APCP apela a uma reflexão séria sobre a despenalização da morte assistida
No momento em que o Parlamento português discute na especialidade o projeto de lei sobre a eutanásia, a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos (APCP) alerta os Portugueses para pensarem sobre as consequências e implicações relacionadas com a aprovação da eutanásia no nosso país.
“Que nesta reflexão fiquem de parte as convicções partidárias, religiosas e individuais e, por um momento, se pense de forma muito séria sobre a realidade portuguesa no que respeita aos cuidados de saúde e sociais, garantidos a todos os que se encontram em fim de vida - última etapa da vida marcada por situação de doença ou condição limitadora da vida que pode ocorrer em qualquer idade, qualquer contexto, com duração de dias, meses ou anos.
Nunca como agora foi tão evidente a fragilidade dos cuidados e a pouca qualidade garantida à vida daqueles que vivem a sua última etapa. Relembramos que continua por nomear a nova Comissão Nacional de Cuidados Paliativos, desde dezembro de 2020, sem existir uma palavra do Ministério da Saúde em relação a este tema, bem como, sem existir uma orientação formal sobre o papel que os profissionais de cuidados paliativos podem e devem assumir na gestão da atual situação”, explica a Enfermeira Catarina Pazes, Presidente da APCP.
De acordo com a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos, Portugal é um país onde se vive mal o fim da vida, “tantas vezes sem condições dignas, sem alívio do sofrimento, sem apoio familiar adequado, sem apoio social capaz, muitas vezes com cuidados de saúde desproporcionados e com recurso à obstinação terapêutica e desinvestimento em cuidados de conforto, humanizados e individualizados à pessoa em fim de vida”.
“Somos o país onde a agressividade terapêutica nas últimas semanas de vida é substancial e somos o país, que agora, quer oferecer a morte a quem a pedir, sem que se salvaguarde o investimento nas alternativas à morte a pedido”, adianta.
Em comunicado a APCP, refere que “pelas experiências dos países onde a eutanásia já é legal há mais tempo, que as consequências são graves e estão fora dos objetivos, até mesmo dos que agora lutam pela eutanásia. Termos uma medida de exceção, é diferente de garantir a morte a todos os que a pedem, sem garantir cuidados adequados”.
“Que fique claro que os problemas elencados não são resolvidos apenas com investimento sério no desenvolvimento dos cuidados paliativos. Necessitamos urgentemente de uma maior consciência da sociedade, mais e melhor formação dos profissionais de saúde, de todos, na área dos cuidados em fim de vida. É preciso garantir a dignidade e conforto merecidos no fim da vida”, reforça a Presidente da APCP.
Para a APCP estes temas precisam de ser refletidos, de forma séria e abrangente, e travados: “Matar como ato médico, um estado que paga a morte dos seus doentes, uma rampa deslizante inevitável e gravíssima, manutenção da lentidão no desenvolvimento dos cuidados em fim de vida, obstinação terapêutica como prática frequente”.
A APCP considera, assim, fundamental que todos compreendam que apenas quando se vive uma situação de perto e se experimenta um acompanhamento de saúde adequado se compreende a importância do mesmo.
“É a experiência de todos os dias que nos faz agora dar um grito de alerta para o facto de a morte não ser a escolha quando o apoio adequado é garantido. Todos queremos o melhor. Todos queremos o fim do sofrimento. Mas nós, como profissionais especializados nesta área de cuidados, sabemos abordar esse sofrimento e sabemos que a morte, quando equacionada, é uma escolha rara, de exceção. Sabemos que o perigo de se tornar regra é enorme”, conclui a Enfermeira Catarina.