Especialista explica a doença

Hemofilia: doentes têm um risco elevado de hemorragia

Atualizado: 
07/05/2021 - 11:40
Já ouviu falar em Hemofilia? A especialista em Hematologia Clínica, Daniela Alves, explica em que consiste esta doença genética rara, que afeta cerca de 700 portugueses.

A Hemofilia é uma doença genética, hereditária, associada a uma deficiência na coagulação, por diminuição dos níveis de um dos factores, ou seja, de uma das proteínas que contribuem para a cascata da coagulação.

A cascata da coagulação é desencadeada por estímulos, que irão provocar a activação de várias proteínas em cadeia, os factores de coagulação, que se comportam como peças de dominó alinhadas e que são derrubadas, culminando no objectivo final que consiste na formação de fibrina. A fibrina é a “rede” essencial que, juntamente com as plaquetas, forma o coágulo sanguíneo.

Assim, os indivíduos com Hemofilia não produzem quantidades suficientes dos factores VIII (Hemofilia A) e IX (Hemofilia B), o que faz com que a cascata de coagulação seja activada de forma deficiente, havendo mais dificuldade na formação de coágulos.

Tal como explicado mais acima, a Hemofilia é uma doença genética, apresentando uma hereditariedade ligada ao cromossoma X, ou seja, de uma forma geral as mulheres são consideradas “portadoras” e os homens é que desenvolvem a doença.

Este diferencial de géneros é explicado pelo facto de as mulheres, como têm dois cromossomas X, têm duas cópias do gene que codifica o factor VIII e o factor IX, pelo que mesmo que apresentem uma anomalia numa das cópias, o gene remanescente funciona plenamente e compensa essa falha. Já os homens, como só têm um cromossoma X, que emparelha com o cromossoma Y, só possuem uma cópia do gene, estando sujeitos a desenvolver a doença quando a cópia que é herdada dos pais é a patológica.

Os indivíduos com Hemofilia têm habitualmente uma forma grave da doença, estando sujeitos a hemorragias espontâneas, ou seja, sem traumatismo associado.

De referir que na Hemofilia, a gravidade da doença é facultada pela gravidade do défice do factor VIII ou do factor IX. Assim, um doente que mantenha uma actividade do factor superior a 5% do normal, costuma apresentar Hemofilia Ligeira. Os doentes com Hemofilia Grave têm habitualmente uma actividade do factor inferior a 1%.

As hemorragias afectam mais frequentemente os músculos e as articulações. Mas podem atingir qualquer órgão. As hemorragias podem ser fatais caso ocorram no Sistema Nervoso Central, ou seja, provocando o chamado “derrame cerebral”. Os doentes com Hemofilia também têm um risco muito alto de hemorragia após procedimentos invasivos tão simples como extracções dentárias.

Os indivíduos com Hemofilia devem evitar actividades desportivas que possam potenciar quedas ou traumatismos e sabem que se devem dirigir ao hospital caso sofram algum traumatismo.

Antigamente os doentes com Hemofilia tinham uma esperança de vida curta, alguns falecendo durante a infância ou adolescência e os que apresentavam doença menos grave sobreviviam até à idade adulta, mas habitualmente com sequelas gravíssimas nas articulações.

Actualmente os doentes são tratados com concentrados de factor (VIII no caso de Hemofilia A e IX no caso de Hemofilia B) que é produzido por bioengenharia ou purificado do plasma de dadores. Sempre que um doente tem uma hemorragia, é tratado com o factor em falta de forma injectável, para repor a actividade da cascata da coagulação.

Alguns doentes com Hemofilia Grave que apresentem múltiplas hemorragias são submetidos a um tratamento regular com o factor em falta, de forma a prevenir mais episódios hemorrágicos.

Nos doentes com Hemofilia mais ligeira, muitas vezes só necessitam de fazer concentrado do factor antes de procedimentos invasivos, como cirurgias.

A única consequência negativa da reposição de factor com productos externos ao organismo do próprio doente é que alguns doentes desencadeiam anticorpos que inactivam o factor infundido, os chamados inibidores. Tal fenómeno é explicado pelo facto de o organismo do doente não produzir os factor em causa, pelo que o seu sistema imune quando o detecta em circulação reconhece-o como estranhos e tenta destrui-lo.

Na tentativa de contrariar este fenómeno, encontram-se em desenvolvimento novos fármacos que visam resolver o problema dos inibidores.

Os doentes com Hemofilia actualmente conseguem ter uma maior qualidade de vida, porque o tratamento previne complicações hemorrágicas que precipitavam internamentos, assim como têm menos sequelas das hemorragias, nomeadamente problemas relacionados com as articulações. São indivíduos que habitualmente se deslocam ao hospital regularmente e alguns fazem a administração dos concentrados de factor na própria casa.  

Autor: 
Dra. Daniela Alves - Especialista em Hematologia Clínica Hospital Lusíadas Lisboa
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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