Uma em cada cinco famílias portuguesas não tem acesso a uma alimentação saudável
O Projeto Saúde.Come verificou que estes portugueses têm mais doenças crónicas – diabetes, depressão e doenças reumáticas. E consomem mais recursos de saúde – hospitalizações e consultas hospitalares. “É um sério problema de saúde pública que tem impacto em todo o sistema de saúde no país”, alerta Helena Canhão, coordenadora da investigação.
Cerca de 20 por cento das famílias portuguesas estão em situação de insegurança alimentar, o que equivale a dizer que uma em cada cinco não tem acesso a uma alimentação saudável e receia não ter o que comer. Estes dados resultam da investigação do projeto Saúde.Come, conduzida por uma equipa de investigadores da Faculdade de Ciências Médicas Universidade Nova de Lisboa, em 2015 e 2016. O estudo tem por base um inquérito nacional sobre insegurança alimentar, aplicado a 5.653 indivíduos com mais de 18 anos, representativos da população adulta portuguesa e que estão a ser seguidos desde 2011 (a coorte EpiDoC).
“Este é um sério problema de saúde pública em Portugal”, salienta Helena Canhão, investigadora principal do Saúde.come. “E tem grande impacto, não só na saúde das pessoas como em todo o sistema nacional de saúde”, sublinha.
No estudo, 19,3% famílias portuguesas referiram estar numa situação de insegurança alimentar. Destas, a maioria apresentava um nível de insegurança alimentar ligeiro (14,1%), o que significa alguma incerteza face ao acesso a alimentos ou mesmo alterações nos hábitos alimentares, resultantes de dificuldades económicas. “Motivo de alarme é o facto de cerca de 140 mil pessoas, 1,8 % das famílias portuguesas, reportarem que as suas dificuldades económicas comprometerem a quantidade e a qualidade dos alimentos que têm disponíveis para consumo”, destaca Helena Canhão.
Os resultados sugerem ainda que a insegurança alimentar está associada a piores condições do estado de saúde. Os portugueses nesta situação reportaram uma diminuição na compra de medicamentos e no número de idas ao médico devido às dificuldades económicas sentidas nos três meses anteriores a este inquérito.
“Os indivíduos em insegurança alimentar reportaram uma pior qualidade de vida e capacidade funcional. Revelam ainda maior propensão para doenças crónicas, como a diabetes, a depressão e as doenças reumáticas”, alerta a investigadora. O risco de diabetes e de doenças reumáticas foi cerca de 1,6 vezes superior nos indivíduos em insegurança alimentar. Estes indivíduos apresentam, também por isso, um maior consumo de recursos em saúde – maior número de consultas hospitalares e de hospitalizações.
As ilhas da Madeira e dos Açores e também o Algarve foram as regiões de Portugal onde se identificou uma maior percentagem de insegurança alimentar. Na Madeira e nos Açores, a percentagem de agregados familiares em situação de insegurança alimentar chega mesmo a atingir valores perto dos 29% (29% nos Açores 28,8% na Madeira).
Outro dado a destacar é a menor adesão ao padrão alimentar mediterrânico, por parte das pessoas em situação de insegurança alimentar. Em particular, recorrem menos ao azeite como principal gordura utilizada para a preparação e confeção dos alimentos, consumem menos hortícolas e fruta, e, em contrapartida, preferem as carnes vermelhas e processadas.