Entrevista

Idosos são os que mais sofrem com a dor

Atualizado: 
18/03/2019 - 13:07
A dor é um dos principais motivos de consulta, incapacidade e absentismo em Portugal, estimando-se que atinja cerca de 40% da população independentemente da sua idade. E se até há uns anos, enquanto sintoma, merecia pouca atenção por parte da comunidade médica, hoje é considerada um importante problema de saúde pública. No entanto, há ainda um vasto número de pessoas que sofre em silêncio. Na sua maioria são idosos, mas também crianças ou pessoas com deficiência cognitiva. Em entrevista ao Atlas da Saúde, Ana Pedro, presidente da Associação Portuguesa para o Estudo da Dor, revela que a “dor crónica afeta mais pessoas e tem um impacto mais significativo do que a diabetes, doenças cardíacas ou cancro”.

A Associação Internacional para o Estudo da Dor definiu o ano de 2019 como o “Ano de Luta contra a Dor nas Populações Vulneráveis”. Neste sentido, começo por perguntar em que consiste a Dor? E o que distingue a dor aguda da dor crónica?

De acordo com a Associação Internacional para o Estudo da Dor (International Association for the Study of Pain – IASP), a dor é “uma experiência multidimensional desagradável, envolvendo não só uma componente sensorial, mas também uma componente emocional, e que se associa a uma lesão tecidular concreta ou potencial, ou é descrita em função dessa lesão”.

Dor aguda é a que está bem estabelecida no tempo, em resposta a um estímulo conhecido e autolimitada na sua duração. As suas principais funções são a sinalização de uma doença e proteção da integridade do indivíduo. Dor crónica é uma doença arrastada no tempo que se acompanha de um conjunto de manifestações físicas, psicológicas e comportamentais, com impacto em todas as esferas da vida de quem dela sofre.

Quais as principais causas da dor?

Na população em geral, a lombalgia (dor lombar), com ou sem irradiação aos membros inferiores, é a principal causa de dor, seguida da cervicalgia (dor cervical). As doenças osteoarticulares degenerativas (quer a nível da coluna, quer a nível das articulações) são também importantes causas de dor.

Como é feito o seu diagnóstico? De que forma é possível quantificar a dor, tendo em conta que muitos não a conseguem compreender?

A dor é uma experiência individual e subjetiva que apenas o próprio pode quantificar e qualificar. Através de escalas de intensidade de dor e escalas multidimensionais de impacto da dor podemos avaliar os vários componentes da dor, essencial no seguimento do doente e valorização da terapêutica efetuada.

A dor pode ser prevenida? Quais os cuidados a ter?

A dor pode ser prevenida, sobretudo a dor músculo-esquelética, através da adoção de hábitos de vida saudável, como a prática regular de exercício físico, utilização de posturas adequadas e controlo do excesso de peso.

Tratando-se de uma entidade clínica complexa, em que consiste o seu tratamento?

O doente com dor crónica deve ser avaliado como um todo. Isto implica a avaliação não só da dor, mas também do impacto funcional, emocional, psicológico, familiar e laboral, entre outros, estabelecendo um plano terapêutico muitas vezes multidisciplinar, adequado a cada doente específico. Como se depreende, nem sempre é suficiente a prescrição apenas de medicamentos.

O que explica o subdiagnóstico da dor nos grupos mais vulneráveis?

São populações cuja capacidade de comunicar está diminuída ou ausente, sendo mais difícil de valorizar e compreender as suas queixas.

Em matéria de diagnóstico, quais as queixas mais frequentes neste grupo? E o que falha no que diz respeito ao acesso ao seu tratamento?

Nos doentes vulneráveis podemos englobar as crianças, doentes com demência ou com deficit cognitivo, entre outros. Uma vez que, muitas vezes, não comunicam ou comunicam de uma forma não-verbal e mais difícil de interpretar, pode haver atraso no diagnóstico e, em consequência, do tratamento, que por si também é mais complexo porque na maioria das vezes são também mais vulneráveis à ação dos medicamentos.

De um modo geral, de que forma pode a dor condicionar a vida do doente? Quais as repercussões económicas e sociais da dor?

A dor pode condicionar parte ou mesmo a totalidade da vivência diária do doente, com impacto na sua funcionalidade, emoções, bem-estar psicológico, relações familiares, pessoais e profissionais, entre outros.

A dor é responsável por uma elevada taxa de absentismo laboral e reformas antecipadas. Os custos diretos (sobretudo hospitalização) e indiretos (benefícios sociais) dos cuidados de saúde associados à dor são elevados. Em Portugal, no ano de 2010, considerando apenas a lombalgia, os custos foram estimados em 738,85 milhões de euros, 280,95 milhões de euros por absentismo temporário e 458,90 milhões de euros por reformas antecipadas e outras formas de não participação no mercado de trabalho. A dor crónica afeta mais pessoas e tem um impacto mais significativo do que a diabetes, doenças cardíacas ou cancro.

Na sua opinião, porque continua a ser tão difícil entender a dor?

Por se tratar de uma experiência individual e subjetiva e que, no caso da dor crónica, ultrapassa a mera sensação ou sintoma sinalizador de doença, atingindo as várias esferas da vivência do indivíduo. Para além da complexidade de avaliação, também o seu tratamento é muitas vezes difícil e moroso.

Por fim, no âmbito desta temática, quais as principais recomendações ?

Recomenda-se uma maior e melhor avaliação e valorização da dor nos grupos vulneráveis, única forma de se conseguir um tratamento mais atempado, adequado, eficaz e efetivo.

Autor: 
Sofia Esteves dos Santos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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