Infertilidade atinge 15% dos casais em idade reprodutiva
De acordo com a Associação Portuguesa de Infertilidade, estima-se que, em Portugal, 15 a 20% dos casais em idade reprodutiva (cerca de 300 mil) sofra de infertilidade. No entanto, calcula-se que exista uma percentagem elevada de casos desconhecida, uma vez que nem todos procuram ajuda médica. Neste sentido, começo por lhe perguntar quais as principais causas da infertilidade e quando se deve procurar ajuda médica? Quais os “sinais de alerta”?
Causas principais da infertilidade e sua distribuição:
- 30-35% fatores femininos: disfunção ovulatória, lesão ou obstrução nas trompas uterinas, endometriose, patologia e anomalias no útero e colo, menopausa precoce.
- 30-35% fatores masculinos: alterações na qualidade do esperma, patologias do testículo, dutos, epidídimo e próstata, disfunções na ereção e ejaculação.
- 20% fatores mistos: os dois elementos do casal são responsáveis.
- 15-20% causa inexplicada: não se consegue determinar o motivo da infertilidade.
O principal “sinal de alerta” que deve levar a procurar ajuda médica é quando um casal (com a mulher ≤ 36 anos), com vida sexual regular sem contracepção há pelo menos 1 ano, não consegue obter uma gravidez. Quando a mulher tem 37 ou mais anos de idade é recomendável que a procura de orientação médica ocorra ao final de 6 a 8 meses de tentativas. Outros sinais de alerta importantes são a existência de sintomas que estejam relacionados com os principais fatores femininos e masculinos causadores de infertilidade, como por exemplo na mulher a ocorrência de menstruações muito irregulares ou ausência de menstruação durante alguns meses ou no homem a existência de uma tumefacção dolorosa num testículo ou alterações na ejaculação e ereção.
A infertilidade, ao contrário do que se pensa, não é contudo sinónimo de esterilidade, sendo que a infertilidade pode manifestar-se já depois do nascimento de um filho. Para melhor compreendermos esta questão, pedia-lhe que nos explicasse em que consiste um conceito e outro. O que os distingue?
Na realidade não são sinónimos, a infertilidade significa dificuldade em engravidar (quando um casal sem usar métodos contraceptivos e com vida sexual regular há pelo menos um ano não consegue obter uma gravidez) ou de conseguir que uma gestação chegue ao seu termo.
A esterilidade é a incapacidade de um indivíduo ou de um casal obter uma gravidez.
Que tipos de tratamento de PMA existem? E qual a taxa de sucesso associada?
Existem vários tipos de tratamento de PMA:
- Inseminação artificial (IA) ou inseminação intrauterina (IIU) intraconjugal ou com esperma de dador. As taxas de gravidez por inseminação realizada situam-se entre 12-14% para a intraconjugal e entre 23-26% para a inseminação com esperma de dador.
- Fertilização in Vitro (FIV) intraconjugal, com esperma de dador e a FIV com recurso a ovócitos de dadora. As taxas de sucesso para os 2 tipos de FIV sem ovodoação são semelhantes e são de 35-40%, enquanto a FIV com utilização de ovócitos de dadora tem taxas de gravidez mais elevadas de 50-55%.
- Injeção intracitoplasmática de espermatozoide (ICSI) intraconjugal, com esperma de dador e a ICSI com recurso a ovócitos de dadora. As taxas de gravidez da ICSI sem ovodoação situam-se entre 32-35%, e as das ICSI com recurso a ovócitos de dadora entre 50-55%.
- Transferência de embriões criopreservados (TEC) com taxas de sucesso sobreponíveis às da FIV e ICSI.
Qual a percentagem de nascimentos por PMA em Portugal?
Os nascimentos por PMA correspondem a aproximadamente 3% do número total de nascimentos ocorridos em Portugal.
Quanto ao tratamento, há a ideia generalizada de que este não é um processo fácil, podendo ser demasiado longo. Neste sentido, qual a duração média de um tratamento, desde a primeira consulta até à gravidez efetiva. Existem “efeitos adversos”?
Nos centros privados o tempo médio decorrido desde a primeira consulta até ao diagnóstico da gravidez é de cerca de 2 a 3 meses. A duração do tratamento propriamente dito varia entre 15 a 18 dias. Podem existir efeitos adversos e os mais comuns são:
- Dores de cabeça;
- Desconforto mamário;
- Alterações do humor, sonolência e por vezes sensação de cansaço;
- Distúrbios digestivos: náuseas, obstipação e gases intestinais;
- Distensão abdominal e edemas ligeiros.
- Efeitos adversos mais raros:
- Alterações da visão
Relacionados com a síndrome de hiperestimulação ovárica: dores pélvicas moderadas a intensas, distensão abdominal e edemas acentuados, vómitos, dispneia.
Quais os principais cuidados a ter durante um tratamento de PMA?
Existem vários cuidados a ter durante um tratamento de PMA a destacar entre outros:
- Cumprimento rigoroso da medicação prescrita;
- Uma alimentação equilibrada rica em proteínas e fibras;
- Boa ingestão de líquidos;
- Prevenção da obstipação (importante ajuda dos 2 pontos anteriores);
- Ter um número de horas de sono adequado (7-8 horas);
- Não consumir drogas, álcool e tabaco.
Quanto à prevenção, apesar das causas para infertilidade estarem associadas a alguma anomalia relacionada com o aparelho reprodutor, a verdade é que há alguns fatores relacionados com o estilo de vida que podem interferir na concepção. Neste sentido, quais os cuidados a ter?
Para além da idade da mulher e do homem não existem dúvidas que o estilo de vida e outras situações contribuem para uma diminuição da fertilidade como o sedentarismo e a obesidade, a exposição crescente a substâncias tóxicas (tabaco, álcool e drogas) e a poluentes, o aumento da incidência de doenças sexualmente transmissíveis e de doenças cancerígenas em idades cada vez mais jovens. Sendo assim as principais preocupações e cuidados a ter serão a tomada de medidas eficazes para prevenção e combate de todos estes fatores.
Neste âmbito, é aconselhado, por exemplo, que a mulher não adie a gravidez. No entanto, sabemos que em muitos casos isso não é possível. Que recursos existem para estas mulheres, tendo como objectivo a preservação da sua fertilidade?
Para as mulheres que têm que adiar a gravidez e que procuram preservar o melhor possível a sua fertilidade, os principais recursos a que devem recorrer são precisamente as alterações no estilo de vida, com o combate ao sedentarismo e à obesidade, evitar a exposição a substâncias tóxicas e poluentes, e prevenir as doenças sexualmente transmissíveis e as doenças cancerígenas. Existe também um outro recurso que pode e deve ser utilizado que é a criopreservação de ovócitos, que se recomenda ser efetuada, preferencialmente, antes dos 35 anos de idade.
Por outro lado, continua a associar-se a questão da infertilidade ao sexo feminino. Sabe-se, no entanto, que nem sempre a “culpa” é delas e que não existe praticamente tratamento para o fator masculino da infertilidade… Que estigma é este que continua a perseguir os homens, evitando que falem sobre este tema?
Como referi anteriormente, os fatores responsáveis pela infertilidade dividem-se igualmente entre causas masculinas e femininas, isto é a “culpa” é tanto do homem como da mulher. Contudo durante muito tempo a infertilidade masculina foi tratada como um assunto tabu. Esta realidade ainda a encontramos, atualmente, e o estigma que faz com que os homens evitem falar sobre este tema deve-se a razões de ordem social e cultural, relacionadas com o machismo, a figura do homem e o seu papel na sociedade e ainda a existência de alguns mitos sobre este tema, como por exemplo que a fertilidade e a virilidade estão relacionadas. Por lado, segundo a opinião de muitos especialistas da área da psicologia, o homem por motivos de personalidade tende a falar menos de si e das suas preocupações comparativamente com a mulher.
Para terminar, peço-lhe algumas recomendações sobre o tema em análise. Que mensagem gostaria de deixar?
As principais recomendações que faço sobre este tema são:
- Seguramente a forma mais eficaz de prevenir a infertilidade é a mulher não adiar o projeto da maternidade para depois dos 34 anos, sendo fundamental a educação da população e a divulgação das vantagens de uma gravidez na idade jovem.
- É igualmente fundamental que as pessoas desde cedo tenham um estilo de vida mais saudável, combatendo o sedentarismo e a obesidade, evitem a exposição a poluentes, o consumo de tabaco, álcool e drogas, e previnam eficazmente as doenças sexualmente transmissíveis.
- Não ignorar o peso do fator masculino na infertilidade, devendo-se sempre estudar o homem sistematicamente, visto que nas últimas décadas a qualidade do esperma tem claramente diminuído.