“É completamente incorreto associar a violência à esquizofrenia”
Sendo mais frequente entre os homens e com maior prevalência nas classes desfavorecidas, a esquizofrenia pertence ao grupo de psicoses, manifestando-se “clinicamente por uma desagregação das associações de ideias, pensamento ilógico ou incoerente, respostas emocionais inapropriadas ou com embotamento afetivo, extrema ambivalência e por uma forma particular de retirada das relações sociais para um mundo autista em que predominam as fantasias internas e a perda de contacto com a realidade”. Segundo a professora de Psiquiatria e Saúde Mental da Faculdade de Medicina de Lisboa, Maria Luísa Figueira, “estes sintomas designados como «sintomas negativos» correspondem a um declínio cognitivo e funcional”.
Quanto àqueles que são designados de «sintomas positivos», a especialista explica que “são em geral agudos e surgem sob a forma de crises com ideias delirantes (crenças erróneas e inabaláveis de que é por exemplo objeto de perseguição ou de que possui poderes anormais), a invasão da consciência por fenómenos alucinatórios (acústicos como vozes, visuais, tácteis, etc.), sentimentos incontroláveis de raiva, medo ou ansiedade. Nestas crises há frequentemente uma agitação psicomotora e por vezes um comportamento descontrolado dependendo da gravidade dos sintomas psicóticos”, esclarece quanto à forma como esta patologia se manifesta.
E, embora não existam “sintomas específicos que possam com grau de certeza suspeitar do diagnóstico”, a especialista refere que, “antes dos sintomas mais evidentes da doença”, podem surgir alguns sinais precoces. No entanto, sublinha, estes podem “corresponder a problemas ao nível do desenvolvimento da adolescência ou seres premonitórios de outro tipo de perturbações mentais diferentes da esquizofrenia”. Entre eles, destaca, os “comportamentos estranhos, ideias bizarras e distantes do habitual da pessoa, isolamento social e já algum défice cognitivo (por exemplo mudança na capacidade de compreensão das matérias escolares)”.
A deterioração do funcionamento social – considerada a grande problemática desta patologia - acontece porque “quando a doença surge modifica-se radicalmente a relação do indivíduo com os outros e com o meio ambiente”.
Segundo Maria Luísa Figueira, “a esquizofrenia produz uma organização da personalidade do indivíduo, manifestações clínicas, motivações e vivências que adquirem um carácter de incompreensibilidade psicológica para um observador externo”.
“Na família e pessoas afetivamente significativas produz uma marcada angústia, perplexidade e dificuldades de manejo dos comportamentos mais patológicos”, acrescenta.
No entanto, ressalva que o grau de gravidade da sintomatologia psicótica pode ser variável, havendo uma marcada heterogeneidade clínica, dependendo da personalidade prévia do doente e da fase evolutiva da doença.
Entre os mitos mais frequentes, a professora de Psiquiatria e Saúde Mental da Faculdade de Medicina de Lisboa, destaca a ideia de que as pessoas com esquizofrenia são violentas. “Não há mais criminalidade entre estes doentes do que na população em geral. Raramente são agressivos, e quando por vezes nas fases mais agudas se mostram aparentemente agressivos é uma atitude defensiva, por receios das “ameaças” exteriores (vivências de perseguição ou audição de vozes que os ameaçam). Esta situação de crise aguda é facilmente reconhecível e deve ser abordada por profissionais de saúde. Nos restantes períodos não existe perigosidade nestes doentes”, esclarece.
Por outro lado, é ainda frequente atribuir o rótulo de deficiente ao doente esquizofrénico. No entanto, a verdade é que, ainda que não tenha cura, é possível, com o devido tratamento, conseguir a sua recuperação e integração social. “Sabemos que muitos doentes recuperam, podem ser integrados na sociedade e terem um papel socialmente satisfatório. Quanto mais precocemente forem diagnosticados e tratados e quanto maior for a adesão ao tratamento melhor o prognóstico. Este aspeto reforça a necessidade de psicoeducação do doente e dos familiares e salienta a importância dos programas de reabilitação social a par dos tratamentos medicamentosos”, afirma