Planeamento Familiar

Aborto: Entre a dignidade da mulher e a visão do holocausto

Os defensores da despenalização do aborto consideram que praticamente foram eliminadas as complicações associadas a esta prática ilegal e que se devolveu a dignidade à mulher, mas ainda há quem compare a medida ao holocausto.

Para Duarte Vilar, diretor executivo da Associação para o Planeamento da Família (APF), quem defendeu a despenalização – decidida no referendo que ocorreu faz sábado dez anos – e lutou pelo aborto legal e seguro “tinha toda a razão para o fazer”.

Dez anos depois, “os malefícios associados ao aborto clandestino diminuíram, baixou drasticamente o número de internamentos de mulheres por complicações graves, nomeadamente a perfuração de órgãos e as infeções por sepsis”.

Duarte Vilar sublinha que a partir de 2007 deixou de existir mulheres julgadas e expostas a essa indignação.

Por seu lado, e “ao contrário do que diziam os opositores da despenalização do aborto, este tem vindo a diminuir”.

Esta diminuição estará relacionada com a descida do número absoluto das mulheres em idade fértil, mas também pelos benefícios de um maior aconselhamento proporcionado aquando do processo da Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG) em meios legais.

“Antigamente as mulheres não tinham serviço de aborto legal e expunham-se aos circuitos ilegais. Não tinham referenciação, nem consulta ou aconselhamento”, disse.

Para Duarte Vilar, “a legalização melhorou a saúde reprodutora das mulheres, aumentou o uso dos contracetivos e de mulheres referenciadas para consultas de planeamento familiar”.

Ainda assim, Duarte Vilar defende um alargamento das dez para as 12 semanas (a contar desde a última menstruação) do prazo legal para a IVG a pedido da mulher, por acreditar que assim iria evitar que mulheres menos organizadas e desinformadas ficassem de fora da lei.

Para o economista João César das Neves, que durante a campanha do referendo vaticinou que a discriminação iria fazer com que o aborto passasse a ser uma coisa "tão normal como um telemóvel", a única medida que poderia melhorar a lei seria a sua revogação.

O pior da lei foi, na sua opinião, “a morte assistida de dezenas de milhar de crianças, precisamente no momento em que estão mais frágeis e inocentes”.

E quando questionado sobre aspetos positivos da lei, João César das Neves responde com outra interrogação: “Seria capaz de perguntar a alguém o que de melhor trouxe o holocausto, ou a escravatura?”.

“Estamos a falar de um morticínio desse tipo, onde é muito difícil ver coisas melhores”.

Sobre a evolução dos números do aborto em Portugal, que tem vindo a decrescer, o economista disse que estes são “muito elevados”.

“Medidos em percentagem dos nascimentos, estão a nível intermédio na Europa, acima de países como Alemanha, Finlândia e Itália, mas abaixo de países como a Suécia, Reino Unido, Dinamarca”, enumerou.

Para João César das Neves, esta evolução “podia ser pior, mas está longe de ser sequer razoável. Só uma insensibilidade aos direitos humanos dos fetos pode considerar razoável um aborto que seja”.

O economista considera que “a lei do aborto começou logo por constituir uma grande fraude jurídica, porque se fez um referendo sobre a liberalização da prática, mas o que realmente depois se aprovou foi a subsidiação e promoção do aborto”.

“Em todos os tempos, todos os opressores sempre defenderam a sua posição negando a humanidade das vítimas (escravos, índios, judeus, estrangeiros, mulheres, etc.) - como não são seres humanos, podem-se matar. É com horror que vejo isso ser feito, no Portugal democrático do início do século XXI, com os embriões e fetos humanos, só porque dá jeito aos pais”, disse.

Os dados oficiais da Direção-geral da Saúde de 2016 ainda não estão disponíveis, mas as estatísticas dos oito anos completos de despenalização da interrupção da gravidez (2008 a 2015) mostram uma tendência de decréscimo sobretudo a partir de 2012.

No último relatório com os registos de interrupção da gravidez, mostra-se que quanto ao aborto por opção da mulher, houve uma diminuição de 1,9% entre 2014 e 2015, tendo sido feitas 15.873 interrupções por decisão da grávida nesse ano.

Fonte: 
LUSA
Nota: 
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