«O estado de imunossupressão ou certas infeções crónicas» podem favorecer o desenvolvimento de Linfomas Cutâneos
Trata-se de um tipo de cancro raro e do qual a grande maioria da população nunca ouviu falar. Talvez por isso, este seja um tipo de patologia facilmente desvalorizado ou subdiagnosticado. De que falamos quando estamos a falar de Linfomas Cutâneos?
Muito frequentemente os linfomas cutâneos são patologias indolentes, com lesões que vão flutuando e que não são patognomónicas – facilmente são confundidas com outras patologias dermatológicas; também podem ter apresentações atípicas. O diagnóstico é complexo e requer experiência em todos os seus aspetos, desde saber suspeitar, saber onde biopsar até analisar e interpretar as diversas amostras necessárias para diagnóstico. É geralmente aceite na comunidade científica a dificuldade no diagnóstico, particularmente pelo comportamento destas doenças, mas também pela complexidade da interpretação. O atraso no diagnóstico prende-se mais com estes aspetos, geralmente, na minha experiência, os médicos Dermatologistas estão alertas para esta hipótese. É preciso, no entanto, dirigir-se a e ser acompanhado por um Dermatologista quando há lesões persistentes.
É possível determinar as causas associadas aos Linfomas Cutâneos?
As causas do aparecimento dos linfomas cutâneos não são conhecidas. Não há evidência de hereditariedade. Há, no entanto, situações que sabemos que favorecem o aparecimento destas doenças, como o estado de imunossupressão ou certas infeções crónicas.
Em matéria de idade e género, quem está em risco de desenvolver este tipo de tumores? Existem fatores de risco?
A grande maioria dos doentes com linfoma cutâneo se encontram na 6ª e 7ª década de vida, mas estas doenças podem aparecer em qualquer idade, inclusivamente em crianças. De forma geral, são ligeiramente mais frequentes nos homens e parecem ser mais frequentes em indivíduos de raça negra do que em caucasianos. Para além da imunossupressão e algumas infeções crónicas, o consumo tabágico e etanolico, tal como a exposição a tóxicos e poluição parecem estar associados a uma maior incidência de linfomas cutâneos.
Sabendo que existem dois grandes grupos de Linfomas Cutâneos e que os mais frequentes são os Linfomas Cutâneos de células T, a que sinais devemos estar atentos? Quais as principais manifestações clínicas dos LCCT?
As manifestações são diversas. A maioria destas doenças se manifestam num estádio precoce, envolvendo apenas a pele, frequentemente com manchas avermelhadas e placas localizadas, com descamação e muitas vezes com prurido associado. Podem ainda aparecer nódulos ou tumores da pele e pode haver envolvimento sistémico - de sangue, gânglios ou outros órgãos – com sintomas que dependem do órgão ou local envolvido. Nestas situações mais avançadas pode ainda haver uma degradação do estado geral, perda de peso, febrícula.
Quais os tipos mais frequentes de LCCT? Qual o prognóstico de cada um destes tipos de linfoma cutâneo?
Dentro dos Linfomas Cutâneos de células T, a Micose Fungoide é a entidade mais frequente, correspondendo a 2 terços destas doenças. A sua forma mais avançada, a síndrome de Sezary, é uma entidade mais rara, que se pode apresentar desde o início ou evoluir de um estadio mais precoce.
Trata-se de uma doença crónica, geralmente sem cura, mas os estadios precoces desta doença apresentam na sua maioria um excelente prognóstico, com relativamente pouco impacto na sobrevivência. No entanto, um quarto pode vir a progredir para estádios mais avançados, com prognóstico menos favorável, que vária de acordo com o estadiamento, características e comportamento da doença ao longo do seguimento.
No que diz respeito ao seu diagnóstico, podem passar anos entre o aparecimento dos primeiros sintomas e a sua confirmação, porquê? Quais são os principais desafios associados a esta área?
Como já referido, as manifestações são flutuantes, muitas vezes mimetizando outras patologias nos estádios mais precoces. Nestas alturas da evolução da doença há aspetos muito frequentemente inespecíficos ou muito frustres nas biópsias de pele, que trazem um grau significativo de dificuldade à interpretação. Ademais, as técnicas necessárias para diagnóstico são complexas e não estão amplamente disponíveis nos laboratórios. Para além de experiência, o diagnóstico requer uma interpretação conjunta da clínica e dos resultados de laboratório e uma boa comunicação entre as especialidades envolvidas.
Que implicações tem o tempo que decorre entre o início das manifestações clínicas da patologia e o seu diagnóstico no prognóstico? Existem complicações associadas aos LCCT?
Nos estádios precoces o atraso no diagnóstico não tem implicações prognósticas. De forma geral, nestes estádios não há qualquer evidência que o tratamento atrase a eventual evolução para um estadio mais avançado. A principal implicação prende-se com o controlo sintomático. Nos estadios mais avançados o atraso diagnóstico pode, de facto, permitir o aparecimento de lesões de vários órgãos e a degradação do estado geral, que dificulta ocasionalmente o tratamento, para além do próprio sofrimento. Geralmente, nas situações de doença mais avançada, por ter manifestações mais pronunciadas, o atraso diagnóstico é menor.
Quais as especialidades médicas essenciais para o diagnóstico e tratamento desta doença?
Ao longo do seguimento destas doenças é essencial o seguimento por um dermatologista e, particularmente em estádios mais avançados, por um hematologista. São estas as duas especialidades clínicas que gerem o seguimento, mas a equipa implicada é muito mais vasta e passa pelos especialistas de anatomia patológica, técnicas de laboratório, enfermagem, radioterapia, psicologia clínica. Tratando-se de uma doença crónica, todas estas vertentes são importantes ao longo do seguimento e não apenas em situações pontuais e apoiam nas decisões e terapêutica de forma repetida.
Após o diagnóstico, há cuidados especiais a ter?
Os cuidados com a pele são essenciais, mas é importante também cuidar da saúde do modo geral, ter um estilo de vida saudável e evitar as situações de stress – é conhecido o impacto negativo do stress no comportamento destas doenças. A comunicação com a equipa que segue estes doentes é essencial, tal como a adesão às terapêuticas.
No âmbito deste tema, que mensagem gostaria de deixar?
Apesar de se tratar de doenças crónicas e com grande impacto na qualidade de vida, pelas manifestações, pela sua vertente estética e pela necessidade de acompanhamento prolongado, há cada vez mais terapêuticas e desenvolvimentos na área dos cuidados destas doenças. Pela complexidade, é importante o seguimento por equipas de profissionais especializados e, sempre que possível, particularmente nos estádios mais avançados, é preferível o seguimento em centros de referência para estas patologias.