Doença da altitude
Muitos desconhecem a existência deste mal que afecta pessoas que se deslocam para grandes altitudes. Mesmo as pessoas saudáveis podem vir a sofrer desta doença em subidas rápidas até aos 2000 metros (ou mais), podendo inclusivamente desenvolver sintomas graves a mais de 2500 m.
Pode ainda ocorrer edema pulmonar, situação que ocorre em cerca de 1 a 2 por cento das pessoas que ascende acima dos 4000 m e o edema cerebral hipóxico, embora menos comum, que se caracteriza por cefaleias de aumento progressivo, confusão mental, apatia, ataxia (falta de coordenação dos movimentos) e sintomas de aumento da pressão intra-craniana como vómitos em jacto e perda de consciência.
Os doentes com predisposição para a doença de altitude devem ser desencorajados a subir acima dos 2000 m e aplica-se também a viajantes com antecedentes de enfarte agudo do miocárdio, angina instável, doentes com doença pulmonar obstrutiva crónica com enfisema, epilepsia não controlada, doenças tromboembólicas e indivíduos com doença da altitude aguda já anteriormente registada.
O que acontece é que em altitudes mais elevadas, a pressão do ar (pressão barométrica) diminui existindo menos oxigénio no ar circundante. É possível estar-se confortavelmente em altitudes moderadamente elevadas mas o organismo tem de fazer alguns "ajustes” e isso pode demorar algum tempo.
A doença da altitude tem uma maior probabilidade de ocorrer em pessoas que apresentam uma história prévia desta patologia. É mais provável a sua ocorrência se o viajante subir rapidamente, se efectuar exercício físico vigoroso durante os primeiros dias de exposição à altitude elevada e se tiver vivido numa zona baixa antes de proceder à subida. A obesidade parece aumentar o risco de doença da altitude e a genética pode igualmente aumentar o risco de algumas pessoas, particularmente no que respeita ao edema pulmonar da grande altitude.
Sintomas
Os sintomas manifestados na forma mais leve da doença de altitude são semelhantes a uma ressaca leve - dores de cabeça, cansaço, náuseas, falta de apetite e dispneia. Estes surgem normalmente 4 a 12 horas após a escalada, podendo atingir o seu máximo durante 1-2 dias para, de seguida, abrandarem durante 2-3 dias como sinal de aclimatização.
À medida que o corpo realiza ajustamentos normais para se adaptar a uma altitude elevada, a pessoa pode apresentar alguns sintomas que são incómodos mas que não constituem motivo de preocupação. Estes incluem uma respiração rápida, falta de ar com o exercício extenuante, pausas curtas ocasionais na respiração durante o sono e micções frequentes. Estes últimos dois sintomas são causados por um nível baixo de dióxido de carbono, o que desencadeia ajustamentos no cérebro e nos rins.
Alguns sintomas mais graves são causados por níveis baixos de oxigénio no sangue e por ajustamentos realizados pelo sistema circulatório.
Diagnóstico
Um indivíduo deve ser capaz de reconhecer os sintomas precoces da doença da altitude e deve vigiar cuidadosamente esses sintomas quando se encontra em risco, uma vez que esta doença pode ter consequências muito graves.
Se as dores de cabeça constituírem o único sintoma, a subida deve ser suspensa e o indivíduo deve tomar um analgésico. Se surgir uma dor de cabeça que não desaparece ou se a pessoa tiver outros sintomas sugestivos de uma doença aguda da montanha, esta pode ser diagnosticada sem necessidade de recorrer a exames complementares de diagnóstico.
O edema cerebral da grande altitude pode dificultar a marcha em linha recta e pode conduzir a alterações no pensamento, a alucinações ou a uma alteração inexplicada da personalidade. Se uma pessoa apresentar estes sintomas a uma altitude elevada, deve assumir-se que ela sofre de edema cerebral da grande altitude. Uma pessoa com estes sintomas deve descer imediatamente e procurar cuidados médicos. Depois de uma pessoa com edema cerebral da grande altitude ser transportada para um centro médico, pode ser submetida a exames de imagem como a tomografia axial computorizada (TAC) ou a ressonância magnética nuclear para confirmar a causa dos sintomas. Estes exames podem revelar a presença de edema cerebral ou de outras lesões que o tenham complicado.
O reconhecimento de um quadro de edema pulmonar da grande altitude pode ser difícil nos seus estádios iniciais, uma vez que a fadiga pode constituir o seu único sinal. Os sintomas que devem suscitar preocupações incluem a dificuldade em efectuar exercício, a tosse seca, a taquicardia (frequência cardíaca superior a 100 batimentos por minuto) e a falta de ar em repouso. Se forem avaliados os níveis de oxigénio no sangue, estes são provavelmente inferiores ao esperado para a altitude. Uma radiografia do tórax pode revelar sinais de preenchimento de uma ou mais áreas dos pulmões por líquido, o que proporciona uma aparência semelhante à de uma pneumonia.
Evolução clínica
Se uma pessoa estiver a subir e não regressar ao nível de altitude onde se sentiu bem pela última vez, os seus sintomas podem agravar-se e as consequências podem ser muito graves.
Os sintomas de uma doença aguda da montanha desaparecem ao fim de dois ou três dias de repouso a uma altitude mais baixa. Os quadros graves, como o edema cerebral ou o edema pulmonar da grande altitude, podem demorar dias ou semanas a desaparecer, necessitando de cuidados médicos e possivelmente de internamento hospitalar.
Prevenção
As alterações graduais na altitude irão ajudar o organismo a adaptar-se a um ambiente com níveis baixos de oxigénio e podem reduzir a probabilidade de desenvolvimento de todas as formas de doença da altitude.
As pessoas adaptam-se a velocidades diferentes, mas existem quatro orientações gerais para subir acima dos 3.000 m que deverão ser seguidas pelas pessoas que sobem a altitudes elevadas:
- Não aumentar a altitude mais de 300 m por noite
- Cada vez que aumentar a sua altitude em1.000 m, passar uma segunda noite a esse nível antes de continuar a subir
- Limitar o esforço físico para níveis razoáveis durante os primeiros dias de subida
- Beber bastantes líquidos durante a exposição à altitude elevada
- Limitar o consumo de álcool, pois uma bebida alcoólica consumida em um local muito elevado parece ter o dobro do efeito
- Fazer refeições frequentes e leves, ao invés de refeições volumosas.
Se uma pessoa desenvolver sinais precoces de doença da altitude, deve evitar que estes se agravem interrompendo imediatamente a subida ou descendo.
Se uma pessoa tiver experimentado uma doença da altitude no passado e estiver a planear subir novamente até uma altitude elevada, pode discutir com o seu médico e/ou com o especialista da Consulta do Viajante a opção de tomar medicamentos preventivos, que vão limitar os sintomas de ajustamento à altitude. No entanto, os medicamentos não previnem as formas graves de doença da altitude. Por isso, se o viajante tiver desenvolvido previamente um edema pulmonar da grande altitude, pode ser medicada para estabilizar o padrão de fluxo de sangue nos pulmões.
Tratamento
O melhor tratamento consiste em desistir de continuar a subida e, caso os sintomas se mantenham após o descanso, descer. Após a descida, as pessoas que apresentarem qualquer forma da doença da altitude elevada melhoram rapidamente. Quando isto não ocorre, uma outra causa do distúrbio deve ser investigada.
Ou seja, a primeira regra para o tratamento dos sintomas ligeiros da doença aguda da montanha consiste em interromper a subida até os sintomas terem desaparecido completamente.
Se uma pessoa apresentar sintomas mais graves ou sintomas de edema cerebral da grande altitude, de edema pulmonar da grande altitude ou visão turva, deve deslocar-se para uma altitude mais baixa o mais rapidamente possível, mesmo a meio da noite. Se permanecer na altitude em que se encontra ou se continuar a subir, os sintomas irão agravar-se e a doença pode ter consequências muito graves.
Por outro lado, se o viajante apresentar sintomas de doença da altitude, deve evitar ingerir álcool, tomar comprimidos para dormir e medicamentos analgésicos opióides. Todas estas substâncias podem tornar a respiração mais lenta, o que é extremamente perigoso em situações com um nível baixo de oxigénio.
Se houver disponibilidade, esta doença pode igualmente melhorar através da utilização de uma câmara hiperbárica portátil, que simula a descida para uma altitude mais baixa enquanto são desenvolvidas as diligências para o transporte do doente para uma altitude mais baixa.
O prognóstico para a doença da altitude depende da rapidez com que a pessoa pode ser deslocada para uma altitude mais baixa e da gravidade dos seus sintomas. Os sintomas de doença da altitude podem desaparecer dentro de poucos dias a altitudes mais baixas. Em muitos casos, as actividades a altitudes elevadas podem ser reiniciadas. No entanto, esta doença pode ter consequências complicadas se os sintomas forem graves e a pessoa permanecer a uma altitude elevada. O coma e a morte constituem as consequências mais graves da doença da altitude.
Diferentes doenças da altitude
Doença aguda da montanha
Dos vários tipos de doença da altitude que existem, a doença aguda da montanha é a menos perigosa. Esta doença afecta aproximadamente metade das pessoas que sobem desde o nível do mar para cima dos 4.000 m sem programarem tempo suficiente para descansar.
Os viajantes que sobem a montanhas e que praticam esqui (por exemplo) em localizações de elevada altitude têm um elevado risco de desenvolver uma doença aguda da montanha. No entanto, os sintomas desta doença melhoram se o indivíduo descer rapidamente para uma altitude mais baixa. Para os sintomas mais ligeiros, uma paragem antes de continuar a subida pode ser suficiente para permitir o desaparecimento dos sintomas.
A doença aguda da montanha geralmente causa sintomas 8 a 36 horas após a exposição a grande altitude e podem incluir:
- Dores de cabeça que não são aliviadas com medicamentos analgésicos
- Náuseas e vómitos
- Tonturas ou vertigens
- Fraqueza ou fadiga
- Dificuldade em dormir
- Perda do apetite.
Doença crónica da montanha (doença de Monge)
A doença crónica da montanha (doença de Monge) desenvolve-se de forma gradual ao longo de vários meses ou anos em indivíduos que vivem em grandes altitudes.
Os sintomas incluem a falta de ar, a letargia e muitas dores e desconfortos. Pode ocorrer a formação de coágulos sanguíneos nos membros inferiores e nos pulmões e insuficiência cardíaca. A doença da altitude elevada crónica se desenvolve quando o organismo super compensa a falta de oxigénio através da produção excessiva de eritrócitos (glóbulos vermelhos). A pessoa torna-se incapacitada e pode morrer se não for levada a uma altitude mais baixa.
Edema cerebral da grande altitude
O edema cerebral da grande altitude é considerado por muitos especialistas como uma forma extrema de doença aguda da montanha. Esta situação desenvolve-se geralmente depois dos sintomas da doença aguda da montanha.
Os sintomas deste quadro mais grave da doença aguda da montanha podem não ser notados imediatamente, uma vez que a doença pode ter início durante a noite. Dado que esta lesão associada ao nível baixo de oxigénio afecta o cérebro e os processos mentais superiores, como o pensamento, uma pessoa com edema cerebral da grande altitude pode não compreender que os sintomas se tornaram mais graves até que um companheiro de viagem note um comportamento diferente do habitual.
Os sintomas podem incluir:
- Agravamento das dores de cabeça e dos vómitos
- Marcha cambaleante
- Confusão mental
- Exaustão
- Alucinações visuais (ver coisas que não são reais)
- Alterações na capacidade para pensar
- Alterações no comportamento normal
- Coma (nos casos avançados).
Edema pulmonar da grande altitude
Outro quadro grave é o edema pulmonar da grande altitude, que pode ocorrer com ou sem sintomas de alerta que indiquem uma doença da altitude. No edema pulmonar da grande altitude, os pulmões ficam cheios de líquido.
Uma concentração baixa de oxigénio pode desencadear uma vasoconstrição (contracção dos vasos sanguíneos, com subsequente diminuição do seu calibre) ao nível dos vasos sanguíneos dos pulmões, conduzindo a uma elevação da pressão nas artérias pulmonares. Em consequência, verifica-se a saída de líquido dos vasos sanguíneos para os pulmões. Os sintomas do edema pulmonar da grande altitude surgem frequentemente durante a noite e podem agravar-se com o esforço.
Os sintomas de edema pulmonar da grande altitude incluem:
- Sensação de aperto ou de plenitude torácica
- Fadiga extrema
- Falta de ar, mesmo em repouso
- Coloração azul ou acinzentada dos lábios e das unhas das mãos (cianose)
- Tosse, que pode acompanhar-se de expectoração espumosa e rosada
- Febre (temperatura superior ao normal mas inferior a 38,3ºC)
- Respiração ruidosa, semelhando sons de gorgolejo.
Hemorragia retiniana
Pode também surgir, como problema grave de doença da altitude, a denominada hemorragia retiniana da grande altitude, que pode provocar lesões oculares. Pode ocorrer com ou sem os sintomas de doença da altitude. De um modo geral, esta situação passa despercebida, a menos que a área do olho responsável pela visão mais detalhada (a mácula) esteja envolvida. A visão turva constitui o sintoma principal da hemorragia retiniana da grande altitude.
Coagulação
Na altitude a produção de glóbulos vermelhos aumenta devido à falta de oxigénio, provocando no sangue um espessamento que pode causar coágulos sanguíneos.
Ataxia
Caracteriza-se pela perda de coordenação e equilíbrio causada pela falta de oxigénio em altitudes.
Lesões pelo frio
As lesões provocadas pelo frio compreendem a hipotermia, situação em que todo o corpo arrefece, atingindo temperaturas potencialmente perigosas, o congelamento parcial, ou seja, quando partes do corpo ficam superficialmente danificadas, e o congelamento, em que alguns tecidos corporais ficam completamente destruídos. A excessiva exposição ao frio também provoca frieiras e pé-de-imersão.
As lesões que o frio provoca, normalmente, não se manifestam, nem sequer em climas extremamente frios, se a pele, os dedos das mãos e dos pés, as orelhas e o nariz estiverem bem protegidos e não ficarem expostos ao ar durante muito tempo.
No entanto, quando a exposição é mais prolongada, o organismo estreita automaticamente os pequenos vasos sanguíneos da pele e dos dedos das mãos e dos pés, das orelhas e do nariz para canalizar mais sangue para os órgãos vitais como o coração e o cérebro. Em consequência disso, estas partes do corpo recebem menos sangue quente, e arrefecem com maior rapidez.
Para evitar uma lesão provocada pelo frio deve conhecer onde está o perigo – frio - e preparar-se. As peças de vestuário (de preferência de lã) ou os sobretudos com capuz acolchoados com penas ou fibra sintética, além de protegerem contra o vento, constituem o vestuário ideal até nas condições mais duras. Como pela cabeça se perde grande quantidade de calor, é fundamental contar com um chapéu que proteja. É também conveniente comer e beber o suficiente.
Hipotermia
A hipotermia ocorre quando o corpo perde calor mais rapidamente do que ele demora para queimar energia para repô-lo. O ar frio, frequentemente o vento, pode retirar calor do corpo por convecção. Permanecer sentado e imóvel durante algum tempo sobre o chão frio ou uma superfície metálica ou com roupas molhadas faz com que o calor do corpo passe para a superfície mais fria por condução. O calor pode ser perdido pela pele exposta, especialmente da cabeça, por meio da radiação e da evaporação do suor.
A hipotermia frequentemente ocorre quando uma pessoa é imersa em água fria e quanto mais fria a água, mais rápido o desenvolvimento da hipotermia. O início da hipotermia passa facilmente desapercebido durante um longo período de imersão na água que não parece estar muito fria, mas que retira calor do corpo.
O início da hipotermia costuma ser tão gradual e subtil que tanto a vítima, como os outros, não se apercebe do que está a suceder. Os movimentos tornam-se lentos e entorpecidos, o tempo de reacção é mais lento, a mente turva-se, a pessoa não pensa com clareza e tem alucinações.
Quem sofre hipotermia pode cair, andar sem destino fixo ou, simplesmente, deitar-se para descansar e até morrer. Se a pessoa se encontrar na água, move-se com dificuldade, pouco depois desiste e, finalmente, afoga-se.