Cancro da tiróide tem vindo a aumentar
Nos últimos anos, tem sido maior a visibilidade e relevância dada às doenças da tiróide quer por parte dos profissionais de saúde, quer da população em geral. Prova disso são os “estudos recentes conduzidos pelo Grupo de Estudo da Tiróide em grávidas e em crianças em idade escolar vieram revelar uma insuficiência moderada dos níveis de iodo na população portuguesa, traduzindo um aporte inadequado de iodo na alimentação”, explica Luis Raposo, coordenador do Grupo de Estudo da Tiróide (GET) da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo (SPEDM).
Com base nestes estudos, a Direcção-Geral da Saúde tem vindo a elaborar normas de orientação clínica, algumas das quais ainda em discussão pública, das quais se destaca a norma sobre aporte iodado na grávida, as normas sobre o cancro da tiróide e a norma sobre a abordagem dos nódulos da tiróide.
Por outro lado a Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo e os vários Serviços de Endocrinologia portugueses têm desenvolvido de forma regular variadas iniciativas formativas no âmbito da tiróide. Mas ainda assim, segundo Luis Raposo, “continua a ser muito importante o reforço da sensibilização dos médicos de família, principais protagonistas no diagnóstico e terapêutica da patologia tiroideia, e da sua articulação com a especialidade”.
Na opinião do mesmo responsável “a maior visibilidade das doenças da tiróide prende-se em parte com uma provável elevada prevalência da disfunção tiroideia e da patologia nodular da tiróide na população portuguesa e consequentes preocupações com sintomas muitas vezes associados à disfunção tiroideia e com o risco de cancro da tiróide”.
Apesar de não ser conhecido nenhum estudo nacional que aborde o impacto socioeconómico das doenças da tiróide, o especialista supõe que, “a disfunção tiroideia, a patologia nodular da tiróide e a carência iodada na população portuguesa, tenham forte impacto atendendo à sua elevada prevalência”. Por isso o especialista alerta para “um adequado aporte iodado que poderá contribuir para a redução da prevalência do bócio nodular e da disfunção tiroideia e reduzir o risco fetal durante a gravidez.
À semelhança de tantas outras situações, o diagnóstico precoce da disfunção tiroideia, nomeadamente em populações de risco poderá contribuir para um tratamento mais atempado, principalmente as mulheres em idade fértil devido ao risco fetal da disfunção tiroideia materna durante a gravidez.
Principais doenças da tiróide
As doenças da tiróide podem traduzir-se por alterações funcionais ou morfológicas e os distúrbios da função tiroideia podem envolver um acréscimo de função (Hipertiroidismo) ou uma diminuição da mesma (Hipotiroidismo).
As disfunções tiroideias, numa fase inicial, podem ser subclínicas, ou seja, a hormona reguladora da tiróide – a TSH- está alterada mas os níveis sanguíneos das hormonas tiroideias são ainda normais. Assim, o hipotiroidismo subclínico, que se traduz apenas por uma TSH aumentada, é a forma mais prevalente de disfunção tiroideia, podendo atingir cerca de 8 a 9% da população. “Já o hipotiroidismo subclínico poderá ter um risco anual de evolução para uma forma clínica de 3%”, refere o especialista, acrescentando que, “a Tiroidite auto-imune é a principal causa de disfunção tiroideia podendo ter uma prevalência superior a 10%, em particular no sexo feminino”.
Já do ponto de vista morfológico, diz Luís Raposo, “podemos considerar o bócio difuso -a alteração morfológica mais frequente - e o bócio nodular.”
A prevalência de nódulos da tiróide palpáveis, na população, poderá atingir 3 a 7% mas a prevalência ecográfica de nódulos da tiróide é muito superior (20 a 76%). Contudo, “apesar da elevada prevalência, a maior parte dos nódulos da tiróide são benignos, cerca de 95%”, refere Luís Raposo.
O cancro da tiróide é o tumor endócrino mais frequente (> 90%), mas apenas contribui para cerca de 1% de todos os cancros em Portugal.
Dados estatísticos
Segundo os dados do Observatório Europeu do Cancro (ECO), no ano de 2012, Portugal apresentou uma incidência anual (novos casos) de cancro da tiróide de 4.4 casos por 100,000 (6.4 no sexo feminino e 2.2 no sexo masculino por 100,000) e uma mortalidade de 0,5%. Para além disso, os dados disponíveis em Portugal sugerem um aumento da sua incidência, acompanhando a tendência na Europa e no mundo. Este aumento, conta Luis Raposo “tem ocorrido sobretudo à custa dos carcinomas de menor diâmetro, com muito baixo risco, mas a grande maioria dos doentes com cancro da tiróide tem um bom prognóstico”.
Já a prevalência do cancro da tiróide apresenta variações geográficas: maior no Norte, menor no Sul e intermédia no Centro de Portugal. Na opinião do responsável, “estas diferenças poderão dever-se, em parte, a assimetrias no acesso a consultas de especialidade e a exames de diagnóstico (nomeadamente a citologia aspirativa) e diferenças de critérios na indicação para a citologia dos nódulos da tiróide e para a cirurgia do bócio multinodular simples”.
Dada a falta de dados estatísticos em Portugal que possam orientar os profissionais e instituições de saúde, Luís Raposo explica ao Atlas da Saúde, que “o Grupo de Estudo da Tiróide (GET) tem actualmente em curso um projecto para a avaliação da prevalência nacional da disfunção tiroideia e da tiroidite auto-imune e pretende realizar em breve estudo de prevalência ecográfica de nódulos da tiróide na região Norte”. Para além dos referidos estudos, o GET propõe-se, em breve, analisar os dados disponíveis dos Registos Oncológicos Regionais com o objectivo de avaliar tendências na evolução da incidência do cancro da tiróide em Portugal.