Diabetes Mellitus

12,4% dos portugueses com diabetes

Atualizado: 
07/03/2018 - 14:46
A Diabetes afeta cerca de 400 milhões de pessoas em todo o mundo e cerca de 1 milhão de portugueses. Estima-se que 2030 o número de diabéticos ultrapasse os 500 milhões. No dia em que se assinala mundialmente a doença, a endocrinologista Joana Costa descreve-nos aquela que é considerada a pandemia do século XXI.

A diabetes mellitus é uma doença caracterizada pela subida dos níveis de açúcar no sangue (hiperglicemia).

A diabetes mellitus tipo 2 (DM2) é considerada pela OMS a pandemia do século XXI. A pandemia da DM2 acompanha a pandemia da obesidade e designadamente a da obesidade infantil. Há por isso um número crescente de crianças com DM2 ao contrário do que era o usual. É reconhecida a natureza agressiva da doença, quando diagnosticada mais cedo associa-se a uma maior taxa de complicações crónicas mais precoce, que conduzem à morte prematura.

A obesidade na grande maioria dos casos é resultante do estilo de vida. A sedentarização da sociedade associada ao consumo calórico elevado têm como consequência o ganho progressivo de peso. A alimentação fraccionada com escolhas saudáveis como os legumes frescos, alimentos ricos em fibras e frutas devem ser promovidos e instituídos desde cedo. Devem ser evitados alimentos pré-confeccionados, ricos em gorduras ou em açúcares simples. A prática regular de exercício físico deve ser incentivado e a restrição do tempo dedicado a actividades mais sedentárias pode ser condicionado. Embora a história familiar de DM2 aumente o risco de vir a ter a doença, a mudança do estilo de vida pode atrasar ou impedir o seu aparecimento.

A estratégia de implementação do estilo de vida saudável é recomendada na abordagem inicial da DM2

Também a nível mundial se tem observado um aumento de cerca de 1-5% do número de novos casos de diabetes mellitus tipo 1 (DM1) diagnosticados por ano. A causa deste aumento tem sido objecto de inúmeras investigações.

A DM1 é uma doença auto-imune que se carateriza pela produção insuficiente de insulina desde o diagnóstico. Os mecanismos que conduzem ao seu aparecimento não estão totalmente esclarecidos. A sua origem é atribuída a factores genéticos e a factores ambientais. Foram identificados genes que se sabe que conferem susceptibilidade para a ocorrência da doença. Têm também sido apontados diversos factores do ambiente que funcionam como gatilhos do processo que conduz à destruição pancreática e consequente insuficiência de insulina. As infeções virais e a exposição precoce a alguns nutrientes, nomeadamente glúten, cereais e frutos vermelhos, são factores ambientais para que aponta a evidência científica. Tem sido reconhecido o papel protector do microbioma intestinal (microorganismos que colonizam o tracto intestinal) na génese da DM1. Nalguns estudos demonstrou-se que a utilização de antibióticos e consequente alteração do microbioma intestinal aumenta o número de novos casos de DM1. O conhecimento dos mecanismos que conduzem à doença permitirá desenvolver estratégias a sua prevenção.
Desde o início do século passado, observaram-se mudanças significativas na compreensão da diabetes mellitus e na forma de tratá-la.

A abordagem multidisciplinar da doença e a educação terapêutica, através de programas estruturados com envolvimento de técnicos de saúde, da pessoa com diabetes e da sua família são o cerne da prestação de cuidados nesta patologia. Têm como objectivo o empowerment, o envolvimento do doente na gestão da sua doença e a motivação, fundamentais à adesão e ao sucesso do tratamento.

O tratamento farmacológico desta condição evoluiu de forma significativa nos últimos 50 anos. Foram desenvolvidas moléculas de insulina que permitem tratar de forma mais fisiológica a doença e surgiram outras classes de medicamentos que permitem corrigir as alterações inerentes à patologia a vários níveis (no caso da DM2).

Relativamente ao tratamento com insulina, para além das características farmacológicas das moléculas desenvolvidas, verificou-se também um grande progresso na forma da sua administração, inicialmente feita por seringa, posteriormente por dispositivos de caneta de corpo fixo ou descartável e finalmente por dispositivos de perfusão sub-cutânea de insulina (bomba de insulina). A evolução das moléculas de insulina e da forma de administração do tratamento melhorou significativamente a qualidade de vida das pessoas, tornando os esquemas de tratamento mais flexíveis e adaptados a cada indivíduo. Nalguns países está disponível a insulina inalada, indicada em doentes com diagnóstico de DM2.

Estão ainda em investigação outras vias menos invasivas de administração da insulina como a oral, a transdérmica, a intraperitoneal e a nasal.

Os avanços no tratamento permitiram melhorar o controlo da diabetes mellitus e prevenir as complicações agudas e crónicas da doença com consequente aumento da qualidade de vida e da longevidade destes doentes.

As ferramentas que existem actualmente para avaliação da glicemia –glucómetros e sistemas de monitorização contínua da glucose- são extremamente precisas e de fácil utilização. As tiras de avaliação da concentração da glucose no sangue substituíram as tiras da concentração da glucose na urina. A avaliação da concentração dos corpos cetónicos no sangue é também possível com alguns medidores de glicemia, o que representa uma mais-valia para as pessoas com diagnóstico de DM1.

É actualmente possível monitorizar a glicemia no domicílio de forma extremamente fácil e fiável, e ao longo das 24 horas, o que permite o ajuste precoce e adequado do tratamento.

Os sistemas de monitorização contínua da glucose, permitem a avaliação dos níveis de glucose no tecido sub-cutâneo (liquido intersticial) através de um sensor que é introduzido na pele. O cateter deve ser susbtituído com fequência variável. Essa informação é transmitida cada 1 a 5 minutos para um monitor onde a informação pode ser consultada em tempo real ou retrospectivamente. Estes sistemas permitem detectar elevação ou descida de valores, bem como prever a tendência. Embora reduzam o número de avaliações por picada do dedo, actualmente, estes sistemas estão aprovados para utilização em associação com os medidores tradicionais, que permitem aferir resultados em situações em que há redução da exactidão dos sistemas, nomeadamente para valores excessivamente baixo ou variações rápidas da glicemia como as induzidas pelo exercício físico.

Outros sistemas de leitura da glicemia através de microelectrodos, radiofrequência, sensores de fibra óptica ou microchips em lentes de contacto poderão ser o futuro, encontrando-se actualmente apenas no campo da investigação.

Há dispositivos que têm incorporados para além do sistema de leitura de valores, algoritmos que permitem calcular a dose necessária de insulina a administrar, tendo em conta variáveis outras (factor de sensibilidade à insulina e quantidade de hidratos de carbono incluídos na refeição).

O pâncreas artificial é um sistema de tratamento fechado, em que estão associados um mecanismo de perfusão contínua de insulina e outro de monitorização em tempo real dos níveis de glicemia, sendo o ajuste do ritmo de perfusão independente da intervenção do utilizador. A principal diferença entre este e o sistema de perfusão sub-cutânea de insulina (bomba de insulina) é o ajuste automático da dose de insulina de acordo com a monitorização da glicemia em tempo real, através de algoritmos que calculam a dose necessária tendo em conta a tendência dos valores. Permitem um melhor controlo dos níveis da glicemia, reduzem o risco de hipoglicemia e diminuem a frequência da vigilância da glicemia capilar através da picada do dedo, libertando o doente deste tipo de cuidado. Existem já pâncreas artificiais que associam à insulina outra hormona (glucagon) de forma a reproduzir os mecanismos fisiológicos de controlo da glicemia que existem antes da doença.

Embora estes sistemas tenham já sido testado por várias empresas desde há vários anos, não estão ainda disponíveis na prática clínica na Europa. 

Autor: 
Dra. Joana Costa - Endocrinologista Hospital Lusíadas Lisboa
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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