Conhecer as doenças ano-rectais benignas mais frequentes
As doenças benignas mais frequentes, do complexo ano-rectal, são a doença hemorroidária e as fissuras. Outras há que também podem coexistir ou ser autónomas: prurido, prolapso, fístula, infecções virais, alterações do pavimento pélvico e dor pélvica.
Porque é fácil e frequente confundirem-se sintomas - por serem parecidos ou concomitantes e referidos à mesma região anatomo-funcional - embora resultem de causas e evoluções distintas, é indispensável um diagnóstico correcto, em cada caso e em cada ocorrência. Só assim poderá haver boa resposta evitando condições crónicas muito penalizantes.
Todos os casos só devem ser tratados após observação adequada e sem prescrições cegas.
É necessário sensibilizar - cidadãos e profissionais de saúde - para a importância de olharem as alterações ano-rectais benignas como fonte de grande sofrimento e absentismo que, não tendo a gravidade do cancro, fazem sofrer e, por isso, devem impor uma avaliação e observação cuidadas para que os resultados sejam melhores.
Não!… à prescrição cega! O diagnóstico correcto é essencial.
Doença Hemorroidária
As hemorroidas são estruturas anatómicas presentes no canal anal dos humanos, constituídas por pequenas artérias e veias envolvidas por fibras elásticas, estando sujeitas a fluxos e pressões de sangue e a pressões do conteúdo fecal.
As hemorroidas têm acção mecânica no encerramento terminal do canal anal, complementar do aparelho esfincteriano e conferindo “finesse” ao processo de retenção, em particular para gases. E contribuem, em cerca de 20%, para a pressão anal em repouso.
Portanto, hemorroidas não são doença!
Por distúrbio das estruturas hemorroidárias, elas fragilizam-se, rompem-se as fibras de sustentação dos vasos sanguíneos e, sob pressão, iniciam distensão e aumento de volume, acumulam maiores quantidades de sangue e têm menor elasticidade. Assim começa a doença hemorroidária, cuja origem não é hereditária.
As hemorroidas internas localizam-se no recto, sangram e, raramente causam dor. As hemorroidas externas localizam-se no ânus, estão mais à vista e tocam-se, raramente sangram, mas quando há trombose causam dor e podem sangrar.
Alertas! Perdas de sangue, perda de muco (roupa interior manchada), dor, nódulos, prurido na região anal e perianal, anemia.
Diagnóstico
- História e observação clínicas;
- Anuscopia
Tratamento
a) não-cirúrgico
Dieta rica em fibras, evitar alimentos e condimentos agressivos, ingestão abundante de água, disciplina intestinal, uso controlado de laxantes, posição adequada para defecar, estadia curta na sanita (a sanita não é um sofá!), híper-higiene local sem substâncias agressivas (não ao papel, sim ao chuveiro), banhos d’assento, produtos farmacêuticos, gelo.
b) cirúrgico
- Não-operatório: Laqueação com elásticos; Esclerose; Coagulação térmica.
- Operatório: Hemorroidectomia(dolorosa; indicações restritas); Técnicas com menos dor, mais confortáveis e rápida recuperação (op. Longo, THD, HET, HAL-RAR, Laser díodo).
Fissura Anal
É um rasgão (ferida) na parte interna e baixa do ânus, que ocorre em qualquer idade. Começa por dar manifestações dolorosas agudas, mas pode tornar-se crónica. Causada por obstipação, fezes duras, diarreia, trauma local, esfíncter muito tenso.
Pode estar relacionada com cancro, doença inflamatória intestinal, doenças malignas do sangue, doenças infeciosas, nomeadamente as sexualmente transmitidas e associadas a HPV.
Manifesta-se com dor muito intensa e sangramento vermelho vivo, especialmente durante e após a defecação. Sangra em pequena quantidade, mas com persistência. Evolui alternando crises e acalmias. Se os sintomas locais não desaparecem por completo, então haverá nova crise (surtos de dor).
Diagnóstico
História clínica e observação directa.
Importante! A observação directa é, muitas vezes, condicionada e impedida pela intensidade da dor e a não identificação pode induzir outro diagnóstico retardando o diagnóstico e tratamento correctos.
Tratamento
a) na fase aguda podem cicatrizar espontaneamente (cerca de 80%) ou podem necessitar de tratamento não-operatório.
b) se a fissura persiste e se torna crónica, ou reaparece várias vezes, então só cura com tratamento operatório. Estas fissuras anais podem originar abcessos e fístulas pelo que exigem uma exploração mais extensa e pormenorizada por um cirurgião.
A operação para o tratamento das fissuras anais crónicas – esfincterotomia anal - é de pequena monta e alivia a tensão do músculo em simultâneo com a remoção de fibrose. O alívio da dor é imediato e mais de 90% dos casos não reaparecem.
O fantasma de eventual incontinência pós-cirurgia, não cola com a realidade de uma técnica correcta.
Com muita frequência, as queixas ano-rectais suscitam confusão entre fissura e doença hemorroidária, originando tratamentos inadequados, retardando o diagnóstico e contribuindo para as complicações associadas à cronicidade. Só a observação directa permite evitar erros. Há várias perturbações anais que se confundem e o tratamento de umas não resulta com outras. É obrigatório observar o ânus e o recto.