Opinião

Dia Mundial do Médico de Família: «Juntos pela Saúde»

Atualizado: 
21/05/2018 - 10:44
Desde 2010 que o dia 19 de Maio serve para celebrar os progressos em medicina familiar e para promover a importância dos cuidados de saúde da pessoa e da sua família, valorizando o papel do médico de família na saúde e bem-estar do agregado familiar e a importância que a Clínica Geral/Medicina Geral e Familiar tem nos sistemas de saúde.

O Dia Mundial do Médico de Família foi criado pela World Organization of National Colleges, Academies and Academic Associations of General Practitioners/Family Physicians (WONCA), uma Organização Não Governamental sem fins lucrativos que colabora estreitamente com a Organização Mundial de Saúde e que é geralmente conhecida como Organização Mundial de Médicos de Família.

A WONCA foi criada em 1972, agregando hoje dezenas de organizações locais ou regionais de mais de 130 países ou territórios, que representam cerca de 500.000 médicos de família e cerca de 90% da população mundial.

Em Portugal, a parceira da WONCA é a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), anteriormente designada Associação Portuguesa dos Médicos de Clínica Geral (APMCG), a quem cabe a organização, no nosso país, do Dia Mundial do Médico de Família, que em cada ano tem tido um lema diferente: em 2017 foi “Vencer o Sedentarismo… Adeus Depressão”, em 2016 foi “Portugal em movimento e sem fumo!” e em 2015 a mensagem central foi “O Médico de Família é essencial na promoção da saúde dos portugueses”.

Em 2018, o Dia Mundial do Médico de Família tem o lema oficial “Juntos pela Saúde” e é dedicado a uma temática central em todas as sociedades modernas e que integra o núcleo duro dos valores de uma democracia inclusiva: a obtenção de uma cobertura universal de saúde, o fim das desigualdades no acesso à saúde e o papel de liderança que o médico de família pode e deve exercer nesta luta que a todos interessa e diz respeito.

Segundo a APMGF, e como em anos anteriores, será também interessante o envolvimento de parceiros locais (autarquias, clubes, associações, escolas, ginásios, lares, etc.) nas actividades organizadas na comunidade pelos médicos de família. Pretende-se deste modo divulgar projetos e serviços em que os médicos de família contribuem, de facto, para uma melhor saúde do indivíduo, da família e da comunidade em que estão inseridos (por exemplo na prevenção da doença e promoção da saúde), sem esquecer os princípios da equidade e da igualdade de direitos.

O Médico de Família e os Cuidados Primários de Saúde

O exercício da Medicina Familiar insere-se nos Cuidados Primários de Saúde (CPS), que se baseiam em estruturas comunitárias simples e de fácil acesso (centros de saúde, consultórios particulares, pequenas clínicas, etc.), por oposição aos Cuidados Secundários de Saúde, baseado em estruturas maiores e mais centralizadas (hospitais, grandes clínicas, maternidades, “sanatórios”, etc.), vocacionadas para o tratamento de doenças por equipas de saúde especializadas.

O conceito de “Cuidados Primários de Saúde” foi definido em 1978, na Conferência Internacional da OMS de Alma-Ata, no Cazaquistão, na qual 134 países (entre os quais se encontrava Portugal) e 67 organismos internacionais chegaram a acordo sobre a seguinte definição: “Os cuidados primários de saúde são cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o país podem manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e autodeterminação. Fazem parte integrante tanto do sistema de saúde do país, do qual constituem a função central e o foco principal, quanto ao desenvolvimento social e económico global da comunidade".

A partir deste conceito básico, cada país ou região organiza os seus próprios CPS, necessariamente de forma diferente de local para local, reflectindo as diferentes características socio-económicas locais e os modelos organizacionais específicos dos respectivos sistemas de saúde.

Idealmente, os cuidados primários de saúde devem representar sempre o primeiro nível de contacto dos indivíduos, da família e da comunidade com o seu sistema nacional de saúde, devendo os cuidados de saúde ser levados o mais proximamente possível aos lugares onde pessoas vivem e trabalham, constituindo-se assim como o primeiro elemento de um continuado processo de assistência à saúde (que pode ficar limitado ao atendimento primário ou ter continuidade para outros níveis mais “elevados” do sistema de saúde).

Dando corpo teórico a estas ideias basilares, a Drª Barbara Starfield, pediatra e Mestre em Saúde Pública norte-americana, estabeleceu em 1998 quatro pilares fundamentais dos Cuidados Primários de Saúde:

1 - Cuidados de primeiro contacto: espera-se dos CPS que sejam mais acessíveis à população, em todos os sentidos, e que assim sejam o primeiro recurso de saúde a ser procurado e a porta de entrada para o sistema de saúde; para o doente, isto quer dizer que quando tiver um problema de saúde vai procurar o seu médico ou enfermeiro de família em primeiro lugar;

2 – Cuidados longitudinais (ao longo da vida):a pessoa atendida mantém o seu vínculo com o serviço ao longo do tempo, de forma que quando haja uma nova necessidade esta seja atendida de forma mais eficiente (ao longo dos anos os profissionais de saúde e os doentes passam a conhecer-se melhor e resolvem melhor os seus problemas de saúde;

3 – Cuidados compreensivos (globais, holísticos): os CPS devem fornecer ou tratar de quem forneça todos os tipos de cuidados de saúde (preventivos, agudos, crónicos, paliativos ou de suporte) com a preocupação de entender o doente como um todo e não apenas como algum ou alguns dos seus órgãos ou sistemas;

4 – Coordenação/integração com os restantes níveis de cuidados de saúde: o nível primário é responsável por todos os problemas de saúde, continuando co-responsável por eles mesmo quando os encaminhe para outros níveis assistenciais (mesmo quando parte substancial do cuidado à saúde de uma pessoa seja realizado em outros níveis de atendimento, o nível primário tem a incumbência de organizar, coordenar e/ou integrar esses cuidados, já que frequentemente são realizados por profissionais de áreas diferentes ou terceiros, e que portanto têm pouco diálogo entre si); além do vínculo com outros serviços de saúde, os serviços do nível primário podem operar visitas ao domicílio, reuniões com a comunidade e ações intersectoriais.

É evidente que este modelo pressupõe a existência de equipas multidisciplinares, que incluem necessariamente os médicos de família mas não dispensam enfermeiros, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, assistentes sociais, higienistas orais, técnicos de saúde pública, auxiliares de acção médica, assistentes operacionais, motoristas e tantos outros que caibam nas competências assistenciais de cada unidade local de saúde, que são basicamente a educação para a saúde, a prevenção, diagnóstico e tratamento das doenças e ainda a reabilitação.

De modo a melhorar a qualidade dos cuidados primários de saúde e rentabilizar o tempo de trabalho e os recursos logísticos, muitas equipas organizam-se em diferentes patamares assistenciais, podendo organizar consultas ou atendimentos específicos, como Saúde dos Adultos, Saúde Infantil e Juvenil, Planeamento Familiar, Saúde Materna, Vacinação, Cuidados Continuados Domiciliários, Diabetes, Hipertensão Arterial, Evicção Tabágica, Saúde Oral, Urgência Básica, Úlcera Varicosa, Preparação para o Parto, entre tantos outros.

Em alguns países, estas equipas incluem mesmo médicos de especialidades ditas “hospitalares” (como dermatologia, pediatria, psiquiatria, ginecologia, cardiologia ou reumatologia) que fazem o atendimento de doentes selecionados pelos médicos de família que necessitam de uma orientação médica especializada mas não necessariamente de recorrer aos serviços mais diferenciados dos hospitais. Quando este modelo funciona bem, o atendimento dos doentes é mais rápido, cómodo e económico e ajuda ao aperfeiçoamento científico e técnico dos profissionais de saúde dos CPS.

Autor: 
Dr. Viriato Horta - Medicina Geral e Familiar Clínica Europa Carcavelos
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Clínica Europa Carcavelos