Opinião

Intervenção do enfermeiro especialista em saúde mental e psiquiatria em UCCI de Saúde Mental na Infância e Adolescência

Atualizado: 
01/04/2022 - 10:30
A doença mental é responsável por provocar profundas e persistentes alterações no funcionamento da pessoa, repercutindo-se nas mais variadas áreas da sua vida, pelo que requer múltiplas e variadas intervenções. Para além do forte impacto que tem no sofrimento individual, com a consequente perda da qualidade de vida, reflete-se, inevitavelmente, nos grupos de pertença e subsistemas em que insere a pessoa doente, com o destaque na família em que se encontra inserido.

A infância e a adolescência é uma etapa do ciclo vital em que os jovens estão mais vulneráveis e a passagem da puberdade para a adolescência também implica algumas alterações a nível emocional e psicológico. Este contexto, associado a uma doença mental e ao papel parental comprometidos em grande parte dos jovens, desenvolve nestes uma carga emocional de difícil compreensão e adaptação.

A estratégia de atuação na recuperação do jovem com doença mental, direciona a prática no sentido da prestação de cuidados que promovam os processos de empowerment e recovery. Ao jovem com doença mental devem ser prestados cuidados que fomentem a sua integração na sociedade, tendo por finalidade a reabilitação e a inserção social.

A minha abordagem enquanto enfermeira especialista em saúde mental e psiquiatria (EESMP) na unidade de cuidados integrados em saúde mental na infância e adolescência da residência de treino de autonomia do tipo A (UCCI-SM IA RTA) da RECOVERY IPSS, fundamenta-se em 2 pilares, que são a personalização e humanização dos cuidados, dado que cada jovem é único e irrepetível.

Nos jovens que ingressam na RTA é utilizado um Plano Individual de Intervenção (PII), sendo este reavaliado trimestralmente. Nesse PII é realizado um levantamento das necessidades de intervenção, onde se procede ao planeamento, execução e avaliação. Para que, desta forma, a funcionalidade do jovem possa ser melhorada ou potencializada uma nova competência, a nível emocional, físico, psicológico ou social. Nesta RTA é realizada, essencialmente, a promoção e treino das atividades de vida diária, as atividades instrumentais, a competência comunicacional e a competência relacional. Como enfermeira ESMP, tenho um papel crucial neste âmbito, pois faz parte das minhas competências, promover o caráter de adaptabilidade do jovem e o seu crescimento no sentido de uma vivência adequada nos seus processos de mudança.

O EESMP tem a competência de prestar cuidados de âmbito psicoterapêutico, socioterapêutico, psicossocial e psicoeducacional. As intervenções psicoterapêuticas desenvolvidas nesta unidade de treino são, essencialmente, a relação de ajuda, a psicoeducação, a reestruturação cognitiva, o aconselhamento, a estimulação cognitiva, o relaxamento por imaginação guiada e o relaxamento muscular progressivo.

A ferramenta privilegiada que utilizo na minha intervenção é a comunicação terapêutica, para que, desde logo, possa identificar as necessidades, as limitações e a potencialidade do jovem. Em que através da entrevista é estabelecido uma relação terapêutica, caracterizada pela confiança, o respeito, a segurança e a empatia, mas associada à assertividade, para poder desenvolver normas e rotinas de funcionamento. Para que possa permitir a mudança comportamental, o suporte psicológico, a psicoeducação, a resolução de problemas, a resolução de conflitos e de situações de crise. E, assim, poder promover uma saúde mental positiva, aumentar a motivação, a tomada de decisão, a autorresponsabilização, a autorregulação emocional, aumentar a autoestima, melhorar o humor, o coping eficaz, o autoconceito e o autoconhecimento.

Nas intervenções psicoterapêuticas têm-se sempre como pressuposto que a relação terapêutica ganhe dimensão, tendo sempre por base as questões ontológicas, ou seja, o significado atribuído à doença, o potencial para a mudança e as capacidades e competências para a mudança.

A intervenção por parte do enfermeiro ESMP enquanto facilitador no processo de modificação de comportamentos, cognições, emoções e outras características pessoais do jovem. O ESMP é, essencialmente, um agente que deve transmitir a esperança e o otimismo, mas de outra forma, tem que ser um contentor emocional que pode fazer a diferença nas mudanças de comportamentos e autorregulação das emoções (sentimentos e pensamentos). O objetivo central do enfermeiro ao utilizar esta intervenção não será resolver o problema do jovem, mas ser elemento facilitador na tomada de decisão, no sentido de o resolver, o que se traduzirá na evolução ou resolução dos diagnósticos de enfermagem. O enfermeiro, no contexto de negociação dos cuidados e do processo assistencial que promove, permite ao jovem a possibilidade de fazer escolhas informadas no seu percurso de recuperação, promovendo a sua independência.

Por outro lado, devemos ter sempre em conta os elevados níveis de emoção expressa que os progenitores dos jovens manifestam e orientar sobre as melhores estratégias de forma a minimizar o impacto que esta interfere no funcionamento do jovem.

Autor: 
Cátia Ferreira – Enfermeira Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
Foto: 
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