O contributo das ferramentas digitais em plena Pandemia
Numa altura em que os hospitais estão sobrecarregados e os profissionais de saúde esgotados, de que forma o desenvolvimento de novas ferramentas digitais podem contrariar este cenário? De que modo podem contribuir para uma melhor resposta dos serviços de saúde?
A Medtronic sempre pautou a sua atividade pelo trabalho próximo com as autoridades de saúde, hospitais, profissionais de saúde e utentes. O desafio que estamos a enfrentar obriga as instituições a adotar soluções tecnológicas a um ritmo jamais visto para suprir algumas das necessidades do sector da saúde.
A área de IHS (Integrated Health Solutions) da Medtronic tem vindo a redefinir a sua proposta de valor, tirando maior partido das novas ferramentas digitais em duas frentes: do lado da oferta, através do aumento a capacidade de resposta e, do lado da procura, através da alteração da forma de prestação de cuidados.
As soluções para comunicação à distância com doentes, a digitalização de percursos clínicos e a consequente redefinição do modelo de prestação de cuidados têm permitido minimizar as deslocações dos utentes ao hospital, facilitar a adoção de novos protocolos e reduzir tempos médios de internamento.
Numa outra frente, as soluções visam apoiar a gestão no esforço para aumentar a capacidade existente e maximizar a utilização da capacidade já disponível. A título de exemplo, e numa área tão crítica para o hospital como a rentabilização dos blocos operatórios, esta crise veio acentuar as dificuldades existentes de resposta e de gestão das listas de espera cirúrgicas. Com o apoio de algoritmos de inteligência artificial, é possível já hoje, a alguns hospitais, tomar decisões tendo por base diferentes cenários que balanceiam o cumprimento de objetivos, a curto e médio prazo e os recursos disponíveis, assim como, estimar os custos associados a cada cenário.
No que diz respeito às Integrated Health Solutions, que ferramentas foram desenvolvidas especificamente para este período excecional? Quem as utiliza (por exemplo, que unidades hospitalares as utilizam) e que resultados têm vido a apresentar?
Durante a crise sanitária decorrente da 1ª vaga, em Portugal, a Medtronic desenvolveu um conjunto de mecanismos de capacitação de doentes, cuidadores e profissionais de saúde. Em colaboração com a Direção Geral de Saúde e os Hospitais, implementou uma solução de telemonitorização e educação dos doentes à distância, que permite que as pessoas com diabetes só necessitem de se deslocar ao hospital em caso de urgência. Nesta área, a prioridade é empoderar os doentes, dotando-os de ferramentas que os possam tornar o mais autónomos possível na gestão da sua doença, em particular, daqueles que usam bomba de insulina.
A área de IHS desenvolveu, especificamente para este período, uma solução para monitorização remota de doentes com COVID-19 em isolamento domiciliário. Esta solução permitiu, aos hospitais que a adotaram, reduzir em 75% o número de chamadas realizadas diariamente, seguindo através de uma ferramenta digital o mesmo número de doentes. Duas vezes por dia, através de um algoritmo clínico, são analisadas as respostas dos doentes, sendo esta avaliação disponibilizada aos profissionais de saúde e alertando-os, sempre que se verifique um agravamento da condição clínica. A taxa de adoção desta ferramenta pelos doentes chegou aos 90%.
Também durante o estado de emergência, foram facultadas gratuitamente aos hospitais e profissionais de saúde nacionais, duas ferramentas de comunicação que facilitam o dia-a-dia e a coordenação assistencial entre os profissionais de saúde. A plataforma MEDCOM e o acesso a reuniões virtuais Cisco WebEx pretendiam facilitar a comunicação, a coordenação e a tomada de decisão entre profissionais de saúde que estavam à distância, e assim minimizar o impacto que a situação estava a causar na continuidade dos tratamentos de doentes agudos.
Quais as principais vantagens a nível socioeconómico?
Quando referi há pouco que a área de Integrated Health Solutions tem vindo a redefinir a sua proposta de valor para tirar partido das novas ferramentas digitais, o objetivo subjacente é apoiar hospitais e autoridades de saúde a reduzir o gap existente entre a procura de cuidados de saúde e a capacidade disponível. Estas ferramentas tecnológicas permitem criar canais de comunicação, iguais para todos, e acelerar o acesso sempre que necessário de uma forma dirigida e informada.
Destacaria, no entanto, o papel crucial que as soluções digitais podem ter na educação em saúde e na capacitação dos portugueses. Hoje é possível ter acesso a um conjunto informação de saúde que pode ajudar cada utente a tomar decisões para prevenir doenças, cuidar de si durante a doença ou aprender a viver com a sua doença. Para tal as soluções têm de refletir que dados devem ser medidos face aos objetivos que queremos alcançar, como tratar os dados e como os incorporar no processo de prestação de cuidados de saúde, presente e futuro, através da sua utilização para I&D.
Concluindo, são ferramentas que podem ajudar a reduzir as desigualdades existentes na sociedade, promovendo a educação, o acesso, a eficiência e a eficácia.
No que diz respeito à telemonitorização de doentes, embora o conceito seja relativamente “recente” no país, a verdade é que são vários os projetos que apresentam um balanço muito positivo com a sua introdução. Em plena pandemia, quais os doentes que mais beneficiaram da telemonitorização?
Nesta fase de pandemia, as soluções que existiam previamente em funcionamento, mesmo que incipiente, são aquelas que mais valor deram ao sistema numa primeira fase. Por exemplo, as teleconsultas. O sucesso da implementação destas, e de uma forma geral, de novas tecnologias, está associado a um sentimento de urgência e de abertura, como o que surge durante uma crise. O envolvimento de todos e o espírito de equipa têm permitido criar paradigmas de prestação de cuidados distintos, reescrever funções e definir novos mapas de responsabilidade de profissionais de saúde, doentes e cuidadores.
As soluções de monitorização de doentes com dispositivos médicos são hoje entendidas por todos como o futuro, sejam elas para seguimento de doentes cardíacos, bombas de insulina, para gestão da dor crónica ou para o envio da informação de uma pill cam, são ferramentas que melhoram os outcomes clínicos e reduzem a necessidade de deslocações físicas ao hospital.
Na sua opinião estas soluções vieram para ficar? Tendo em conta que uma fatia grande da população que ainda não tem acesso a tecnologias de informação, ou não tem conhecimento suficiente para as utilizar, o que pode ser feito para uma distribuição mais equitativa destes serviços? Neste sentido, que áreas ainda podem ser melhoradas?
Ao nível hospitalar estas soluções terão uma evolução significativa e tornar-se-ão, em breve, standard de prestação de cuidados. Hoje estão ao nível da patologia, associadas a um dado percurso clínico ou a uma fase deste percurso.
De futuro, permitirão multiplicar os mesmos benefícios “a plataformas hospitalares”, por exemplo, sendo generalizadas a todos os pré e pós-operatórios, eliminando as tarefas que não geram valor e dirigindo o esforço dos profissionais para os momentos onde a sua diferenciação é necessária.
Por exemplo, muitos dos doentes com um CDI (dispositivos cardíacos implantados) não necessitam de se deslocar a um hospital apenas para verificar a informação do seu dispositivo. Esta informação pode ser acompanhada diariamente, gerando alertas para o doente e para os profissionais de saúde sempre que se justifique. O seguimento do doente passa a ser contínuo e não pontual, as consultas ocorrerem sempre que se justificam para aquele doente e não de acordo com um calendário genérico. Substituem-se visitas ao hospital por comunicações remotas, algoritmos de triagem e alerta contínuos e, eliminam-se tarefas administrativa, como o agendamento de consultas desnecessárias, ou a transferência de informação de dispositivos para o processo clínico do doente, que passa a ser realizada automaticamente.
Calculo que existam regiões do país que beneficiariam do acesso a estas ferramentas…
Certamente que, quanto mais difícil for o acesso físico de uma dada população à rede de unidades de prestação de cuidados de saúde, maior será o impacto que a continuidade que estas soluções, digitais ou remotas, permitem. Quando o acesso é digital, o local onde se encontra o doente pode deixar de ser uma variável a ter em conta para o seguimento.
Para terminar, e no âmbito deste tema, que mensagem gostaria de deixar?
Neste contexto tecnológico e digital, gostaria de sublinhar, a componente humana, a confiança, empatia e compaixão que caracteriza e vincula a relação entre os profissionais de saúde e os utentes.
As soluções tecnologias que abordamos têm no contexto da prestação de cuidados de saúde um desafio que vai muito além da eficiência. A complexidade inerente a um contexto onde o equilibro entre a tecnologia e a vertente humana são fundamentais. João Lobo Antunes referiu que “Apesar do progresso, e ainda mais numa especialidade altamente tecnológica como a minha, nunca vi, não conheço arma nenhuma, de qualquer natureza, seja medicamentosa seja instrumental, que faça anular a necessidade da compaixão”.
E no equilíbrio entre as duas componentes estará o futuro… porque é também nesta harmonia que nós na Medtronic conseguimos alcançar a nossa missão de aliviar a dor, restabelecer a saúde e prolongar a vida dos doentes.