Imigrantes vigiam menos a gravidez do que portuguesas
Realizado por Carlos Pereira e Emília Coutinho, da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Viseu (IPV), o estudo durou dois anos e baseou-se em entrevistas presenciais a 3.232 grávidas (2.326 portuguesas e 906 imigrantes), em 32 maternidades e hospitais dos 18 distritos de Portugal Continental. Concluiu que a barreira linguística é um dos principais factores que levam as imigrantes a vigiarem menos a gravidez do que as portuguesas. Se 86,8% das grávidas portuguesas fazem uma adequada vigilância da gravidez, essa percentagem desce para 71,7% no caso das imigrantes, concluiu o estudo. “A barreira linguística foi um importante determinante da não vigilância de gravidez. Exceptuando as imigrantes de expressão portuguesa, as grávidas referem frequentemente o facto de não falarem português como o principal obstáculo para o acesso aos cuidados de saúde”, avançou à agência Lusa Carlos Pereira.
No entanto, segundo o docente, “mesmo as grávidas provenientes de países de expressão portuguesa apontam alguns constrangimentos decorrentes dos diferentes significados dos conceitos e contextos”.
No caso das grávidas oriundas de países de expressão portuguesa, “são razões de natureza económica que assumem particular relevo”, o que considera estranho, “pois o acesso aos cuidados de vigilância materna é livre e gratuito tanto para nacionais como para estrangeiras”.
As grávidas que sentem mais as dificuldades linguísticas são as oriundas da China, seguidas das dos países de Leste (Roménia e Moldávia) e, por último, as de S. Tomé, Cabo Verde e Guiné.
A idade jovem, o facto de terem profissões não qualificadas e menos habilitações literárias, o estado civil de solteira, viúva ou divorciada, a falta de planeamento da gravidez e o estar em Portugal há menos de cinco anos foram outros factores que contribuíram para uma menor vigilância das grávidas imigrantes.
Carlos Pereira explicou que, apesar de referirem alguns constrangimentos, “as grávidas imigrantes consideram Portugal um país acolhedor”.
Na opinião dos investigadores, devem ser criados protocolos “entre todas as instituições prestadoras de cuidados de saúde no âmbito da maternidade que promovam e facilitem o acesso, através de um interface informático que minimize a barreira linguística”.
A criação de centros de apoio dinamizados por enfermeiros de saúde materna e obstetrícia e obstetras sediados nos Agrupamentos de Centros de Saúde que possibilitem “aos casais imigrantes e portugueses o esclarecimento de dúvidas relacionadas com a gravidez e direitos ao acesso à saúde em Portugal” é outra medida defendida.
Carlos Pereira e Emília Coutinho consideram ainda que devem ser promovidos debates com as equipas de saúde sobre a problemática das mães imigrantes e ser incorporados nos currículos médicos e de enfermagem “conteúdos de vigilância de gravidez em contexto de imigração”.
Apesar das diferenças registadas na vigilância entre grávidas portuguesas e imigrantes, o estudo aponta que elas são menos acentuadas do que noutros países.
Carlos Pereira aludiu a “um estudo comparativo entre vários países da Europa, com imigrantes irregulares, que expõe as fragilidades de muitos sistemas políticos europeus, uns que lhes vedam totalmente o acesso à saúde, outros que impõem limites e condicionam esse acesso, só permitindo o atendimento em situações de urgência”.
Mesmo nestes casos “é frequente a exposição do imigrante, na medida em que vários mecanismos são accionados para levar à sua denúncia, até pelos funcionários públicos que a isso estão obrigados, como é o caso da Alemanha”, acrescentou.
Segundo o investigador, em Portugal, esta questão não se coloca, porque “todas as grávidas, independentemente de estarem ou não em situação ilegal, têm o direito a serem atendidas” e não há por parte dos serviços de saúde a obrigatoriedade de participar a situação ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.