2020 marcado por avanços na fotónica

No início do ano, a edição impressa da revista Nature, divulgou a primeira realização experimental de padrões moiré óticos, depois seguiram-se a Nature Photonics onde a primeira observação de feixes localizadas óticos não lineares foi relatada, enquanto a revista Science reportou recentemente a primeira realização experimental de fases topológicas não triviais induzidas pela não linearidade.
As redes moiré resultam da superposição de duas estruturas periódicas idênticas ou semelhantes giradas ou deslocadas uma em relação à outra. Esses padrões aparecem em muitas situações, mesmo na vida quotidiana, incluindo design artístico, indústria têxtil, arquitetura, processamento de imagem, metrologia, interferometria e outros. A implementação de padrões moiré usando estruturas cristalinas bidimensionais (grafeno) já permitiu aos cientistas observar uma rica variedade de fenómenos físicos incomuns que abriram uma nova área no mundo da física bidimensional.
O artigo da Nature “Localization and delocalization of light in photonic moiré lattices” apresenta a primeira realização experimental de padrões moiré óticos, nomeadamente, a primeira demonstração experimental de transição bidimensional localização-deslocalização de feixes de luz em potenciais óticos puramente regulares. O trabalho foi desenvolvido no laboratório de Fanwei Ye, professor da Universidade Jiao Tong de Xangai, na China e contou com a colaboração teórica de Vladimir Konotop, professor do Departamento de Física e investigador do Centro de Física Teórica e Computacional da Ciências ULisboa, e com a colaboração dos laboratórios do Institute of Spectroscopy (IS), na Rússia, e ICFO – The Institute of Photonic Sciences, na Espanha. Na experiência realizada na China foram produzidas redes moiré óticas pitagóricas e hexagonais reconfiguráveis. A transição localização-deslocalização foi observada em redes reconfiguráveis na passagem entre fases comensurável (periódica) e incomensurável (aperiódica).
Baseando-se na tecnologia desenvolvida no artigo da Nature, o mesmo grupo de cientistas continuou o estudo de redes moiré fotónicas para meios não lineares. O artigo "Optical soliton formation controlled by angle twisting in photonic moiré lattices", publicado na Nature Photonics, apresenta esse trabalho, nomeadamente a formação de solitões, isto é, feixes óticos de área finita, em reticulados que passam suavemente de geometrias totalmente periódicas para aperiódicas, com propriedades de limiar que são uma manifestação direta pura da física de bandas planas.
Isoladores topológicos eletrónicos são sólidos que não conduzem eletricidade dentro do seu volume, mas ao mesmo tempo são condutores perfeitos ao longo da sua superfície. Isoladores topológicos fotónicos criados pelas redes de guisa de onda são os análogos óticos de tais isoladores. Em fases, chamadas topológicas, eles guiam a luz ao logo das superfícies destes cristais fotónicos. A propagação de luz em isoladores topológicos, suportados pela estrutura matemática subjacente ao seu design, é dotada pela extrema robustez em relação a imperfeições ou perturbações externas.
No trabalho experimental desenvolvido no laboratório de Alexander Szameit, professor da Universidade de Rostock, na Alemanha, que também contou com o contributo teórico de Vladimir Konotop, bem como dos estudos numéricos do IS e ICFO foi demonstrado pela primeira vez que a fase topológica em cristais fotónicos pode ser induzida pela não linearidade. O trabalho "Nonlinearity-induced photonic topological insulator" foi publicado na revista Science no passado mês de novembro.
Os cientistas demonstraram que a não linearidade ótica pode induzir uma mudança topológica nas propriedades de uma rede fotónica. Em baixa potência, a luz da sonda vaza uniformemente para o resto da rede, uma fase oticamente trivial. Acima da potência limite, a não linearidade ótica induz uma mudança topológica nas propriedades da rede fotónica e a luz da sonda é confinada a se propagar ao longo da borda da estrutura. Os resultados ilustram uma rota para controlar dinamicamente a propagação da luz e levantam questões teóricas como a própria existência, definição, e propriedades de invariantes topológicos de sistemas não lineares.
Para Vladimir Konotop os resultados alcançados recentemente têm um grande interesse para a ciência: "tudo isto tem uma extrema relevância conceptual e novas aplicações da ótica, para a física em geral, e até para a Matemática, uma vez que nas experiências são envolvidos padrões até agora pouco explorados ou mesmo não explorados”.