Investigadores pretendem "cirurgia mais personalizada" em casos de incontinência
"O objetivo deste trabalho é verificar as propriedades dos músculos do pavimento pélvico de diferentes mulheres, de forma não invasiva, e compreender qual a influência das diferenças encontradas ao nível da incontinência urinária e do prolapso (disfunção que leva ao deslocamento dos órgãos pélvicos devido ao enfraquecimento dos músculos e ligamentos)", disse à Lusa a Elisabete Silva, investigadora do Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Gestão Industrial (INEGI).
Segundo a investigadora, o parto vaginal, a idade e as alterações hormonais são os principais fatores de risco responsáveis por esses disfunções pélvicas, que prejudicam consideravelmente a qualidade de vida de muitas mulheres, acarretam custos elevados e representam um problema de saúde pública, devido à sua elevada prevalência.
"As taxas de incontinência e de prolapso são muito elevadas e a tendência é aumentar", estimando-se que "28 milhões de mulheres tinham incontinência em 2010, número que passará para cerca de 44 milhões em 2050", indicou a estudante do Programa Doutoral em Engenharia Biomédica da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).
De acordo com Elisabete Silva, em circunstâncias normais, a primeira terapia prescrita para as mulheres que sofrem de incontinência urinária é a fisioterapia do músculo, tendo em vista o seu fortalecimento.
No entanto, em outros casos, estas são encaminhadas diretamente para a cirurgia, onde lhes é aplicada uma fita (implante) que ajuda a evitar a perda de urina.
"Contudo, continuou, trata-se de uma cirurgia com a colocação de um implante, pelo que existe sempre a possibilidade de complicações que podem originar a necessidade de reoperação", explicou.
"O que pretendemos é determinar as propriedades elásticas dos músculos de diferentes pavimentos pélvicos, de formar a ajustar as fitas às diferentes mulheres, criando uma cirurgia mais personalizada", referiu.
Nos resultados obtidos até ao momento, a equipa responsável por este estudo concluiu que a musculatura pélvica das mulheres com incontinência apresenta maior elasticidade e é mais flácida do que as mulheres assintomáticas e com prolapso genital.
Para obtenção destes resultados, o grupo recorreu à utilização de análise computacional, de algoritmos de otimização e de ressonância magnética, desenvolvendo um método de estudo menos invasivo e mais eficiente.
Segundo Elisabete Silva, os estudos tradicionais envolvendo tecido humano utilizam tecido vaginal removido pelo processo cirúrgico ou outros tecidos a partir de cadáveres mas, em qualquer dos casos, os testes realizados em laboratório têm sempre a desvantagem de serem feitos fora do corpo humano.
Por este trabalho, Elisabete Silva foi distinguida recentemente com prémio para o melhor trabalho na categoria "Anatomia e Biomecânica", atribuído na conferência anual da International Continence Society, considerado um dos eventos científicos mais relevantes do mundo nas áreas da uroginecologia e da urologia.
A investigadora considera que um dos próximos passos a serem dados nesta área passa pela caracterização das propriedades mecânicas dos músculos pélvicos de mulheres atléticas e obesas, com e sem patologia, e em mulheres pós-parto e pós fisioterapia.
Para além disso, tem ainda interesse em estudar mulheres com incontinência em diferentes faixas etárias.
"Acredito que as propriedades mecânicas das estruturas de suporte dos órgãos pélvicos de uma mulher de 50 anos são diferentes de uma mulher com 70 anos ou de outra com 20, mesmo excluindo os principais fatores de risco", disse ainda.
Neste projeto, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), participam igualmente os investigadores Renato Natal e Marco Parente, do INEGI/FEUP, e Teresa Mascarenhas, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).
O grupo do qual Elisabete Silva faz parte estuda a biomecânica da cavidade pélvica da mulher há mais de 12 anos, em particular o pavimento pélvico, e envolve investigadores da FEUP, da FMUP, da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto e do Hospital de São João.