Prémio Maria de Sousa entregue a jovens investigadores com projetos na área das ciências da saúde
Maria Arez, do Instituto de Bioengenharia e Biociências do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa; Pedro Nascimento Alves, do Centro de Estudos Egas Moniz da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, Ana Rita Araújo e Joana Gaifem, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto, e Samuel Gonçalves, do Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) da Escola de Medicina da Universidade do Minho, são os cientistas distinguidos pela excelência dos seus projetos de investigação com até 30 mil euros cada, incluindo um estágio num centro internacional de excelência.
A cerimónia de entrega do Prémio Maria de Sousa, na sua 4ª edição, acontecerá hoje, pelas 17:00, na Aula Magna da Reitoria da Universidade de Lisboa, precedendo a Conferência “Sobre a Fisiologia da Mente 2024”, preparada pelos neurocientistas António Damásio e Hanna Damásio e apresentada pelo primeiro, realizada no âmbito da celebração dos 30 anos da Fundação BIAL.
Estarão presentes o Primeiro-Ministro, Luís Montenegro, que encerra a sessão, o Ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, e o presidente da Fundação BIAL, Luís Portela.
Maria Arez, investigadora do Instituto de Bioengenharia e Biociências do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, propõe-se, com o projeto “Uma nova abordagem para corrigir defeitos de imprinting genómico durante a reprogramação de células estaminais pluripotentes induzidas”, compreender as causas dos erros que ocorrem durante a criação células estaminais pluripotentes induzidas (iPSCs) e, com isto, desenvolver um método inovador para evitar esses defeitos, garantindo a integridade destas células. O sucesso deste trabalho contribuirá significativamente para a área das células estaminais, melhorando a segurança e eficácia das iPSCs em contextos científicos e clínicos. Com a otimização do processo de criação destas células, este projeto abrirá portas para terapias celulares mais confiáveis e eficazes, fortalecendo o papel das iPSCs na medicina regenerativa e oferecendo novas possibilidades de tratamento para diversas doenças, tais como doenças cardiovasculares, diabetes, cegueira e doenças neurodegenerativas.
A descoberta das iPSCs trouxe grandes avanços para a medicina. Estas células são criadas em laboratório a partir de células adultas do corpo humano, como células da pele ou do sangue, e têm a incrível capacidade de se transformar em qualquer outro tipo de células, como células do coração, dos nervos ou dos músculos. No entanto, durante o processo de criação destas células em laboratório, elas podem sofrer "erros" no controlo da expressão de certos genes, especialmente nas áreas do genoma reguladas por um mecanismo chamado imprinting genómico. Esses erros estão associados a doenças do desenvolvimento e a cancros, por isso este trabalho tem como objetivo identificar e corrigir esses erros usando métodos e tecnologias modernas, para criar iPSCs livres desses defeitos. Desta forma, as iPSCs serão mais seguras e confiáveis para serem usadas nos tratamentos de saúde no futuro.
O projeto do investigador Pedro Nascimento Alves, do Centro de Estudos Egas Moniz da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, sob o título “Modulação personalizada dos circuitos de neurotransmissores em doentes com AVC”, centra-se no estudo do Acidente Vascular Cerebral (AVC), uma das principais causas de alterações cognitivas.
O cérebro é constituído por milhares de milhões de neurónios, que comunicam entre si através de substâncias químicas chamadas neurotransmissores, formando circuitos eletroquímicos. O AVC é uma doença muito frequente causada por um défice de sangue ou hemorragia numa determinada região do cérebro. A lesão do AVC vai interromper os circuitos neuronais mediados pelos neurotransmissores, provocando defeitos cognitivos, tais como alterações da fala, memória e concentração. Recentemente, foi desenvolvida uma técnica que permite calcular quais os circuitos de neurotransmissores que são alterados por um determinado AVC. Este projeto de investigação vai assim testar se a administração de medicamentos com potencial para reequilibrar esses circuitos melhora as sequelas cognitivas do AVC. Não existindo atualmente medicamentos que melhorem as alterações cognitivas do AVC, esta abordagem (a revelar-se eficaz) terá um impacto importante, dado que mais de 25 milhões de pessoas no mundo já sofreram um AVC e uma grande percentagem fica com sequelas cognitivas limitativas.
O projeto de Ana Rita Araújo, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto, intitula-se “BOOST-Age: Reforçar a capacidade proliferativa dos tecidos envelhecidos para manter o bom funcionamento dos órgãos”. Com este projeto pretende-se perceber se as células que proliferam durante mais tempo ao longo da nossa vida têm um papel protetor na manutenção da função dos diferentes tecidos e ajudam à desaceleração do envelhecimento. Para isso, serão usados modelos in vitro, mais especificamente células de indivíduos com diferentes idades, e modelos in vivo que consistem em ratinhos de diferentes idades. Vão ainda ser usados “super-ratinhos” que têm uma molécula que os investigadores já sabem que prolonga a longevidade destes animais porque promove a divisão celular controlada e regulada.
Até ao momento, conhece-se muito pouco sobre a regulação (ou falta dela) da divisão celular durante o processo de envelhecimento. Sabe-se que ao longo da nossa vida as células começam a dividir-se cada vez mais lentamente até ao ponto em que param e entram em processo de senescência. Esta fase está intimamente ligada ao desenvolvimento de um processo inflamatório exacerbado que influencia a longevidade dos indivíduos e o aparecimento de doenças ligadas ao envelhecimento, como doenças cardiovasculares, neurodegenerativas e inflamatórias. É, por isso, importante perceber em que consiste o envelhecimento a nível molecular e celular. Recentemente, descobriu-se que existe um mecanismo de regulação do ciclo celular que é responsável pele manutenção da capacidade proliferativa das células e, com este projeto, pretende-se perceber este processo in vivo usando como modelo o ratinho. Pretende-se investigar se a sustentação deste mecanismo in vivo em tecidos mais proliferativos como o intestino e o baço os mantém “jovens” durante mais tempo em contraste com tecidos menos proliferativos como o cérebro ou o coração. Em suma, o objetivo é perceber se a melhoria da proliferação das células envelhecidas é essencial para preservação da função dos tecidos e órgãos, contribuindo assim para a extensão do tempo de vida saudável.
Samuel Gonçalves, do Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) da Escola de Medicina da Universidade do Minho, vai desenvolver o projeto “Regulação da imunidade antifúngica pelo metabolismo do colesterol no contexto de doença respiratória fúngica”.
O Aspergillus fumigatus é um fungo ambiental que está presente em todo lado, inclusive dentro das nossas casas e, por essa razão, inalamos centenas dos seus esporos, diariamente. Na maioria dos indivíduos saudáveis, este fungo não causa doença, contudo, em alguns, sobretudo nos que apresentam o sistema imunitário comprometido, por exemplo, devido a um transplante ou a um tumor, este fungo pode causar uma doença respiratória fatal chamada Aspergilose Pulmonar Invasiva (API). Apesar de alguns avanços significativos no combate a esta infeção terem sido feitos nos últimos anos, quer o diagnóstico quer o tratamento desta infeção, continua a ser um problema clínico sério, o que resulta em elevadas taxas de mortalidade. Sabe-se que as células do sistema imunitário ativam vias metabólicas específicas em resposta a esta infeção. Recentemente, descobriu-se que uma das vias que é ativada é a via de síntese do colesterol. Neste sentido, este projeto foca-se no estudo dos mecanismos moleculares através dos quais o metabolismo do colesterol contribui para as respostas imunitárias antifúngicas. A compreensão detalhada de como o metabolismo celular pode contribuir para a suscetibilidade à API vai possibilitar encontrar novos alvos terapêuticos e desenvolver novas estratégias de medicina personalizada, que permitam reduzir as elevadas taxas de mortalidade e melhorar a qualidade de vida dos indivíduos suscetíveis a esta infeção.
O projeto de Joana Gaifem, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto, tem como título “Alimentar a imunidade: glicanos como agentes nutricionais na dinâmica hospedeiro-microbioma na DII”.
A investigação tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento de novas estratégias de prevenção da doença inflamatória intestinal (DII). Esta doença, que inclui a doença de Crohn e a colite ulcerosa, é diagnosticada sobretudo em jovens adultos e não apresenta, de momento, um tratamento que seja eficaz para todos os doentes. É também uma doença multifactorial, pelo que é ainda mais difícil prever quem vai desenvolver a doença, e como prevenir ou tratar a mesma. Para isso, vão ser estudadas amostras de doentes com DII e indivíduos saudáveis, e modelos experimentais de ratinho, o que permitirá compreender a dinâmica entre a microbiota intestinal e o hospedeiro, com os glicanos como elemento-chave nesta interação. Com este projeto de investigação pretende-se explorar se o perfil de glicanos (açúcares) presentes na mucosa intestinal do hospedeiro é capaz de definir a composição da microbiota intestinal, e de que forma é que esta interação pode ditar um intestino saudável ou um ambiente inflamatório (doença). O objetivo primordial será contribuir para o desenvolvimento de novas terapias, abrindo caminho para estratégias preventivas para a DII.
Os trabalhos vencedores foram escolhidos por um Júri presidido pelo neurocientista Rui Costa, presidente e diretor executivo do Allen Institute, nos Estados Unidos.