Alteração no ritmo da fala

Perturbação da fluência: saiba como lidar com a gaguez

Atualizado: 
22/10/2019 - 10:25
Nos últimos meses tem-se ouvido falar muito sobre gaguez, ou mais correctamente sobre a perturbação da fluência. Mas afinal o que é esta perturbação, como se manifesta e como devemos lidar com ela?

Em Portugal, a perturbação da fluência afecta cerca de 1% da população adulta e segundo a Organização Mundial da Saúde é definida como uma alteração no ritmo da fala, na qual o indivíduo sabe exactamente o que deseja dizer contudo, é incapaz de o fazer. O discurso apresenta prolongamentos, bloqueios, palavras partidas e/ou repetições que tanto podem ser de sons ou de sílabas de uma palavra. Para além destes sinais, o discurso pode ter associado movimentos involuntários da face e do corpo. Estes movimentos podem ser piscar de olhos, levantamento dos ombros, balançar do corpo e/ou tremor à volta dos lábios, por exemplo, contudo, ressalva-se que estes movimentos não devem ser confundidos com tiques.

Esta perturbação não se manifesta da mesma maneira em todas as pessoas. Não há assim uma gaguez. É, ainda, característico da gaguez a sua variabilidade, ou seja, a mesma pode variar durante o dia, a semana ou o mês.

Actualmente, sabe-se que a etiologia pode ser hereditária, isto é, genética, neurológica e psicossocial, esta última relacionada com a pressão exercida pela família após o surgimento da “gaguez”, por exemplo, para que a pessoa fale corretamente, desencadeando emoções negativas como ansiedade, medo e stress no momento de falar. Sabe-se, ainda, que a causa genética é a causa mais frequente, uma vez que 60% das pessoas que gaguejam tem um familiar com gaguez. A causa neurológica está relacionada com o aparecimento da gaguez após um Acidente Vascular Cerebral, Traumatismo Cranioencefálico ou demência, por exemplo.

É importante ressalvar que a insegurança, timidez, baixa autoestima, frustração, ansiedade, estado depressivo e pressão exercida pela família para que a pessoa fale correctamente não são as causas, mas as consequências de gaguejar sendo que desencadeiam emoções negativas.

A perturbação da fluência pode surgir em qualquer idade, dependendo da sua etiologia. Contudo, estudos recentes indicam-nos que 5% da população infantil, entre os 2 e os 5 anos, é comum existir uma gaguez transitória. Ou seja, a criança apresenta alguns sinais já referidos e estes não devem durar mais de 6 meses, nesse período “máximo” a gaguez deverá desaparecer em dois terços na percentagem acima indicada. No caso em que os sinais não desaparecem, estamos perante uma gaguez crónica e esta deve ser avaliada e intervencionada por um Terapeuta da Fala. A intervenção precoce é essencial nestes casos.

Infelizmente não existe cura para esta perturbação contudo, um Terapeuta da Fala com experiencia na área tem conhecimentos e competências para ensinar métodos e técnicas que facilitem a fluência do discurso em qualquer situação do dia-a-dia, assim como eliminar o medo de comunicar perante determinados interlocutores e/ou situações sociais.

Há comportamentos a evitar quando lidamos com uma pessoa que gagueja, desta forma, não diga à pessoa para “falar mais devagar” ou para “ter calma”. Dizer à pessoa que gagueja para “respirar fundo” ou para “pensar antes de falar” não a ajuda. Trata-se de um mito. Estes “conselhos” fazem com que a pessoa se sinta mais consciente das disfluências e quando tenta colocar em prática os “conselhos” que ouve, fica frustrada porque não resultam.

Não termine as palavras nem fale pela pessoa; espere a sua vez para falar e ouça o outro, uma vez que para a pessoa que gagueja é mais fácil falar quando tem poucas interrupções e a atenção dos outros. Devemos sempre manter o contacto visual e esperar que a pessoa acabe de falar. Não devemos interromper a pessoa que gagueja porque muitas vezes tal pode levá-la a voltar atrás no assunto, demorando mais tempo e causando frustração. Fale com a pessoa com calma, fazendo pausas frequentes. Mostre que está atento ao conteúdo da mensagem e não à forma como é dita. Neste ponto ressalvo para a necessidade do cuidado com a expressão facial quando estamos a falar com uma pessoa que gagueja, pois esta pode subentender que estamos desinteressados no assunto levando à inibição de comunicar. Por fim, não faça da gaguez algo de que se deva ter vergonha.

Há vários mitos associados a esta perturbação, sendo o mais comum o da causa ser um susto, sendo que não há qualquer evidência científica para tal. Como já mencionado, a sua etiologia pode ser hereditária, neurológica ou psicossocial.

Quer estejamos perante uma gaguez transitória ou crónica é muito importante que todas as pessoas que convivem com as crianças e/ou adultos com gaguez entendam que uma atitude positiva origina mudanças durante o processo comunicacional. Mudança de comportamentos por parte de todos, equipa escolar e família, é essencial para o sucesso da intervenção.

Autor: 
Lina Marques de Almeida – Terapeuta da Fala
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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