Paralisia Cerebral: principais problemas nutricionais
A paralisia cerebral não é uma doença. Ela é, na verdade, um conjunto de sintomas resultantes de malformações cerebrais ou danos às partes do cérebro que controlam os movimentos musculares.
Algumas crianças têm perturbações ligeiras, quase impercetíveis, que as tornam desajeitadas a andar, falar ou usar as mãos. Outras são gravemente afetadas com incapacidade motora grave, impossibilidade de andar e falar, sendo dependentes nas atividades de vida diária. Não raras as vezes, surgem problemas de mastigação ou deglutição, fazendo com que os problemas nutricionais sejam bastante frequentes nestas crianças, se não houver alguns cuidados.
Quais os problemas nutricionais mais frequentes?
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Baixo peso
O tipo de lesão no cérebro e a gravidade da paralisia cerebral podem influenciar o movimento e função muscular essenciais para a ingestão de alimentos. Fatores como a falta de controlo oro-motor, dificuldade ou ausência de reflexo de mastigação, dificuldades de deglutição, falta ou diminuição do reflexo de sucção, vómitos frequentes, hipertonia com postura corporal incorreta ou hipotonia são alguns dos responsáveis pelas dificuldades na alimentação.
Além disso, os elevados gastos energéticos, devido a uma anormal tonicidade muscular, estão também associados ao baixo peso.
Em casos mais graves, estes fatores podem conduzir a um estado de desnutrição. Deste modo, é essencial, por um lado, fazer mais refeições ao longo do dia, embora mais pequenas (com menos quantidade de alimentos), mas aumentando a sua densidade calórica. Deve optar-se, por isso, a alimentos nutritivos, com gordura de elevada qualidade e alta densidade energética, como o azeite, mel, leite em pó, frutos secos inteiros ou triturados, por exemplo.
Os alimentos pouco saudáveis e muito calóricos, como bolachas, chocolates, produtos de pastelaria e confeitaria, gomas ou rebuçados, estão desaconselhados.
A suplementação alimentar deve ser equacionada, sempre que estas estratégias falhem. Em casos mais graves, pode ser necessária a colocação de uma sonda nasogástrica ou gastrostomia endoscópica percutânea (GEP/PEG).
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Excesso de Peso
O excesso de peso na pessoa com Paralisia Cerebral surge de um desequilíbrio entre a energia ingerida e a energia gasta nas atividades realizadas no dia-a-dia, estando associado a diversos fatores, nomeadamente, a um menor gasto de energia, devido à limitada atividade física, à baixa tonicidade muscular, ao crescimento atípico e a situações de compensação com alimentos de elevada densidade energética ou ingestão alimentar compulsiva.
Os erros alimentares devem ser corrigidos, por isso a Federação das Associações portuguesas de Paralisia Cerebral, deixa alguns conselhos:
- Não sair de casa sem tomar um pequeno-almoço saudável porque este irá fornecer-lhe a energia suficiente para iniciar o dia, ajudando a regular o apetite nas refeições seguintes;
- Não passar mais de 3 horas sem comer, fracionando as refeições ao longo do dia;
- Iniciar as refeições principais com uma sopa só de legumes;
- Controlar a ingestão alimentar, optando por porções menores, podendo servir a refeição em pratos de sobremesa, e não repetir a refeição (para controlar esta situação evitar levar para a mesa o tacho ou a travessa);
- Comer sempre fruta crua como sobremesa nas refeições principais, evitando fruta cozida e sobremesas doces. Em caso de dificuldade de mastigação, a fruta deverá ser passada, podendo ser previamente aquecida no micro-ondas, mas tendo sempre o cuidado de esta estar crua;
- Tornar a água a bebida de eleição, evitando o consumo de refrigerantes e sumos concentrados;
- Seguir os princípios da Roda dos Alimentos, para manter uma alimentação saudável, equilibrada e variada que assegure uma vida sã;
- Não esquecer que é importante que a família seja um exemplo “de alimentação saudável”;
- No momento da compra, optar sempre por alimentos saudáveis, evitando ter em casa alimentos muito calóricos (produtos processados e embalados, refrigerantes, bebidas açucaradas, bolachas açucaradas ou com chocolate, fast-food, entre outros...);
- Sempre que possível incentivar a prática de exercício físico, adaptada às limitações, dado que este é um excelente aliado de uma alimentação saudável.
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Refluxo Gastroesofágico
O refluxo gastroesofágico é bastante frequente nos doentes que utilizam cadeira de rodas no entanto, este problema pode ser resolvido ou minimizado com recurso a algumas mudanças na alimentação, privilegiando alimentos de textura suave e evitando o consumo de alimentos e bebidas muito quentes ou frias e que possam contribuir para um quadro de azia, como álcool, cafeína, bebidas gaseificadas, chocolate, frutas e sumos cítricos, alimentos gordurosos e muito condimentados, menta e hortelã.
É também importante evitar o uso de roupa e cintos apertados na zona abdominal, bem como ter em atenção o posicionamento. Durante e após a refeição, o indivíduo deverá estar reclinado e, quando deitado, a cabeceira da cama deverá estar ligeiramente levantada.
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Obstipação
A obstipação é um problema bastante comum na PC, dada a presença de hipotonicidade, que resulta na menor motilidade intestinal. Além disso, a medicação utilizada e o baixo consumo de fibras e de água contribuem, igualmente, para o agravamento desta situação.
“Uma alimentação rica em fibras alimentares, presentes em hortícolas, fruta crua, cereais e sementes (tais como a linhaça, chia e aveia), e a elevada ingestão de água ao longo do dia são essenciais para a resolução ou minimização de problemas de obstipação. É, ainda, recomendada a ingestão de líquidos (chá, água), a uma temperatura tépida, todas as manhãs em jejum”, explicam os autores do guia sobre a matéria divulgado pela Federação das Associações portuguesas de Paralisia Cerebral.
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Desidratação
A desidratação é muito frequente, em caso de Paralisia Cerebral. A incapacidade de comunicar a sensação de sede, a dificuldade em controlar a saliva ou a disfagia são alguns dos fatores que condicionam esta situação.
A urina muito concentrada (escura), com odor forte e em pouca quantidade denunciam as situações de desidratação, por isso esteja atento!
Entre algumas estratégias para manter o aporte hídrico, destacam-se:
- Aromatizar a água com limão, laranja, cevada ou algumas gotinhas de groselha;
- Optar por chás (exceto os que contêm cafeína – chá verde e chá preto) ou infusões de ervas;
- Preparar sumos de fruta natural com adição de água;
- Transportar diariamente uma garrafa, de forma a criar o hábito de consumo de água ao longo do dia, sendo possível desta forma controlar as quantidades ingeridas;
- Em situações de disfagia, espessar os líquidos usando espessantes ou recorrer a água gelificada.
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Disfagia
A disfagia consiste numa alteração do processo de deglutição, podendo ser orofaríngea ou esofágica, caracterizando-se pela dificuldade da ingestão de alimentos líquidos ou sólidos. No caso da Paralisia Cerebral, esta situação é consequência de uma lesão na área do cérebro que controla a função dos músculos responsáveis pelo correto processo de deglutição, sendo mais predominante a dificuldade em deglutir líquidos.
A disfagia é marcada pela falta de coordenação entre a deglutição e a respiração, ou seja, durante a deglutição, as vias respiratórias que deveriam estar fechadas, encontram-se parcial ou totalmente abertas. Desta forma, existe um grande risco de os alimentos serem aspirados para os pulmões, em vez de seguirem o seu trajeto natural até ao estômago, podendo causar infeções respiratórias e pneumonias recorrentes.
Para minimizar este problema poderemos recorrer a várias estratégias:
- Realizar as refeições num ambiente calmo, com tempo e sem distrações;
- Procurar colocar a pessoa sentada numa postura confortável, mantendo a cabeça ligeiramente reclinada (com apoio, se necessário);
- Nunca dar a refeição com a pessoa na posição deitada;
- Em casos de disfagia para líquidos, poderá recorrer-se a produtos como espessantes ou água gelificada. O espessante é uma substância em pó, sem qualquer sabor, que poderá ser adicionada a qualquer alimento líquido, quente ou frio (sopa ou água, por exemplo), e cujo objetivo é engrossar o alimento em questão, facilitando, deste modo, a sua ingestão e minimizando o risco de engasgamento. Os espessantes permitem que se obtenha a consistência mais apropriada ao grau de disfagia, ou seja, consoante a quantidade adicionada ao líquido, podemos obter a consistência de néctar, mel ou pudim, sendo esta última utilizada em casos mais graves.