoas) repete-se 3 a 6 vezes em cada noite. Depois dos primeiros dois ciclos de sono, o tempo passado no sono profundo diminui e a proporção de sono REM aumenta. Os dois tipos de sono são importantes para garantir um sono reparador e de qualidade.
O sono REM (25 por cento da noite) é conhecido como a fase dos sonhos. Ocorre cerca de uma hora e meia após adormecermos, repete-se de 90 em 90 minutos e aumenta de duração no final da noite. Envolve uma grande actividade cerebral e os batimentos cardíacos e a respiração tornam-se irregulares. Os sonhos ocorrem enquanto os olhos se movem para a frente e para trás. Já o resto do corpo está imóvel e os músculos relaxados. Durante esta fase, as regiões do cérebro utilizadas na aprendizagem e na organização da informação são estimuladas, pelo que é decisiva para o desempenho no dia-a-dia e contribui para fortalecer a memória.
As pessoas que acordam durante o sono não-REM não se lembram se tiveram sonhos. Pelo contrário, para os que acordam na fase do sono REM é mais fácil recordar, ao pormenor, o que sonharam. Podemos ter vários sonhos na mesma noite. No entanto, a maioria das pessoas só se lembra daquilo que sonha já perto da manhã, antes de acordar.
Sintomas da insónia
Identificar os sinais e sintomas da insónia pode ajudá-lo a perceber e identificar a gravidade do seu problema:
. Dificuldade em adormecer
. Acordar várias vezes durante a noite
. Acordar cedo demais
. Levantar da cama de manha sem se sentir revigorado
. Sentir fadiga ou sono durante o dia
. Irritabilidade, depressão ou ansiedade
. Dificuldade de prestar atenção ou concentrar-se nas tarefas.
Causas da insónia
Problemas físicos ou psicológicos podem ser a causa. Doenças que provocam dores ou mal-estar (asma, palpitações cardíacas, indigestão ou cancro) podem dificultar o sono. Da mesma maneira, problemas nutricionais, hormonais e neurológicos podem actuar directamente sobre o cérebro e dificultar o sono. Igualmente medicamentos que interferem sobre o sono, como descongestionantes e barbitúricos, e o álcool. Também as doenças psiquiátricas, como a esquizofrenia, depressão e ansiedade, provocam frequentemente insónias, por regra resolvidas quando a doença é convenientemente tratada.
A insónia ocasional, originada por stress psicológico ou físico pode tornar-se crónica, transformando o leito numa zona de terror o que ajuda ao avantajar da insónia e impossibilita o retorno a um nível normal de sono.
Os desajustes dos ritmos circadiários (ou circadianos) são igualmente uma das causas de insónia. Do latim Circa Diem, que significa um dia, o ritmo circadiano designa, precisamente, o período de 24 horas sobre o qual ocorre todo o ciclo biológico do corpo humano e de qualquer outro ser vivo, influenciado pela luz solar. O ritmo circadiano regula muitos dos ritmos psicológicos do corpo humano, com influência sobre, por exemplo, a digestão ou o estado de vigilia, passando pelo crescimento e pela renovação das células, assim como a subida ou descida da temperatura. O "relógio interno", denominado núcleo supraquiasmático do hipotálamo, processa e monitoriza todos estes processos e funciona ciclicamente como se houvesse dia e noite. No caso dos invisuais em que não há uma sintonização com o sol, existe uma tendência a desajustes e a perturbações dos ritmos circadiários.
O diagnóstico
Procure questionários que se relacionem com o sono. Se encontrar sinais suspeitos de um mau dormir consulte o seu médico. Muitas das perturbações do sono não se manifestam de uma forma evidente e as consequências também não aparecem de imediato.
Prevalência
O sono de má qualidade afecta mais a saúde das mulheres do que a dos homens. Metade dos portugueses dorme mal, mas cerca de 19 por cento têm consciência disso, mas apenas uma pequena percentagem procura ajuda médica especializada para solucionar o problema. O estudo é da DECO e foi publicado na revista Teste Saúde (Setembro de 2004). A DECO avança que 47 por cento dos portugueses dormem mal e cerca de 56 por cento sofrem de sonolência no dia-a-dia. Em consequência, 21 por cento dos condutores admitem poder adormecer ao volante.
Acerca da qualidade do sono, 59 por cento dos inquiridos dizem que dormem menos horas do que necessitam e 16 por cento dizem que de manhã já acordam cansados. Entre os que dormem mal, mais de metade (55 por cento) responsabilizam o stress e a ansiedade, sendo os problemas de trabalho e familiares outras das causas. Entre as pessoas que têm problemas com o sono, as que recorrem ao médico na maioria dos casos (60 por cento) consulta o médico de família e só 20 por cento procura um psiquiatra. Cerca de 16 por cento dos inquiridos toma medicamentos para dormir, sendo que um em cada dez os toma por iniciativa própria ou a conselho de amigos ou familiares.
No artigo da revista da DECO é sublinhada a falta de acessibilidade a especialistas da área do Sistema Nacional de Saúde (SNS). A DECO sugere que os Ministérios da Educação e Saúde promovam campanhas de informação sobre a importância do sono e os efeitos da sua privação.
Tratamento
O tratamento pode até passar pela simples aprendizagem de técnicas de relaxamento, embora haja casos que implicam uma terapêutica com medicamentos. Poucas pessoas sabem que a insónia é tratável ou controlável em 95 por cento dos casos.
Assim, medicamentos e terapias comportamentais são úteis no tratamento da insónia. O lado comportamental evidencia os bons hábitos de dormir. Por exemplo, por mais ensonada que esteja, uma pessoa que sofre insónias nunca deve fazer uma sesta à tarde.
Os insomníacos também nunca devem deitar-se a não ser que se sintam realmente cansados. Devem levantar-se após uns 20 minutos de mal sucedidas tentativas para adormecer para fazerem qualquer coisa calma, como ler um livro. Devem, igualmente, usar o despertador para acordarem sempre à mesma hora 7 vezes por semana. O exercício durante o dia ajuda a adormecer na altura de ir para a cama. Técnicas de relaxamento, que incluem exercícios respiratórios e musculares podem igualmente ser úteis para reduzir a ansiedade anterior ao período de ir dormir.
As pessoas que habitualmente se deitam tarde e cujas obrigações exigem que se levantem cedo, têm muitas vezes sérios problemas. Este tipo de sono descontrolado é especialmente frequente entre os adolescentes e os adultos jovens. O tratamento por cronoterapia pode ajudar a acertar o relógio interno. Esta técnica, que tem apenas 20 anos, consiste em, sob assistência médica, atrasar gradualmente a hora de deitar, até que essa hora seja compatível com a vida activa do doente.
Assim, se tem o hábito de se deitar às 3 horas da madrugada, ser-lhe-á pedido, na primeira noite, que se deite às 6 e durma até às 14. Na noite seguinte, deitar-se-á apenas às 9 horas e dormirá até às 17 e assim de seguida, atrasando 3 horas em cada dia, mas mantendo sempre as 8 horas de sono. Ao cabo de 8 dias entrará num horário normal de se deitar às 23 horas e acordar às sete da manhã. Depois será imperativo um mês de consolidação em que manterá rigidamente o último horário. Neste tipo de terapia, a motivação é da maior importância.
Na prática, cerca de dois terços dos insomníacos respondem bem a estas diferentes técnicas. Após o tratamento deixam de recorrer a medicamentos para adormecer ou usam-nos muito menos.
A luz como tratamento
A fototerapia é um excelente meio para sincronizar o relógio biológico, com bons resultados nos indivíduos que têm problemas com o ritmo vigília/sono. São geralmente pessoas que adormecem e se levantam tarde, com sono muito fraccionado, que se sentem fatigadas durante o dia.
O tratamento inclui a exposição diária durante um período de cerca de uma hora a uma luz de forte intensidade (mais de 1 500 lux), branca, sem infravermelhos nem ultravioletas. Já que se trata de um verdadeiro tratamento, apenas o médico pode determinar o horário da exposição e o número de sessões, a fim de evitar complicações na retina ou uma utilização inapropriada da lâmpada que poderiam agravar ainda mais as perturbações. Regra geral, o tratamento será feito de manhã no caso de o adormecer e acordar tardios e à noite, para a situação contrária. Normalmente, são necessários dez dias para que a situação normalize.
Alguns conselhos
Dormir bem, implica ter um ritmo de vida regular. Para funcionar devidamente, o corpo necessita de disciplina e de regularidade, pelo que é importante começar por determinar o seu ritmo pessoal em função das suas obrigações e respeitá-lo:
- Não durma de dia nem faça "sestas";
- Evite estimulantes como tabaco, álcool ou bebidas ricas em cafeína;
- Evite o barulho ou ver televisão;
- Relaxe com um banho quente;
- Não tome medicamentos sem consultar o médico;
- Não se deite sem sono - leia, veja televisão, é preferível a andar às voltas na cama sem conseguir dormir;
- Use tampões nos ouvidos (estão à venda na farmácia);
- Crie um ambiente agradável no seu quarto com uma temperatura amena;
- Mantenha um horário fixo para se deitar e levantar, mesmo aos fins-de-semana;
- Levanta-se sempre a mesmo hora, mesmo que não consiga dormir uma noite;
- Não procure recuperar a falta de sono com uma manhã na cama.