Pesquisas sobre malária, saúde intestinal e memória vencem 64ª edição dos Prémios Pzifer
O projeto distinguido na categoria de Investigação Clínica, foi atribuído à equipa de Investigadores internacionais liderada por Miguel Prudêncio, do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (iMM).
A equipa publicou recentemente na revista científica Science Translational Medicine, os resultados do ensaio clínico de Fase 1/2a de uma potencial nova vacina contra a malária, denominada PbVac, que envolveu um total de 24 voluntários saudáveis. Embora nenhum dos indivíduos vacinados ficasse totalmente protegido contra a doença, os resultados mostraram uma redução muito significativa de 95% na infeção hepática, o primeiro estágio da infeção por malária em humanos. Este estudo abre caminho para desenvolvimentos adicionais da vacina PbVac e similares, no sentido do desenvolvimento de uma estratégia de vacinação eficaz contra a malária humana.
O PbVac é o primeiro membro de uma nova classe de agentes do tipo “organismo completo” desenhados para a vacinação contra a malária que consiste na ideia de usar parasitas de roedores, que não são patogénicos para os seres humanos, como base para uma nova vacina contra a malária.
A malária é uma doença causada por parasitas Plasmodium que, apesar dos progressos registados na última década, causaram mais de 400.000 mortes só em 2018. Uma vacina eficaz é considerada uma ferramenta crucial para a prevenção e futura eliminação da malária.
No entanto, o desenvolvimento clínico de uma vacina contra a malária provou ser um enorme desafio para inúmeros grupos de investigação ao longo dos anos e em todo o mundo. Esta dificuldade resulta sobretudo da complexa biologia dos parasitas da malária, cujo ciclo de vida inclui várias etapas que ocorrem quer no mosquito, vetor da doença, quer no hospedeiro mamífero, incluindo um estágio obrigatório e assintomático de desenvolvimento no fígado humano.
“O nosso trabalho fornece a validação clínica de uma nova abordagem de vacinação contra a malária, e abre possibilidades para a sua otimização no sentido da criação de uma vacina eficaz contra esta doença. Foi por isto uma enorme felicidade e uma honra ver o nosso trabalho reconhecido através de um prémio com o prestígio inigualável que o Prémio Pfizer-SCML granjeou ao longo das últimas décadas”, refere o Investigador do iMM, Miguel Prudêncio.
Na categoria de Investigação Básica, um dos projetos vencedores pertence ao Investigador Henrique Veiga-Fernandes, da Fundação Champalimaud, sobre a função das células inatas linfoides de tipo 3 (ILC3).
Pessoas que fazem turnos de trabalho noturnos, ou que mudam com frequência de fuso horário, têm uma tendência acrescida para o excesso de peso e sofrem mais amiúde de inflamações intestinais. Vários esforços têm procurado desvendar a causa deste fenómeno, tentando relacionar os processos fisiológicos com a atividade do relógio biológico.
Este trabalho permitiu definir que a função das células inatas linfoides de tipo 3 (ILC3), conhecidas por contribuírem para a saúde intestinal, se encontra sob o controlo do seu próprio relógio biológico que por sua vez é regulado pelo cérebro.
Nomeadamente, as ILC3 possuem um relógio molecular, e a desregulação dessa maquinaria conduz a uma redução das ILC3 no intestino, a uma alteração do epitélio intestinal e do seu microbioma, assim como a um aumento de infeções intestinais e a um anormal metabolismo lipídico. Surpreendentemente, os investigadores observaram ainda que os ciclos noite-dia são os principais reguladores do relógio biológico das ILC3, sugerindo assim que sinais cerebrais possam controlar a atividade das ILC3. Nesse sentido, a desregulação cirúrgica ou genética da ritmicidade do cérebro conduziu a alterações das ILC3 assim como à desregulação do microbioma e do metabolismo lipídico.
Este estudo revelou a existência de um circuito circadiano que traduz os ciclos naturais noite-dia em sinais fundamentais para o funcionamento das ILC3, garantindo assim a saúde intestinal, o metabolismo e a proteção contra infeções.
“Este trabalho permitiu-nos identificar que, para além do papel dos linfoides brancos no intestino no controlo da inflamação, a atividade desses glóbulos brancos dependia do nosso ritmo biológico. Esse ritmo biológico está associado a doenças tão diversas como o cancro, a obesidade ou doenças inflamatórias crónicas. Essa compreensão revela-se essencial no desenvolvimento de novas abordagens terapêuticas”, refere o Investigador da Fundação Champalimaud, Henrique Veiga-Fernandes.
Na categoria de Investigação Básica, o outro projeto vencedor pertence à Investigadora Julie Ribot, do iMM, sobre as células T gamma delta (γδ), produtoras de IL-17 que residem nas meninges e controlam plasticidade sináptica e memória de curto prazo.
O trabalho centra-se na interface entre o sistema imunitário e o sistema nervoso central e em particular na cognição. Neste projeto, os investigadores perguntaram de que forma o sistema imunitário pode influenciar o processo de Aprendizagem e Memória, quais são as células envolvidas neste processo, onde e como atuam. Foi identificada pela primeira vez em modelos animais uma população de células - denominadas células T gamma delta (γδ) - que produzem uma molécula inflamatória - chamada IL-17 - e que colonizam os vasos linfáticos das meninges cerebrais rapidamente após o nascimento e onde permanecem durante a vida adulta tendo um impacto na neurofisiologia basal.
Os animais que não têm esta população de células T γδ, ou a molécula IL-17, perdem a memória de curto prazo. Curiosamente, estes ratinhos retêm uma memória de longo prazo normal, sugerindo que os dois processos de memória de curto e longo prazo são regulados por diferentes componentes do sistema imunitário. Conceptualmente, este trabalho revela uma ligação evolutiva entre os sistemas imunitário e nervoso central, ao mostrar que estão em constante comunicação e que esta influencia a construção da memória de curto prazo.
Julie Ribot, a Investigadora do iMM, refere sobre a importância deste prémio: “O prémio Pfizer é muito prestigiante e obviamente um grande reconhecimento do nosso trabalho. Isso dá-nos mais visibilidade junto de outros cientistas e também junto da sociedade em geral, pois acredito que o envolvimento público com a investigação básica é fundamental. Agora, de um ponto de vista mais pessoal, posso dizer que fiquei particularmente emocionada ao saber que o nosso trabalho foi premiado. Este foi o meu primeiro projeto como investigadora principal, onde supervisionei alunos pela primeira vez, tendo estabelecido colaborações. Tem sido uma ótima experiência e agora temos uma cereja no topo do bolo. Isso é muito importante e dá-nos motivação extra e força para prosseguir com os nossos projetos, agora com o objetivo de compreender as implicações das nossas descobertas no contexto das doenças neurodegenerativas”.
A cerimónia da entrega dos prémios, no valor total de 50 mil euros, terá lugar dia 11 de novembro, e conta com a presença do Presidente da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa, Luís Graça, e do Diretor-Geral da Pfizer Portugal, Paulo Teixeira.
A Cerimónia será transmitida através da página de Facebook do Expresso, a partir das 18h00.