Violência contra pessoas idosas é sobretudo psicológica e financeira

Os dados, que coincidem com resultados de outras análises sobre este tema feitas no território nacional, constam da tese de doutoramento da professora da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC), Cristina Veríssimo, defendida este ano pela investigadora, na Universidade Católica Portuguesa, sob o título “Violência Contra as Pessoas Idosas na Comunidade. Desafios e Prioridades para a Ação dos Enfermeiros".
De acordo com os resultados do estudo da docente especialista em saúde pública, aplicado a uma amostra de 427 pessoas idosas (faixa etária entre os 60 e os 95 anos), no “último ano” (ano em que responderam ao questionário), 39,4% dos inquiridos revelaram ter sido vítimas de algum tipo de violência.
Nesse período, verificou-se que esta população foi, sobretudo, vítima de violência psicológica (28,3%) e financeira (12,9%), seguindo-se a negligência (3,3%), a violência física (2,8%), as lesões físicas (1,6%) e a violência sexual (0,2%).
Os números disparam quando falamos da prevalência da violência contra pessoas idosas “ao longo da vida”: 42,4% para a violência psicológica, 33,0% para a financeira, 15,7% para a física, 10,5% para lesões físicas e 4,9% para a violência sexual.
Diferenças entre rendimentos, sexo, idade e qualificações
Segundo a investigadora Cristina Veríssimo, «a prevalência da violência psicológica, violência física e lesões físicas foi significativamente superior» nas pessoas idosas «com rendimentos mensais iguais ou inferiores a 500 euros», evidenciando este estudo que os indivíduos «com rendimentos mais baixos estavam mais propensos aos diferentes tipos de violência analisados».
Os resultados deste estudo mostram, por outro lado, que «a diferença na ocorrência de violência psicológica, física e lesões físicas entre sexos foi estatisticamente significativa, sendo mais frequente entre as mulheres».
Quanto às formas de violência por média etária, reportaram violência psicológica sobretudo os inquiridos mais novos, enquanto «os indivíduos que relataram negligência tinham idades significativamente superiores».
Segundo as habilitações literárias, a análise feita pela professora da ESEnfC «revelou que a prevalência da violência física e lesões físicas foi significativamente mais elevada nos indivíduos com habilitações inferiores ao 1º ciclo do que nos que tinham o 1º ciclo ou mais».
Já no caso da violência financeira, «foram aqueles com profissões mais qualificadas que foram mais vitimizados».
No estudo de Cristina Veríssimo, «os elementos da família» surgem como «os agressores predominantes, nomeadamente os da família nuclear».
«O marido/esposa/companheiro(a) e os descendentes (filho/filha) destacaram-se como os principais agressores na violência psicológica, seguidos do/a amiga(o)/conhecido(a)/ /colega/vizinho(a)», sendo esta realidade semelhante «à encontrada na violência física e nas lesões físicas», esclarece a professora da ESEnfC.
Na violência financeira, os agressores foram sobretudo os filhos (homens), enquanto na violência sexual ao longo da vida (com as mulheres a serem as principais vítimas), os agressores foram sobretudo o cônjuge/companheiro(a) e ex-marido.
Sugestões para a prática de Enfermagem
A finalidade deste estudo «é servir de base a abordagens multidisciplinares que permitam estruturar atividades, instrumentos e mecanismos para prevenir e gerir o fenómeno», dando «contributos para que os enfermeiros possam responder às necessidades das pessoas idosas e suas famílias e da comunidade onde se inserem», lê-se na tese de Cristina Veríssimo.
A título de exemplo, e entre outras sugestões, a docente da ESEnfC afirma que «os enfermeiros devem aproveitar todas as oportunidades de contacto nos vários contextos de trabalho», sendo que «a visita domiciliária proporciona uma oportunidade para prevenir, detetar precocemente estas situações e acompanhar os casos de risco».
Aliás, «como estratégia, seria importante implementar, em todas as Unidades de Saúde Familiar, as visitas domiciliárias de carácter preventivo às pessoas idosas dependentes», recomenda Cristina Veríssimo.
A professora de Enfermagem adverte que «as respostas a este fenómeno exigem uma abordagem multidisciplinar, já que mobilizam vários sistemas – de saúde, social e de justiça».
Cristina Veríssimo nota, ainda, que, tendo «os resultados deste trabalho» sido «anteriores ao período pandémico», as «pessoas idosas que ficaram em isolamento, ou confinadas com elementos da família e/ou cuidadores, podem ter enfrentado maior risco de violência, pelo que é necessário dar continuidade ao estudo desta problemática».