Reabilitação tem que ser cada vez mais uma aposta no cuidado do doente vascular cerebral
A redução do número de mortes por AVC, que se tem assistido nos últimos anos, tem-se feito acompanhar por um aumento do número de sobreviventes, homens e mulheres obrigados a lidar, no dia-a-dia, com “dificuldades persistentes na execução das suas tarefas”. Um problema que, segundo Maria Teresa Cardoso, coordenadora do Núcleo de Estudos da Doença Vascular Cerebral (NEDVC), da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, torna a reabilitação cada vez mais “uma parte essencial do continuum de cuidados ao doente após AVC, desde a fase aguda, no hospital, prolongando-se vários meses até à reintegração na comunidade”.
“Mais de 2/3 dos sobreviventes de AVC necessitam de reabilitação após hospitalização”, acrescenta a especialista, assistente Sénior de Medicina Interna no Centro Hospitalar de S. João, no Porto. Mas o fim da reabilitação, “geralmente três a quatro meses após o AVC, não deve significar o fim de todo um processo de recuperação”, reforça. “Não podemos esquecer que a apatia está presente em 50% dos sobreviventes do AVC ao fim de um ano e que a fadiga é um sintoma comum e debilitante, assim como a depressão e a inatividade física. Quatro anos após um AVC agudo, mais de 30% dos sobreviventes reportam restrições na autonomia, na reinserção e papel social”.
A reabilitação assume um papel cada vez mais relevante, sendo grande o trabalho a fazer “em vários domínios, incluindo integração social, qualidade de vida, manutenção de atividade, autoeficácia (acreditar na sua própria capacidade)”.
E mesmo depois da fase aguda e subaguda do AVC, “há evidência crescente de melhoria significativa. A reabilitação numa fase mais tardia pós AVC com intervenções multimodais a nível de perceção de recuperação, equilíbrio, marcha, cognição permitem melhorar o prognóstico.”
Algo que é válido também para a fala, apesar de, durante muitos anos, se considerar impossível melhorar a comunicação verbal em doentes com afasia (distúrbio de comunicação) crónica após AVC. “Estudos recentes demonstraram eficácia de terapia intensiva da fala (mais de 10 horas semanais durante três semanas), com efeitos permanentes”, salienta Maria Teresa Cardoso.
A considerar também que “a reabilitação cognitiva com o objetivo de reativar funções perdidas e de ensino de estratégias compensatórias é alvo de atenção crescente e não deve ser descurada. Os problemas de memória são frequentes após o AVC, condicionando dificuldades na vida diária, havendo evidência recente que a participação do doente no seu autocontrolo, que inclui programas de educação e de treino, pode melhorar a qualidade de vida e a autoeficácia após AVC. O coaching em termos de saúde aplicado no sobrevivente do AVC parece prometedor no sentido de capacitar o indivíduo para a melhoria e para o controlo da sua recuperação através do acesso a uma ajuda e suporte personalizado”.