200 mil idosos não usufruem do direito a reembolso de remédios, óculos e próteses
Desde 2007 que ser beneficiário do complemento solidário para idosos permite ter acesso a uma ajuda financeira adicional para suportar este tipo de encargos, mas só 15% dos idosos carenciados usufruem deste direito. A falta de informação parece ser uma justificação para tão poucos solicitarem estes apoios, explicaram ao iOnline vários médicos e o porta-voz do Movimento de Utentes do Serviço Nacional de Saúde, Manuel Vilas Boas. Depois de três anos de alertas e preocupações com o impacto da crise no acesso à saúde, ninguém recorda ter havido recentemente algum tipo de divulgação pública destes benefícios.
O balanço do número de beneficiários dos chamados benefícios adicionais em saúde (BAS) surge no último relatório de acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), que o mesmo jornal consultou. Em 2013, estavam inscritos como beneficiários dos BAS 35 374 idosos. Cruzando esta informação com os dados da Segurança Social sobre os beneficiários do complemento solidário para idosos (CSI), verifica-se que havia mais 200 mil idosos que poderiam ter usufruído destas ajudas. No ano passado, 237 844 idosos beneficiaram do CSI, o que permite calcular que apenas 14,9% aproveitaram os BAS. Consultando o relatório de 2012, verifica-se que já nesse ano a taxa de utilização destes apoios pelos idosos era desta ordem, com uma taxa de 15,5%.
Numa pesquisa na internet, não é difícil encontrar as regras para ter acesso a estes apoios, sobretudo no site da Segurança Social. Mas nos centros de saúde não existe material de divulgação, embora os serviços dêem indicações a quem pergunta, o que implica estar informado à partida. Já as cartas do Instituto de Segurança Social que atribuem o CSI não fazem referência a este direito.
António Pimenta Marinho, médico da Unidade de Saúde Familiar + Carandá, em Braga, recorda que a última vez que houve algum esforço de divulgação foi em 2011. “Deveria ser feita com mais periodicidade”, defende o médico, admitindo que o desconhecimento ou o esquecimento destes direitos não existe só entre os utentes mas também entre os profissionais. “Quando um doente vem à consulta não existe nenhum alerta de que tem complemento solidário para idosos. Ou nos apercebemos da situação ou o doente sabe disso e diz”, explica Pimenta Marinho.
Rui Nogueira, vice-presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar e médico de família em Lisboa, admite que não tinha conhecimento da existência destes apoios. Nogueira adianta que os actuais sistemas informáticos também não permitem aos médicos saber se os seus utentes são ou não pessoas carenciadas. “Mesmo as isenções de taxas moderadoras já não passam pelos nossos sistemas, sendo da responsabilidade das Finanças. Os únicos casos em que é o médico a activar a isenção dizem respeito a grávidas”.
Manuel Vilas Boas, porta-voz do Movimento de Utentes do Serviço Nacional de Saúde, defende que a baixa utilização destes apoios acaba por ser sintoma de algo maior: “Os mais velhos e carenciados cada vez têm mais dificuldades em deslocar-se aos cuidados de saúde e compram menos medicação. Não usam estes apoios porque não estão informados e porque estão cada vez mais afastados do SNS”. Vilas Boas não duvida que seria necessária maior divulgação para que este tipo de medidas tivesse algum impacto nos utentes. “O silêncio sobre elas só sugere que é de propósito”.