Relatório “Acesso a cuidados de saúde, 2022 – As escolhas dos cidadãos no pós-pandemia”

Aumento de episódios de doença impulsiona Linha SNS24 e revela receios no acesso aos cuidados de saúde

Depois de uma década em evolução o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde em Portugal revela um decréscimo. Os dados fazem parte do relatório Acesso a cuidados de saúde, 2022 – As escolhas dos cidadãos no pós-pandemia, apresentado hoje (6 de junho), às 10h00, no auditório BPI All in One, no Saldanha, em Lisboa e revelam não só a redução na procura de serviços de saúde, como também o aumento dos episódios de doenças e o impulso/aceitação da linha SNS 24 por parte da população portuguesa, principalmente com menores condições socioeconómicas.

Elaborado no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação “la Caixa”, o BPI e a Nova SBE o documento, da autoria dos investigadores Pedro Pita Barros e Eduardo Costa do Nova SBE Health Economics & Management Knowledge Center, carateriza as decisões dos cidadãos no primeiro contacto com o sistema de saúde analisando a incidência de episódios de doença, decisão de aceder a cuidados de saúde, barreiras de acesso (financeiras e não financeiras) e prestação de cuidados de saúde nos setores público e privado.  

Acesso a cuidados de saúde, 2022 – As escolhas dos cidadãos no pós-pandemia apresenta resultados relativos aos anos de 2021 e 2022, comparando com o relatório anterior (2013-2020).

Sobre a incidência dos episódios de doença, os dados permitem aferir que a pandemia da COVID-19 acentuou a associação entre a condição socioeconómica do agregado familiar e a ocorrência de episódios de doença. As pessoas de grupos socioeconómicos de maior rendimento reportaram menos situações de doença (provavelmente devido à redução de contactos sociais resultantes da maior permanência em casa) e o grupo socioeconómico com maior dificuldade financeira, embora revele também um decréscimo no registo de ocorrências (provavelmente devido ao receio de contágio), em 2022, reporta um acréscimo grande (de, pelo menos, um episódio de doença). Verifica-se assim que os anos 2020 e 2021 contrariam a tendência crescente dos anos anteriores (2013-2020) retomando, em 2022, aos valores registados antes da pandemia.

Os investigadores concluíram que, nos anos da pandemia (2020 e 2021), apenas 27% e 30% dos inquiridos, respetivamente, reportaram terem-se sentido doentes, pelo menos uma vez, mostrando que o período pandémico foi marcado por valores anormalmente baixos neste indicador. Fatores como rendimento mais baixo (47,6%) e idade mais avançada (57,6%) encontram-se associados a uma maior probabilidade de a pessoa se ter sentido doente pelo menos uma vez.  Em 2022, porém, verifica-se uma subida expressiva, com 40% dos inquiridos a revelar ter-se sentido doente pelo menos uma vez no ano. A comparação entre anos permite verificar que o aumento da população, que reporta ter-se sentido doente em 2022, é sobretudo explicado pelo aumento dos episódios de doença nos grupos etários mais novos, abaixo dos 45 anos. Os autores adiantam que ‘isto é compatível com os padrões de evolução da pandemia’ e acrescentam que ‘por um lado, o início de 2022 foi marcado por grandes impactos da variante Ómicron da COVID-19. Por outro lado, ao longo do ano de 2022, a redução da utilização generalizada das medidas de proteção individual contribui para um aumento de circulação dos vírus’.

Ainda em 2022, cerca de 14% da população optou por não recorrer ao sistema de saúde, na sequência de um episódio de doença, o que ‘pode sinalizar a perceção por parte dos cidadãos de uma maior dificuldade de aceder a cuidados de saúde, levando a que alguns optem por não os procurar’, salientam os autores, embora também considerem que poderá estar ‘ligado a um conjunto de fatores, e não apenas a uma única justificação’.

Em alternativa ao recurso ao sistema de saúde, as pessoas procuraram outras soluções como a automedicação (43%), que pode ser explicado pela acumulação de medicamentos mais comuns por parte das famílias, ou optaram por ‘esperar’ que a sua doença melhorasse (57%). O aumento dos que não contactaram o sistema de saúde pode ser explicado pelo aumento de infeções de COVID-19, no final de 2021 e início de 2022, a par das recomendações das autoridades de saúde para não recorrer ao sistema de saúde em caso de doença ligeira. O padrão verificado em 2022, porém, inverte o histórico verificado desde 2013, quer no período da pandemia (2020 – 2021), quer no período pré-pandemia (2013 – 2019). Na larga maioria dos casos (quer naqueles que se automedicaram, quer nos que decidiram esperar) a baixa gravidade da doença foi eleita como a principal razão para não contactar o sistema de saúde (82,2% e 88,9%, respetivamente, em 2022).  Embora registando um maior número de pessoas que (doentes) não recorreram ao sistema de saúde, os dados revelam que a probabilidade de as pessoas se deslocarem aos serviços de saúde em caso de doença ainda permanece muito elevada (80%), sendo ‘o aparecimento de um problema inesperado’ a principal razão que motiva a procura (70%).

Numa perspetiva mais ampla, os investigadores avaliaram também as barreiras de acesso a cuidados de saúde e concluíram que, em 2022, existiram dificuldades em fazer face às despesas habituais do agregado familiar na classe com menores rendimentos, sobretudo na aquisição de medicamentos (50%). Ainda no campo do medicamento, verifica-se que a proporção de famílias que pede a substituição de um fármaco de marca pelo respetivo genérico aumenta com o acréscimo das dificuldades económicas (passando de 33%, em 2019 para 56% em 2022). Ainda assim, e apesar do aumento da preferência pelos medicamentos genéricos, a despesa com medicamentos representa a maior fatia da despesa associada a idas aos cuidados de saúde primários ou a urgências hospitalares.

No que diz respeito ao acesso a consultas ou urgências o presente relatório evidencia que a proporção de pessoas que reporta não ter conseguido aceder a uma consulta ou urgência por dificuldades financeiras é muito baixa, o que pode ser explicado pelo facto de ‘nos cuidados de saúde primários, as consultas com os médicos de família não estão sujeitas ao pagamento de taxas moderadoras. Nos cuidados de saúde hospitalares, essas taxas existem, por exemplo, no acesso ao serviço de urgência. Contudo, estão previstas diversas isenções’.

No que diz respeito às barreiras não financeiras, e apesar do aumento das infeções de COVID-19 associadas à variante Ómicron, o receio de contágio nos cuidados de saúde e os cancelamentos de consultas e exames continuaram em queda.

A prestação de cuidados de saúde nos setores público e privado foi igualmente alvo de análise, verificando-se um aumento no recurso ao setor público, recuperando parcialmente a queda verificada entre 2019 e 2020, motivado em grande maioria pela utilização da linha de atendimento SNS 24 (de 3%, em 2019, para 28%, em 2022). Ainda assim, apesar da ligeira subida face aos níveis de 2020 e 2021, a proporção de pessoas que procura os serviços de urgência permanece abaixo do pré-pandemia (41,1% em 2019 e 35,5% em 2022).

Os autores fizeram, também, o retrato dos cuidados centrados no doente tendo constatado que embora  em 2022 exista uma quebra na perceção de que o tratamento dos doentes foi feito com dignidade, compaixão e respeito, durante a pandemia não se verificaram quebras neste indicador o que poderá estar associado a um ajuste  níveis de exigência da população, associados a uma maior compreensão para a pressão sentida durante a pandemia, ‘evitando assim a deterioração deste indicador’,  adiantam os investigadores.

Apresentação dos relatórios “Recursos Humanos em Saúde & Acesso a Cuidados de Saúde 2022”

No mesmo dia em que se apresenta o relatório sobre Acesso a Cuidados de Saúde, também se apresenta o relatório de Recursos Humanos, que tem como objetivo caraterizar várias das dimensões que têm afetado a atração e retenção de profissionais de saúde em Portugal, perspetivando potenciais caminhos de futuro, e com o qual se concluiu que o melhor aproveitamento das competências dos profissionais de saúde, a reorganização do trabalho com recurso a novos modelos pautados por um maior trabalho de equipa entre os diferentes grupos profissionais e a utilização de mecanismos de partilha, aproveitando as potencialidades das novas tecnologias, podem traduzir-se em ganhos económicos e de eficiência global para o Serviço Nacional de Saúde.

Ambos os relatórios dão particular relevância ao momento pós-pandemia, considerando o impacto da mesma sobre os profissionais de saúde e sobre o acesso dos cidadãos ao sistema de saúde.

Relatório ‘Recursos Humanos em Saúde’, disponível na integra aqui

Relatório ‘Acesso a cuidados de saúde, 2022 – As escolhas dos cidadãos no pós-pandemia’, disponível na integra aqui

Fonte: 
BA&N Communications Consultancy
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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