Bombeiros que sentem vida em perigo correm maior risco de stress pós-traumático
Realizado por investigadores da Faculdade de Psicologia da Universidade Lusófona do Porto (ULP) e da Escola de Psicologia da Universidade do Minho (UM), o estudo envolveu 397 bombeiros profissionais e voluntários de 28 quartéis do norte do país, do litoral ao interior.
Dos bombeiros entrevistados, 309 (77,8%) eram homens e 268 (67,7%) eram voluntários. Em média, tinham 11 anos de serviço, com o mínimo de cinco meses e o máximo de 43 anos.
Desde que assumiram a profissão, foram expostos, em média, a 26 experiências traumáticas diferentes, com um intervalo entre uma e 42 experiências, segundo o estudo coordenado pelo investigador Ricardo Pinto, da ULP, e publicado na revista norte-americana “Journal of Traumatic Stress”.
Em declarações, Sandra Henriques, coautora do estudo, desenvolvido no âmbito da sua tese de mestrado na ULP, explicou que a investigação pretendeu analisar as variáveis envolvidas no desenvolvimento de sintomas de Perturbação de Stress Pós-Traumático (PTSD) e sintomatologia psicopatológica, com especial enfoque nas experiências vivenciadas pelos bombeiros.
Segundo o estudo, 48 bombeiros (12%) apresentavam sintomas de PTSD e 72 (18,8%) sintomatologia psicopatológica, não tendo sido encontradas diferenças entre bombeiros profissionais e voluntários.
Ao analisarem a relação entre as experiências traumáticas a que os bombeiros são frequentemente expostos e o desenvolvimento da doença, os investigadores concluíram que “a perceção da experiência como ameaçadora, independentemente do tipo de acontecimento ou da frequência a que se é exposto, foi o melhor preditor de stress pós-trauma”.
“Na prática, dois bombeiros podem estar a combater o mesmo incêndio, mas aquele que avalia a situação como ameaçadora, que sente a sua vida em perigo, ou a dos seus colegas, é o que corre maior risco de vir a sofrer de stress pós-trauma”, referem as conclusões do estudo divulgadas, na véspera de se assinalar o Dia Nacional do Bombeiro Profissional.
Sandra Henriques, que faz parte da direção de um quartel de bombeiros, disse que “experiências muito graves”, como “ver uma criança morta”, “corpos mutilados”, têm um “impacto muito forte” no desenvolvimento de sintomas da doença, como alterações de humor, problemas de concentração, perturbação do sono, sentimentos de raiva, culpa, medo, vergonha, lembranças intrusivas angustiantes, recorrentes e involuntárias do evento traumático.
Mas há outros acontecimentos que também ajudam a desenvolver a patologia, como chegar a um incêndio e não conseguir fazer nada, porque não há meios suficientes, ou “serem agredidos verbalmente pelos populares”, uma situação que tem impacto na autoestima e na “perceção de auto eficácia” do bombeiro e que, “infelizmente, é recorrente”, lamentou.
“Quanto mais grave percecionam a experiência maior é a relação entre a psicopatologia e o stress pós traumático”, salientou.
Os investigadores defendem que ter “mais meios técnicos e humanos” poderá “contribuir para que os bombeiros se sintam mais seguros e apoiados no exercício da sua atividade, e assim diminuir a probabilidade de desenvolverem perturbação, nomeadamente PTSD”.