Doenças respiratórias matam mais no Inverno
As doenças do aparelho respiratório têm uma elevada prevalência representando, no seu conjunto, a terceira principal causa de morte em todo o mundo. “Em Portugal são responsáveis por cerca de 19 por cento dos óbitos e a principal causa de internamento”, refere António Carvalheira Santos, Chefe do Serviço de Pneumologia do Hospital Pulido Valente, estimando-se que, dentro de cinco anos, “sejam reponsáveis por cerca de 12 milhões de mortes anuais”.
De acordo com o especialista, mais de cem milhões de europeus sofrem, atualmente, de doença respiratória crónica. Um dado alarmante se pensarmos nas elevadas taxas de mortalidade e incapacidade que a patologia provoca.
Entre as doenças respiratórias que mais afetam os portugueses encontram-se a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), a Asma Brônquica, as Neoplasias Pulmonares, as Pneumonias, as Fibroses Pulmonares, as Bronquiectasias e a Tuberculose.
“No entanto, há outras que são também relevantes, como as Embolias pulmonares, a Hipertensão Pulmonar de várias causas, o Síndroma de apneia obstrutiva do sono, as Doenças Neuromusculares e as Doenças deformativas da parede tóracica que são causas de insuficiência respiratória e implicam, muitas vezes, a necessidade de utilização de oxigénio e mesmo de ventilação mecânica para que os doentes tenham boa qualidade de vida”, acrescenta o pneumologista.
No Inverno, com temperaturas mais baixas e com níveis de humidade elevados, aumenta a probabilidade de agravamento da doença respiratória crónica, uma vez que estes doentes estão mais susceptíveis a infeções respiratórias, como a pneumonia.
“O frio é um irritante brônquico e por isso facilitador ao aparecimento das doenças respiratórias”, revela António Carvalheira Santos.
“A correta manutenção da terapêutica brônquica prescrita e a vacinação da gripe e das pneumonias devem ser encaradas como primordiais. A limpeza das vias aéreas é outro cuidado a ter”, assinala.
Por outro lado, entre as medidas que podem evitar o agravamento da doença está a reabilitação respiratória.
Para o especialista a reabilitação respiratória é uma componente fundamental no tratamento do doente respiratório crónico. “Tem sido alvo de particular atenção pelos investigadores nos últimos 10 anos e é, atualmente, apontada como uma intervenção de primeira linha no tratamento da DPOC estável, classes B, C e D da GOLD, bem como em doenças respiratórias crónicas propiciando a diminuição dos sintomas, melhoria na funcionalidade, capacidade de exercício e qualidade de vida e na autonomia da gestão da doença”, revela.
“Um programa de reabilitação respiratória tem como objetivos proporcionar a diminuição das incapacidades físicas e psicológicas causadas pela doença respiratória através da melhoria da aptidão física e mental, alteração de comportamentos de agravamento, promovendo a reintegração social e capacitando o doente para a gestão integrada da sua doença”, explica o médico pneumologista.
Indicada a todos os doentes com doença respiratória crónica sintomáticos, a reabilitação respiratória deve, na opinão deste especialista, ser prescrita como parte integrante do seu programa terapêutico.
Este programa “assenta em três pilares: controlo clínico, ensino e treino de exercício. Em virtude dos doentes terem características diferentes, os programas de reabilitação têm de ser talhados de acordo com essas mesmas características, embora as várias componentes têm de estar presentes”.
A reabilitação respiratória conta, por isso, com uma equipa interdisciplinar composta por médicos, fisioterapeutas, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas e terapeutas ocupacionais que vão ajudar o doente a gerir a sua doença.
Uma melhor tolerância ao exercício, com aumento da resistência ao esforço, a redução dos sintomas respiratórios de fadiga e dispneia ou a reversão da ansiedade e depressão associados à doença respiratória são alguns dos benefícios do tratamento.
“A evolução da medicina nesta área, associada à investigação clínica, tem mostrado que a Reabilitação Respiratória evidência benefícios de saúde muito significativos para estes doentes e, simultaneamente, redução dos custos diretos e indiretos com a saúde”, adianta António Carvalheira Santos.
No entanto, admite que “a taxa de referenciação e adesão à Reabilitação Respiratória, assim como a capacidade de resposta dos serviços de saúde públicos ou privados, tem sido diminuta”.
“Num estudo recente foi avaliado que cerca de 1 por cento dos doentes respiratórios crónicos sintomáticos em Portugal têm acesso a esta terapêutica enquanto na Europa, nos países de médica adesão, é de 30 por cento estendendo-se este valor para 70 por cento nos países de grande adesão”, avança.
O chefe de Serviço de Pneumologia do Hospital Pulido Valente acredita que a fraca acessibilidade do doente a um programa de reabilitação respiratória “pode estar relacionado com o facto de sentir que é complicado o cumprimento do programa, por depressão ou desmotivação, por dificuldades de transporte, por escassez de recursos financeiros ou ainda por resistência do doente e familiares à mudança de rotinas, medicação, e início de novas abordagnes terapêuticas como a cessação tabágica, oxigenoterapia, ventiloterapia ou exercício terapêutico”.
Por outro lado, admite que a quase inexistente oferta de programas de Reabilitação Respiratória, fora do ambiente hospitalar, é uma grande condicionante ao acesso ao tratamento.
“Hoje, em Portugal, só um pequeno número de doentes respiratórios crónicos é privilegiado ao terem acesso a um tratamento global com Programa de Reabilitação incluído. Torna-se, pois, premente a abertura de Centros de Reabilitação Respiratória de proximidade, que possam dar respostas às necessidades do país”, adverte o especialista.
“Cheguei quase às últimas. Tive de aprender a respirar”
Luís Gottschalk foi diagnosticado com Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica há 25 anos. Ex-fumador, admite que, ainda assim, só deixou o tabaco 12 anos depois de saber que tinha a doença.
A fazer Reabilitação Respiratória há dois anos, afirma que teve de aprender a respirar.
“A DPOC foi diagnosticada há 25 anos, no entanto, reconheço que os sintomas já existiam há muito mais tempo”, começa por contar.
“Sentia-me cansado, tinha dificuldade em subir escadas, falta de ar. Eu nadava muito e passei a ter muitas dificuldades em respirar”, revela.
Em 1993 uma gripe forte precipitou-lhe o diagnóstico. “Foi a primeira vez que me senti a sufocar, não é facil explicar... Tive de chamar o médico a casa que me aconselhou a consultar um especialista. Na altura, disse-me que suspeitava de um enfisema”, explica Luís.
Para além do enfisema, este ex-fumador, sofria de bronquite. “Eu era fumador desde os 14/15 anos. Cheguei a fumar quatro maços de tabaco por dia. Depois de me ter sido diagnosticada a DPOC tentei várias vezes, sem sucesso, deixar de fumar”, admite.
Ao ser diagnosticado com enfisema – uma das manifestações da doença pulmonar obstrutiva crónica - pensou “ao menos não é cancro”. “Eu não tinha ideia da gravidade do problema”, confessa.
Luís era professor de filosofia numa escola secundária e passou a sentir várias limitações no seu dia-a-dia. “Desde que comecei a sufocar passei a sentir pânico em diversas ocasiões”, recorda.
“Tudo na vida me custava. Ir à rua cansava-me, não conseguia subir escadas e acabei por me isolar socialmente”, recorda. “Eu tinha vários amigos que moravam em prédios sem elevador e eu tive de deixar de os visitar”, justifica. Por outro lado, relembra o desgaste psicológico que a doença provocava.
Fora do país, onde viveu durante oito anos, sentiu o seu estado agravar-se. “Estive na Índia e tive um ataque que foi um pavor. Em 2002, em Maputo, tive de ser internado. Estive quase a fazer um pneumotórax. Nesse ano regressei a Portugal”, conta.
“Em 2003 estava péssimo e deixei de fumar. Fui decidindo, a cada dia, que não era o dia em que voltaria a fumar... ao fim de umas semanas comecei a sentir-me melhor”, revela Luís.
No entanto, um ano depois sofre um pneumotórax. “Cheguei quase às ultimas. Estava em Madrid na altura, e ao fim de três semanas de internamento soube que tinha de ser operado. Pedi para regressar a Portugal”, recorda.
A cirurgia, para além de tratar o pneumotórax, serviu para retirar parte do pulmão que se encontrava doente permitindo que a outra parte se expandisse.
“Após a operação fiz reabilitação respiratória para aprender a respirar”, afirma Luís.
Fez cinesioterapia e começou a praticar exercício físico. “Além de aprender a fazer exercícios respiratórios, a controlar a respiração e a expelir os fluído, eu tinha de ter os músculos bem trabalhados para conseguir respirar usando o diafragma”, explica.
O programa de Reabilitação Respiratória teve a duração de um ano, no Hospital Pulido Valente. “É fácil obter para os operados mas, depois de ter sofrido uma pneumonia alguns anos mais tarde, fiquei em lista de espera e acabei por procurar um centro privado especializado”, revela.
Atualmente, usa poucos medicamentos. “Só um no inicio do dia e outro a meio da tarde”, revela. Mas admite ter uma vida limitada. “Não consigo correr, consigo manter a marcha durante duas horas, mas correr é impossível e ainda tenho muita dificuldade em subir escadas. Faço muitas paragens”, diz. No entanto, tenta fazer uma vida o mais normal possível.
“Faço sessões de reabilitação duas vezes pode semana e nos outros dias vou ao ginásio. Tento manter sempre esta rotina. Nos períodos de maiores dificuldades faço reabilitação todos os dias”, conclui.