Opinião

Relembrar os “Direitos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida”

Atualizado: 
09/01/2023 - 14:39
A Lei n.º 31/2018 de 18 de julho, veio concretizar os direitos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida. A referida Lei estabelece um conjunto de direitos das pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida, consagrando o direito a não sofrerem de forma mantida, disruptiva e desproporcionada e prevendo medidas para a realização desses direitos. Esta Lei prevê ainda um conjunto de direitos dos familiares das pessoas doentes.

Para efeitos da presente Lei, considera-se que uma pessoa se encontra em contexto de doença avançada e em fim de vida quando padeça de doença grave, que ameace a vida, em fase avançada, incurável e irreversível e exista prognóstico vital estimado de 6 a 12 meses.

Esta legislação está atualmente um pouco esquecida, por isso importa recordar que a mesma oferece resposta a problemas bioéticos e jurídicos prementes, designadamente relacionados com a distanásia. Os principais conteúdos da referida Lei serão elencados a seguir.

Da pessoa em contexto de doença avançada e em fim de vida

As pessoas que se encontrem em contexto de doença avançada e em fim de vida, depois de informadas pelos profissionais de saúde e prestando o seu consentimento, têm direito à informação sobre aspetos relativos ao seu estado de saúde. Devem ser esclarecidas sobre a natureza da sua doença, o prognóstico estimado bem como sobre os distintos cenários clínicos e possibilidades de tratamento.

Nos casos em que seja evidente um estado confusional agudo ou a agudização de um estado prévio, os pacientes têm direito à contenção química dos sintomas através do uso de fármacos indicados. A contenção física com recurso a imobilização e restrição físicas tem caráter excecional e temporário.

Da obstinação terapêutica e diagnóstica

Outro direito agora reconhecido é o direito a serem tratadas de acordo com o seu plano de tratamento, que define objetivos de cuidados e que, previamente, foi discutido entre a equipa médica e o paciente, o qual passa a ter um papel bastante ativo no seu tratamento.

A pessoa doente é, além do mais, detentora do direito de não ser alvo de distanásia através da aplicação de medidas que prolonguem ou agravem o seu sofrimento de modo desproporcionado.

Do consentimento informado

Já no âmbito do consentimento informado ficou estabelecido que as pessoas que se encontrem em contexto de doença avançada e em fim de vida são detentoras do direito de dar o seu consentimento para as intervenções clínicas a que sejam submetidas, desde que tenham sido previamente informadas e esclarecidas pelo médico responsável bem como pela equipa multidisciplinar que acompanha as intervenções clínicas. Este consentimento deve ser prestado por escrito, exigindo-se a presença de duas testemunhas quando em causa estejam intervenções que possam pôr em causa a vida da pessoa doente.

Pode ainda o paciente, desde que devidamente informado e esclarecido, recusar, nos termos da lei, o suporte artificial das funções vitais e a prestação de tratamentos que não sejam

proporcionais ou adequados ao seu estado clínico, bem como tratamentos de qualquer natureza que não tenham como objetivo exclusivo a diminuição do sofrimento e a manutenção do conforto do doente ou que prolonguem ou até agravem esse sofrimento.

Dos Cuidados Paliativos

Estabelece a nova lei que as pessoas que sofram de uma doença avançada e em fim de vida têm direito a receber Cuidados Paliativos através do Serviço Nacional de Saúde, nos termos da Lei de Bases de Cuidados Paliativos, aqui se incluindo apoio espiritual e religioso. Considera-se também prestação de cuidados paliativos o apoio que é prestado à família do doente.

A nova Lei determina que os Cuidados Paliativos são prestados por uma equipa multidisciplinar de profissionais e podem ser prestados em ambiente hospitalar, domiciliário ou em instituições residenciais. O Estado em articulação com o Ministério da Saúde e o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social fica obrigado a dar formação adequada e apoio aos cuidadores informais da pessoa em contexto de doença avançada e em fim de vida, que recebe os cuidados paliativos em ambiente domiciliário.

A sinalização correta da pessoa doente na Rede Nacional de Cuidados é agora obrigatória, devendo também os profissionais sinalizar todos os casos de pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida que se encontrem em ambiente domiciliário sem acesso ao devido apoio profissionalizado.

Do prognóstico vital breve

Nos termos da nova lei, as pessoas com prognóstico vital estimado em semanas ou até dias, com sintomas de sofrimento não controlado pelos cuidados paliativos, têm direito a receber sedação paliativa para tratamento do sofrimento e serão monitorizados de forma regular por uma equipa de profissionais qualificada. Uma pessoa doente que se encontre em situação de últimos dias de vida tem o direito à recusa alimentar ou à prestação de determinados cuidados de higiene pessoal, respeitando-se assim o processo natural e fisiológico do doente.

Dos direitos não clínicos

A nova Lei elenca, ainda, uma série de direitos de caráter não clínico que assistem às pessoas em contexto de doença avançada e em fim de vida, como o direito a realizar um testamento vital, a nomear um procurador ou cuidador de referência para os cuidados de saúde.

Outro direito que se encontra consagrado para estes doentes refere-se ao recebimento de apoios e prestações sociais que sejam devidas a si e à sua família, tendo igualmente o direito a ser o único titular do direito à informação clínica relativamente ao seu estado de saúde.

Das decisões terapêuticas

Nas decisões terapêuticas, se isso corresponder à vontade do doente, os seus familiares ou curadores podem assisti-lo. Já quando os pacientes não estiverem no pleno uso das suas faculdades mentais e na hipótese de não serem assistidos por familiares ou cuidadores, é ao médico responsável e à sua equipa que compete tomar as decisões clínicas. Neste âmbito, devem médico e a sua equipa ouvir a família do paciente, mas sempre no exclusivo e melhor interesse do doente e de acordo com a vontade conhecida do mesmo.

Da discrepância de vontades ou decisões

A Lei determina igualmente o acesso dos doentes ou dos seus representantes legais aos Conselhos de Ética das entidades prestadores de cuidados de saúde, no caso de ocorrer uma discordância insanável entre os doentes ou os seus representantes legais e os profissionais de saúde quanto às medidas clínicas a aplicar. Já quando a assistência for prestada no ambiente domiciliário ou em entidade que não disponha de um Conselho de Ética é facultado aos doentes, ou aos seus representantes legais, o acesso aos órgãos competentes em matéria de ética da Ordem dos Médicos, da Ordem dos Enfermeiros e da Ordem dos Psicólogos.

Concluindo, a Lei n.º 31/2018 de 18 de julho - “Direitos das Pessoas em Contexto de Doença Avançada e em Fim de Vida” - pretende a consolidação de direitos das pessoas em contexto de doença avançada e fim de vida, reconhecendo-lhes expressamente o direito a não sofrer de forma disruptiva, aos cuidados paliativos e à informação sobre o seu estado clínico.

Fonte: https://dre.pt/dre/detalhe/lei/31-2018-115712240

 

Autores:

Maria Helena Junqueira - Enfermeira Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica – Serviço de Medicina do Hospital de Pombal – Centro Hospitalar de Leiria EPE, [email protected]

Pedro Quintas - Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária na área de Enfermagem de Saúde Familiar - Unidade de Cuidados na Comunidade Pombal, [email protected]

Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
Freepik