Estudo da FMUP sugere associação entre hormona ligada ao stress e risco de obesidade no futuro
Investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) desenvolveram um estudo de revisão acerca das mais recentes descobertas sobre os efeitos da hormona libertadora de corticotrofina (CRH) no ganho de peso desde o útero materno.
Os resultados deste trabalho, publicado na revista científica Obesity Reviews, apontam para a existência de uma relação perigosa entre este fator hormonal libertado no cérebro e o desenvolvimento de obesidade em diferentes fases da vida.
“A hormona libertadora de corticotrofina parece-nos um mediador importante entre a obesidade materna e o risco de obesidade dos filhos, tendo, por isso, repercussões desde a vida fetal até à vida adulta”, afirma Carmen Brás Silva, professora da FMUP e autora principal deste estudo.
Como explicam os autores, “a CRH é libertada no cérebro e promove a produção da principal hormona de stress, o cortisol. O cortisol tem diversos efeitos metabólicos. Atua, nomeadamente, no fígado, promovendo a disponibilidade de glicose como fonte de energia e a acumulação de gordura no tecido adiposo”.
De acordo com os investigadores da FMUP, “a CRH atua como sinalizador de stress em resposta a vários fatores stressores, como a restrição de nutrientes e a infeção durante a gestação ou a depressão e a ansiedade da mãe” durante a gravidez. Assim, por exemplo, “num ambiente in utero em que os nutrientes são restritos, há um condicionamento dos fetos para o armazenamento de energia, de forma que se possam preparar para um ambiente pós-natal de escassez”.
Mas o que acontece, na prática, pode ser bem diferente. Após o nascimento, o bebé recebe, frequentemente, alimentos e nutrientes em abundância. A “programação” para a escassez e para o armazenamento de energia, que tinha sido estimulada pela CRH dentro do útero, acaba por ser desadequada. O resultado pode ser a obesidade, uma doença crónica complexa muito comum e com múltiplos fatores intervenientes.
Embora a CRH seja apontada como “um mediador importante na programação fetal para o risco de obesidade futura”, falta agora saber como e quando intervir sobre a hormona em causa.
“Neste momento, não existem estudos de intervenção no controlo desta hormona com os objetivos de prevenção e tratamento da obesidade. A nossa esperança é que, com este conhecimento, se invista em projetos que permitam não só compreender melhor estas associações, mas também avaliar que tipo de intervenções tem maior sucesso nestes doentes”, sublinham os autores do artigo.
São igualmente essenciais novos estudos que avaliem os “períodos críticos para o desenvolvimento de obesidade”, com o objetivo de se conseguir “uma intervenção mais eficaz”.
Uma das maiores dificuldades poderá ser o acompanhamento das crianças ao longo da vida, algo tido como “essencial para um melhor entendimento do real impacto da CRH no risco de obesidade a longo prazo, e tendo sempre em conta outros fatores intervenientes, tais como fatores ambientais e sociais e a presença de outras doenças”.
Financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e por uma Bolsa Marie Skłodowska-Curie, esta investigação teve também a autoria de Inês Vasconcelos e Madalena von Hafe (estudantes do Programa Doutoral em Ciências Cardiovasculares e Respiratórias da FMUP), e de Rui Adão e Adelino Leite Moreira, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto/RISE-Health.