Paliativos não se destinam apenas a adultos ou idosos
O avanço tecnológico ao serviço da saúde e o consequente aumento da esperança média de vida resultam num incremento de doenças crónicas e degenerativas de evolução lenta, que irão gerar um compromisso funcional na realização das atividades de vida diária e um aumento da dependência.
Estamos, também, perante um aumento do número de casos de cancro e de HIV+. Para além destes fatores, existe uma clara reorganização familiar, com famílias cada vez mais reduzidas e/ou a residir sozinhas e a necessitar de cuidados de saúde.
Deste modo, os cuidados paliativos assumem uma importância fundamental e prioritária para promover a qualidade de vida, prevenir e aliviar o sofrimento de doentes e famílias, diante de doenças que ameaçam a própria vida.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define Cuidados Paliativos como os cuidados que visam melhorar a qualidade de vida de doentes e famílias, que enfrentam problemas decorrentes de uma doença incurável e/ou grave e com prognóstico limitado, através da prevenção e alívio do sofrimento, com recurso à identificação precoce e tratamento rigoroso dos problemas não só físicos, nomeadamente a dor, mas também psicológicos, sociais e espirituais.
Estes cuidados não devem ser apenas acionados nos últimos dias de vida, mas sim, logo que a doença é identificada como incurável ou progressiva. Por outro lado, não devem ser considerados como cuidados exclusivos, devendo e podendo ser utlizados em concomitância com as terapêuticas dirigidas à doença como por exemplo, cirurgias, quimioterapia e radioterapia.
Importa ainda referir que os cuidados paliativos não se destinam apenas a adultos ou idosos, podendo e devendo também, direcionar-se a crianças, sendo que, na realidade, Portugal é um dos países da Europa com pior cobertura de cuidados paliativos pediátricos.
Assim sendo, quem está abrangido e deverá ser alvo de cuidados paliativos são:
- Crianças e adultos com malformações congénitas ou outras situações que dependam de terapêutica de suporte de vida e/ou apoio de longa duração para as atividades de vida diárias;
- Indivíduos com qualquer doença aguda, grave e ameaçadora da vida (tais como traumatismos graves, leucemia, acidente vascular agudo) onde a cura ou reversibilidade é um objetivo realista, mas a situação em si própria ou o seu tratamento tem efeitos negativos significativos dando origem a uma qualidade de vida fraca e/ou sofrimento;
- Pessoas com doença crónica progressiva, tal como doença vascular periférica, neoplasia, insuficiência renal ou hepática, acidente vascular cerebral com significativa incapacidade funcional, doença cardíaca ou pulmonar avançada, fragilidade, doenças neurovegetativas e demência;
- Pessoas com doença ameaçadora da vida, que escolheram não fazer tratamento orientado para a doença ou de suporte/prolongamento da vida e que requeiram este tipo de cuidados;
- Pessoas com lesões crónicas e limitativas, resultantes de acidente ou outras formas de trauma;
- Pessoas seriamente doentes ou em fase terminal (demência em estádio final, cancro terminal, acidente vascular gravemente incapacitante) que não têm possibilidade de recuperação ou estabilização e, para os quais, os cuidados paliativos intensivos são o objetivo predominante dos cuidados no tempo de vida remanescente.
Os cuidados paliativos devem envolver uma equipa multidisciplinar, pois só assim é possível satisfazer todas as necessidades do doente, bem como da família. Com uma abordagem multidisciplinar e coordenada é possível melhorar a qualidade de vida de todos os intervenientes e influenciar de forma positiva a trajetória da doença. Deste modo, devem fazer parte desta equipa Médicos, Enfermeiros, Psicólogos, Nutricionistas, Fisioterapeutas e Assistência Espiritual (ex: Padre), entre outros.
Os cuidados paliativos podem ser realizados no domicílio, se assim for o desejo do doente e da família. O facto destes cuidados serem prestados em casa podem representar inúmeros benefícios, entre os quais se destacam:
- A maior privacidade, isto é, ser cuidado no seu ambiente e rodeado de família, amigos e dos seus objetos significativos;
- Poder manter as rotinas, com redução de deslocações a consultas médicas e idas à urgência por descompensação de sintomas, minorando (entre outros), os riscos de infeções hospitalares;
- Possibilidade de envolver e integrar a família nos cuidados prestados e na adaptação à doença, apoiando a família também na fase de luto.
Porém, são necessárias mais equipas de cuidados paliativos no domicílio, uma vez que a oferta deste tipo de serviço, com qualidade e com equipas especializadas, é reduzida. As barreiras nesta área são inúmeras. Claramente, verifica-se uma baixa prioridade política e ausência de um planeamento estratégico que garanta a equidade no acesso a estes cuidados e uma relutância em aceitar os cuidados paliativos no processo terapêutico.
Existe ainda o pensamento que a medicina é omnipotente, conseguindo todas as curas e quando tal não acontece é a perda de uma batalha contra a fatalidade da doença. Contudo, importa ainda referir que existe uma baixa capacitação técnico-científica dos profissionais de saúde, em geral, relativamente aos cuidados paliativos.
Apesar das dificuldades, estes cuidados visam o alívio da dor e outros sintomas geradores de sofrimento, afirmam a vida e consideram a morte como um processo natural pelo que são cada vez mais procurados por doentes e suas famílias, sendo o objetivo cuidar da pessoa como pessoa até ao fim da sua vida.