As perturbações de ansiedade na grávida
A ansiedade é algo que todos nós experienciamos no nosso dia a dia e ao longo das nossas vidas. Sentir medo, tensão ou preocupação – os estados que caracterizam a ansiedade – é normal, funcionando como espécie de motor que nos faz avançar perante o perigo ou o desconhecido. Na medida certa, este é um sentimento essencial para a nossa evolução. O problema é quando este estado persiste ao longo do tempo - habitualmente por mais de três meses -, em determinados contextos, e interfere negativamente com a capacidade de desenvolvermos as nossas atividades diárias, infligindo um sofrimento físico e/ou emocional significativo. Quando isto acontece, estamos perante uma perturbação de ansiedade.
Para além da dificuldade em gerir as suas emoções, a pessoa que sofre de ansiedade está em constante estado de alerta, convivendo com elevados níveis de stress. Stress esse que pode despoletar uma reação física difícil de controlar. Palpitações, dores no peito, falta de ar, suores frios, tensão muscular ou insónia são alguns dos sintomas físicos associados às perturbações de ansiedade.
As fobias, os ataques de pânico, a perturbação de ansiedade generalizada, o stress pós-traumático, ou a perturbação de social são consideradas Perturbações de Ansiedade. Apesar de diferentes, todas têm em comum um sentimento de ansiedade exacerbado.
O período perinatal pode despoletar ou intensificar uma perturbação de ansiedade
O que para muitas mulheres é considerado um período rico em experiências positivas, para outras a gravidez pode ser o gatilho para o desenvolvimento ou a exacerbação de uma perturbação de ansiedade.
Apesar de este ser um tema menos abordado e menos estudado, quando comparado com a depressão, alguns estudos dão conta de que cerca de 21% das grávidas apresentam sintomas de ansiedade e que destas, mais de metade mantêm a sintomatologia no período pós-parto. Algumas convivem ainda com depressão.
Entre os poucos estudo realizados, foi possível identificar os tipos de perturbação de ansiedade mais prevalentes durante esta fase da vida: perturbação de ansiedade generalizada, ansiedade/fobia social e perturbação obsessivo-compulsiva.
A história pessoal de depressão ou ansiedade, história familiar de perturbações de ansiedade, baixo nível económico, baixa autoestima, gravidez não planeada ou não desejada, bem como a existência de conflitos entre o casal, são apontados como os principais fatores de risco. No entanto, não podemos esquecer que durante este período a mulher está sujeita a enormes alterações fisiológicas e seus efeitos podem condicionar o desenvolvimento destas perturbações.
Perturbação de ansiedade generalizada
De acordo com os especialistas, não é fácil diagnosticar este tipo de perturbação pelo facto de ser normal, durante a gravidez, a mulher estar mais ansiosa e preocupada, não só com a sua saúde como com a do seu bebé.
No entanto, quando existe ansiedade ou preocupação excessiva, de forma persistente e durante mais de metade dos dias, é provável que sofra deste tipo de perturbação.
Habitualmente, este estado faz-se acompanhar de inquietação, fadiga, dificuldade de concentração, irritabilidade, tensão muscular, insónia e, em alguns casos, náuseas e/ou diarreia.
O seu diagnóstico deve consistir numa avaliação cuidadosa e multidisciplinar.
Ansiedade Social
Estima-se a ansiedade social afete entre 2,3% a 7% da população, no entanto, no período perinatal, este quadro clínico tem sido pouco estudado. Um estudo reportou, contudo, uma incidência de 4,1% no período pós-parto, diminuindo progressivamente ao longo do ano.
Quem sofre de ansiedade social sente nervosismo ou desconforto em situações sociais, habitualmente devido ao medo de causar má impressão, de ser julgado, criticado ou avaliado negativamente por outras pessoas. Deste modo, e embora este quadro possa variar da pessoa para pessoa, há a tendência para evitar as situações sociais ou enfrentá-las com elevados níveis de stress.
Durante a gravidez, as preocupações com a alteração da imagem corporal, com a maternidade ou com o julgamento dos outros em relação ao seu desempenho como mãe, podem levar a grávida a evitar o contacto social. Embora os traços da personalidade possam representar um fator de risco (de um modo geral, a introversão, timidez ou perfeccionismo estão mais associados a este quadro clínico), outros fatores como ser muito jovem, solteira, ter uma situação económica precária e um nível educacional baixo, parecem precipitar esta perturbação.
Perturbação Obsessivo-Compulsiva
A perturbação obsessivo-compulsiva é uma patologia psiquiátrica relativamente comum, estimando-se que atinja cerca de 2% da população. Caracterizada por obsessões recorrentes (como pensamentos e imagens intrusivos, indesejados e incontroláveis) e comportamentos ou rituais repetidos de forma compulsiva, estima-se que a sua prevalência varie entre 0,2% e 5,2% durante a gravidez.
Neste caso, as obsessões podem ser pensamentos ou imagens mentais relacionadas com o bebé e podem ir desde preocupações com o seu bem-estar até a impulsos de o prejudicar.
De acordo com os especialistas, algumas mulheres reportam ideias de que o bebé morre enquanto dorme, que o afogam ou atiram de um lugar alto. No entanto, estes pensamentos obsessivos agressivos são mais frequentes no pós-parto.
Por outro lado, as compulsões mais frequentes são a limpeza e a confirmação. Com medo de ficar contaminada com microrganismos ou químicos, a grávida realiza rituais de limpeza e desinfeção. Depois do bebé nascer, é frequente evitar o bebé para não o contaminar com germes ou confirmar repetidamente se está a respirar.
História de aborto espontâneo ou de complicações gestacionais e história familiar de Perturbação Obsessivo-Compulsiva apresentam-se como os principais fatores de risco para o aparecimento deste quadro clínico durante a gravidez.
No pós-parto parece estar associada a quadros ansiosos ou depressão.
Outras fobias
A fobia é um tipo de perturbação da ansiedade caracterizado por medo ou aversão persistente a um objeto ou uma situação. Durante o período perinatal (período entre as 22 semanas de gestação e 7 dias após o nascimento), existem dois tipos de fobia que importa discutir: a tocofobia e a fobia focada na criança.
Embora existam poucos estudos sobre fobias específicas na grávida, estima-se que a tocofobia afete 5,5% das grávidas. Caracterizada por um medo intenso do parto, esta fobia pode levar a mulher a evitar uma gravidez, a abortar ou a exigir uma cesariana. Em alguns casos pode surgir associada à depressão ou ao stress pós-traumático.
Entre os fatores que podem influenciar esta fobia estão a experiência prévia de um parto ou um exame ginecológico traumático, história de abuso físico ou sexual e mitos associados ao nascimento.
Quanto à fobia focada no bebé, esta traduz-se num medo exagerado no que toda à saúde da criança. De acordo com os especialistas, o medo mais frequente é o da síndrome de morte súbita do lactente. Nestes casos, a mãe verifica múltiplas vezes se o filho está a respirar podendo acordá-lo 20 a 30 vezes durante a noite para verificar se está vivo.