Conferência “Droga e Saúde”

Apelo à Acção da Sociedade Civil

Trabalhar em conjunto para minimizar o impacto da crise nos problemas de saúde pública e individuais associados ao uso de drogas em Portugal.

A APDES, a CASO e o GAT são organizações de referência nas áreas da prevenção, redução de riscos e danos, promoção dos direitos, saúde e participação das pessoas que usam/usaram drogas e do acesso ao diagnóstico precoce e acesso aos tratamentos. Têm advogado por políticas na área das drogas em Portugal cada vez mais abrangentes e ajustadas à realidade do consumo de drogas em Portugal.

O fenómeno do consumo problemático de drogas e das epidemias associadas de VIH e Hepatite C teve, em Portugal, uma dimensão avassaladora nos últimos vinte anos do século passado.

Portugal implementou políticas de droga e saúde baseadas nos princípios humanistas, na evidência científica em intervenções de prevenção, de redução de riscos e danos e acesso aos tratamentos. Estas políticas, reconhecidas e validadas pelos sucessivos governos têm, no essencial, sido mantidas, e permitiram controlar o fenómeno e reduzir a incidência do VIH, bem como alterar padrões de uso precoce e de maior risco.

Por que razão a sociedade civil e a comunidade de pessoas que usam ou usaram drogas estão actualmente preocupadas e manifestam a importância de se encontrar uma nova liderança e consenso político, científico, técnico e social para fazer face aos desafios presentes do uso de drogas e impacto na saúde pública e individual?

À semelhança de outros países europeus, Portugal atravessa um momento difícil em termos económicos e sociais. Os momentos de crise atingem de modo desproporcionado os sectores mais vulneráveis da população e têm um impacto negativo nos:

Padrões de uso de drogas com maior risco, poli-consumos de substâncias lícitas e ilícitas, incluindo o início precoce;

Aumento da prevalência do consumo injectado, no número de recaídas e mortes por overdose, de comportamentos sexuais de risco;

Surtos de doenças transmissíveis (i.e. VIH, hepatite C, tuberculose, etc.) com custos de saúde e de recursos muito elevados.

Historicamente, os momentos de crise social aumentam o risco de movimentos políticos e sociais discriminatórios, populistas e demagógicos, que podem pôr em causa o investimento na área da prevenção, da redução de riscos, do tratamento da dependência e doenças associadas, bem como no âmbito da inclusão social e promoção da cidadania plena.

Considerando:

- Que a implementação de políticas de droga e saúde deve ser baseada na melhor evidência, no acesso universal e respeito pelos direitos humanos e no envolvimento de todos os atores, como reconhecido pela OMS, ONUSIDA, ECDC e OEDT.

- Que a cooperação entre as ONG, a comunidade de pessoas que usam ou usaram drogas e o Estado, quando reforçada, é factor-chave para a promoção da qualidade e da acessibilidade aos serviços, desde a prevenção ao tratamento;

Consideramos que é possível e necessário o consenso político sobre:

Vigilância Epidemiológica - Conhecer para Decidir. Investir na vigilância epidemiológica e risk assessment precoce sobre o uso de drogas e infecções associadas, garantindo a cooperação entre o SICAD, PN VIH/SIDA e Tuberculose e serviços;

Prevenção, Redução de Riscos e Tratamento da Dependência – Intervir para Prevenir. Garantir que são implementadas, de forma eficaz, a nível nacional as intervenções recomendadas pelo ECDC/OEDT (http://www.emcdda.europa.eu/publications/ecdc-emcdda-guidance) para reduzir e prevenir infecções nas pessoas que usam drogas em conjugação com a cobertura adequada, facilidade no acesso, incluindo o acesso a material de consumo, programas de vacinação, tratamento da dependência acesso gratuito aos programas de manutenção opiácea, disponibilização de programas de teste e avaliação da composição de novas substâncias psicoactivas promoção e literacia em saúde e prestação de serviços em função das necessidades.

Diagnóstico precoce, acesso universal aos cuidados de saúde e tratamento do VIH/SIDA, hepatites víricas, tuberculose e outras doenças frequentes – Diagnosticar para tratar. É reconhecido que o diagnóstico e o tratamento atempado de doenças transmissíveis têm grande impacto positivo na saúde pública e individual e são uma medida essencial para travar as cadeias de transmissão.

Serviços inovadores e investimento na investigação-acção – Inovar e investigar para Agir Melhor. Promover a integração profissional do trabalho de pares, a distribuição de naloxona para a prevenção de mortes por overdose, serviços integrados de consumo seguro e cuidados de saúde sócio sanitários (pelo menos em Lisboa e no Porto), investimento em programas inovadores para o consumo problemático de álcool, disponibilização de programas de tratamento com dihidromorfina e de diacetilmorfina para doentes não respondedores e investigação-acção sobre estas respostas e outras na área dos consumos problemáticos de substâncias não opiáceas.

Apelamos à Assembleia da República e especificamente à Comissão de Saúde e Grupos de Trabalho da Toxicodependência e Álcool e VIH/SIDA para que, com base nas conclusões e recomendações desta conferência, apresentem uma resolução parlamentar sobre prioridades das políticas de saúde no consumo de drogas, a exemplo da Resolução da Assembleia da República nº 161/2011 “Recomenda ao Governo a adopção de medidas tendentes ao combate à infecção por VIH/SIDA em Portugal, com vista à sua erradicação”

(http://dre.pt/pdf1sdip/2011/12/24900/0546305464.pdf).

Apelamos ao Governo para que assegure os recursos mínimos – incluindo inovação necessária – humanos, técnicos e financeiros para que garanta o direito à protecção da saúde pública e individual, o direito ao acesso equitativo aos serviços de saúde de qualidade e a proibição de qualquer tipo de discriminação à comunidade de pessoas que usam/usaram drogas.

Os organizadores da conferência aproveitam para agradecer publicamente, em primeiro lugar, ao Dr. Jorge Sampaio, Presidente de Honra da Conferência, pela contínua disponibilidade e exemplo de compromisso político e civilizacional, à Assembleia da República e todos os grupos parlamentares que acolherem e patrocinaram esta iniciativa e às diferentes instituições e especialistas que acederam em partilhar o seu conhecimento e recomendações. 

Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico e/ou Farmacêutico.
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