Seminário mostra que resposta eficaz a crises faz-se com antecipação e comunicação global
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Apifarma, Infarmed, Cruz Vermelha, Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS) e UNICEF foram unânimes quanto aos três pilares que asseguram a resposta imediata e eficaz em tempos de crise, seja sanitária ou humanitária: antecipação, comunicação e isenção. “Assistimos à evolução das cadeias logísticas, mas, quando chegamos a determinados locais, as dificuldades mantêm-se: é necessário planeamento e antecipação. A criação de reservas estratégicas torna-se cada vez mais importante”, afirmou Gonçalo Orfão. O Coordenador Nacional de Emergência da Cruz Vermelha deu como exemplo a reação da instituição em janeiro de 2020: “Quando o COVID ainda nem tinha chegado a Portugal, foi quando começámos a criar kits de proteção individual de reserva e foi isso que nos permitiu dar uma resposta imediata logo no início da pandemia”.
Foi também isso que o Infarmed fez, ainda antes da propagação nacional do vírus. “Enquanto regulador, todas as medidas adotadas foram no sentido de agilizar o acesso a medicamentos de toda a população. Isso foi conseguido nas diferentes fases da pandemia, sempre num curto espaço de tempo. A reserva estratégica de medicamentos foi criada logo no início da pandemia, dos confinamentos e dos primeiros sinais de pressão sobre o sistema de saúde”, recordou Vasco Bettencourt, Diretor da Unidade de Licenciamentos do Infarmed.
Tão importante como a antecipação das necessidades é a comunicação, como apontou Luísa Motta, Diretora de Marketing e Fundraising da UNICEF. “Os nossos programas de desenvolvimento dependem do abastecimento. É preciso haver uma capacidade logística e um sistema muito fortes, resilientes e reativos para que exista uma resposta eficaz”, referiu. No caso do atual conflito na Ucrânia, “onde existem 5 delegações da UNICEF há 25 anos”, quando do início da invasão, “já nos era possível fazer um levantamento das necessidades específicas ainda antes de se tornarem prementes. A UNICEF abasteceu muitos hospitais com equipamentos cirúrgicos, hospitalares e medicamentos. Isto só foi possível porque já existia essa ligação e uma cadeia logística capaz de chegar lá”, explicou.
Donativos materiais podem causar entropias
Ainda que bem-intencionados, os apoios da sociedade civil às instituições humanitárias, através de donativos materiais, como roupa, podem nem sempre ser úteis. Isto porque, como explicaram os oradores, “aquilo que nos chega ao terreno não é aquilo que precisamos para dar resposta”. André Costa Jorge, do JRS, explica que “estes cenários mundiais despertam, em toda a sociedade europeia, uma vontade solidária que, de alguma forma, perdeu racionalidade”. Referindo-se aos envios massivos de bens materiais e alimentares, o responsável destaca que, não sendo aquilo que está em falta no terreno, “acaba por criar, em muitas organizações que não tinham uma estrutura preparada, a necessidade de criar condições logísticas, muitas vezes desnecessárias, em termos de energia gasta e desfoque em relação àquilo que é a missão destas organizações. Portanto, o «querer fazer qualquer coisa» não significa necessariamente fazer o correto”.
É também por essa razão que “a Cruz Vermelha não aceita doações em bens, pela dificuldade de fazer toda a rastreabilidade e assegurar que esses donativos materiais venham a ser usados”. Por isso, Gonçalo Órfão deixa o apelo: “É extremamente importante confiar nas instituições que estão no terreno e na transparência das doações monetárias. O donativo financeiro é mais real”.
“Falta de medicamentos disponíveis” é cenário provável
Em representação da indústria farmacêutica, o Diretor de Inovação da APIFARMA, Heitor Costa, alertou para os impactos que o atual conflito geopolítico tem tido sobre as cadeias de abastecimento na saúde. Apesar de não antever disrupções nas cadeias de abastecimento, dado que “o impacto dos dois países [Rússia e Ucrânia] na capacidade de produção, distribuição e logística é residual”, Heitor Costa salienta que o aumento dos custos da energia tem impactado os custos de produção de medicamentos e dispositivos médicos, o que faz da fixação de preços algo “não compaginável” com a atual situação.
“O aumento dos custos da energia, fruto do atual conflito, impactou os custos de produção da indústria farmacêutica em cerca de 30%. Se nós temos dificuldades em fabricar os medicamentos, e como não é possível vender esses medicamentos abaixo desse custo de produção, isso pode ter alguma repercussão na falta de medicamentos, sobretudo aqueles mais antigos e cujos preços estão muito degradados. A APIFARMA já o disse e continua a alertar para o facto de o atual regime de revisão excecional de preços não ser compaginável com a atual situação de aumentos brutais dos custos de distribuição e fabrico, sobre os quais não conseguimos fazer nada porque os preços dos medicamentos estão fixados”, explicou Heitor Costa.
Os grandes desafios para a Saúde no próximo ano
O Seminário de Saúde da GS1 Portugal contou também com uma apresentação do estudo anual que a Deloitte faz para o setor da saúde, à escala global. Miguel Rodrigues, Senior Manager da consultora, elencou os principais desafios que o setor continuará a enfrentar no futuro a curto-médio prazo: “Equidade na saúde; Mudanças climáticas; Saúde Mental, Transformação Digital e o Futuro das Ciências Médicas”.
O que podemos esperar? A certeza de que “o setor [da Saúde] é grande demais para que existam transformações repentinas”, mas também uma boa notícia: “Iremos ver avanços em todos os aspetos ligados com utilização da tecnologia, acelerando diversos processos dentro do setor, como a transformação das cadeias de abastecimento e a deslocalização dos ‘labs’ para junto dos pacientes”, concluiu Miguel Rodrigues.
A necessidade de uma linguagem global
A iniciativa setorial da GS1 Portugal contou ainda com uma mensagem-chave por parte de Geraldine Lissalde Bonnet, Vice-Presidente da GS1 Healthcare, que reforçou a importância da adoção de standards GS1 para que a comunicação e partilha de informação seja interoperável e uniformizada, à escala global.
“Tanto a pandemia como o atual conflito mostraram-nos a importância da cooperação e da interoperabilidade. Precisamos de confiança para a criação de uma cadeia de valor realmente eficaz. Os standards da GS1 são facilitadores que podem – e devem - ser utilizados por todos os stakeholders de qualquer cadeia de valor, de modo que, à escala mundial, possamos viabilizar a interoperabilidade, os processos colaborativos e acelerar a transição digital, garantiu Geraldine Lissalde Bonnet.
A importância da eficiência em armazém
A 8.ª edição do Seminário de Saúde da GS1 Portugal contou ainda com a apresentação dos resultados finais de um estudo de caso liderado pela GS1 Portugal em colaboração com a cadeia de parafarmácias da MC, a Wells, em que foi confirmada a importância da codificação correta de unidades logísticas em armazém, com vista a uma maior eficiência do processo de receção e posterior armazenamento. Madalena Centeno, Gestora Sénior de Saúde e Standards da GS1 Portugal, destacou a esse propósito que “este projeto apenas veio reafirmar o impacto positivo dos standards GS1 na cadeia de abastecimento, ao reduzir para metade o tempo gasto pelos operadores a conferir e a dar entrada das encomendas que chegam ao armazém". Este processo, quando aplicado às cadeias de abastecimento de emergência e assistência sanitária e humanitária, tem também resultados assinaláveis em eficiência.