1/3 das pessoas infectadas desconhece a causa do vírus da hepatite C
Durante os dois dias do Congresso Português de Hepatologia os 300 especialistas presentes discutiram a realidade e o futuro dos doentes portugueses, bem como partilharam informações sobre os mais recentes avanços da investigação das doenças hepáticas.
A Hepatite C foi a doença com mais destaque no Congresso através da realização de vários simpósios. Também se falou da crescente necessidade da elaboração e implementação de um plano nacional de Hepatite C e, como exemplo, foi apresentado o caso de sucesso da implementação do plano nacional escocês.
“Não ignorando a importância da Hepatite C, vivemos num país em que a doença hepática alcoólica é ainda a principal causa de cirrose. Assim, foi muito importante abordar também a doença hepática esteatósica, alcoólica e não alcoólica, assim como as complicações da cirrose hepática, com que temos de lidar todos os dias na nossa prática clínica”, sublinhou Helena Cortez Pinto, Presidente da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado. E foi por isso que neste encontro científico, que pretendia ser o mais abrangente possível e reconhecer os trabalhos científicos que se realizam em Portugal, não ficaram esquecidos o presente e o futuro de outros temas como as Doença Hepática Esteatósica Alcoólica e não-alcoólica, as Doenças Hepáticas Auto-imunes, a Hepatite B, os Tumores Hepáticos e Transplantação, as Complicações da Doença Hepática Avançada e os Micro-RNAs na Doença Hepática.
Houve ainda tempo para a apresentação de um projecto inovador, a Liver.pt, uma plataforma de registo de dados, projectada pela APEF com o objectivo de melhorar o conhecimento da realidade nacional no que respeita às doenças do fígado que afectam a nossa população e que neste momento aguarda apenas a aprovação da Comissão Nacional de Dados para poder avançar.
O Congresso Português de Hepatologia terminou com a entrega das bolsas de estágio e de investigação e dos prémios conferidos aos melhores trabalhos apresentados na reunião.
Um terço das pessoas infectadas desconhece a causa do vírus
Silencioso mas potencialmente destrutivo, o vírus da hepatite C não discrimina sexos, estratos sociais ou escalões etários. A doença, muitas vezes associada a comportamentos de risco, não é exclusiva daqueles que caíram nas teias da toxicodependência ou dos que tropeçaram na prostituição. Os comportamentos de risco são apenas uma parte de um problema de saúde, cujas causas nem sempre são possíveis de apurar.
“Não se trata de uma doença dos toxicodependentes. De maneira nenhuma. É muito frequente em quem consumiu ou consome drogas mas não é exclusiva. Tenho doentes freiras, médicos, enfermeiros, gestores de empresas, jogadores de futebol. Portanto, é transversal a qualquer estrato social”, garante Rui Tato Marinho, hepatologista do Hospital de Santa Maria, em Lisboa. “Em cerca de um terço das pessoas afectadas pelo vírus não é possível identificar como é que ocorreu o contágio”, acrescenta o especialista em doenças do fígado.
As estimativas apontam para 100 a 150 mil portugueses infectados com hepatite C, a maioria dos quais sem conhecimento do seu estado de saúde. Os sintomas muito tardios ou inexistentes fazem com que a descoberta desta patologia surja em estados muito avançados, com quadros de cirrose ou cancro do fígado.
De acordo com o presidente da sub-especialidade de hepatologia da Ordem dos Médicos, “o número de casos de cirrose e de cancro no fígado por hepatite C está a aumentar porque as pessoas estão infectadas há já trinta ou quarenta anos sem saber, com um vírus de evolução lenta”. No entanto, e mesmo nestes casos, os avanços da medicina nesta área vieram revolucionar o tratamento e alcançar a cura.
“Há vários medicamentos, alguns em investigação, mas outros que já foram lançados há cerca de um mês nos EUA e aprovados em Portugal, com taxas de cura próximas dos 95%. Neste momento, podemos dizer que a hepatite C é uma doença curável. Têm é de ser aplicados os medicamentos certos na pessoa certa”, explica Rui Tato Marinho.