Opinião

O Sistema de Promoção e Proteção e as suas Dificuldades

Atualizado: 
16/05/2023 - 09:58
A visão atual do que é ser criança, bem como dos seus direitos e responsabilidades é o resultado de um longo progresso.

De facto, Santos (2019) salienta que o estatuto de criança variou ao longo da evolução sociocultural, tendo-se verificado que durante muitos anos, as crianças não obtiveram uma proteção jurídica profícua e que a partir do século XX, estas passaram a ser vistas como indivíduos autónomos e ativos de direitos. Este vasto percurso permitiu que a infância passasse de uma esfera de interesse e domínio privado para uma esfera de domínio público (Teixeira et al., 2014).

A literatura demonstra que Portugal foi um país pioneiro na promulgação de leis destinadas à proteção das crianças e dos jovens, no entanto tem-se verificado uma clara estagnação do ordenamento jurídico que sustenta o sistema de promoção e proteção. São frequentes as queixas apresentadas pelos profissionais que se encontram no campo de atuação e que apelam por uma atualização das políticas públicas.

É exigido que os técnicos sejam capazes de efetuar uma avaliação diagnóstica de uma situação de perigo (que tem, por norma, uma elevada complexidade psicossocial na sua origem) e que tomem decisões acerca do futuro de uma criança/jovem e da sua família. No entanto, estes profissionais são convidados a atuar no imediato, com pouca ou nenhuma formação especializada, com reduzidos recursos logísticos e com um elevado volume processual sobre as suas responsabilidades. Apesar da lei ser clara no que diz respeito ao dever de colaboração entre as entidades que contactam com aquela criança e com aquela família, na prática, verifica-se uma total desarticulação entre os serviços, que não comunicam sobre as situações.

Por outro lado, ano após ano, o relatório anual de avaliação da atividade das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens revela um aumento do número de processos acompanhados e à medida que a investigação científica demonstra as consequências a curto e a longo prazo da exposição a situações traumáticas na infância, seria expectável um aumento do número de respostas disponibilizadas na comunidade, no entanto o mesmo não se tem verificado. O reduzido número de respostas especializadas ao nível de cuidados de saúde mental para crianças e jovens é um exemplo disso.

Chega-se à conclusão que o sistema falha, diariamente, com aqueles que mais precisam da sua proteção. Contudo, não falha apenas com as crianças e jovens, falha também com os seus profissionais, que procuram efetuar um trabalho que, por si só, é difícil, num contexto promotor de desesperança e de burnout.

 

Autor: 
Grazielly Silva – Psicóloga
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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