Incontinência Urinária: dos sintomas ao tratamento
Afeta mais de 200 milhões de pessoas em todo o mundo, pelo que a Organização Mundial de Saúde identificou esta patologia como um problema major de saúde pública sendo necessário sensibilizar a população para a importância de tratar esta doença. A incontinência urinária atinge cerca de 35% das pessoas com mais de 60 anos, sendo 2 vezes mais comum nas mulheres que nos homens, e a sua frequência aumenta com a idade, estimando-se que 50-85% dos idosos que residem em lares sofram desta patologia.
A pouca importância atribuída à patologia, considerada um “problema normal da idade” e o constrangimento em reportá-la podem estar na base do problema que se prende com o facto de apenas 5% dos indivíduos que apresentam sintomas de incontinência terem o diagnóstico e destes só cerca de 25% procuram ou recebem tratamento.
Tipos de incontinência e sintomas
Na verdade, não se deve falar em incontinência, mas sim incontinências, pois existem diversos tipos. A incontinência urinária é frequentemente classificada em três tipos principais: incontinência de urgência, incontinência de esforço e incontinência mista (quando ambos os tipos estão presentes).
Outros tipos incluem a enurese noturna (urinar a dormir), incontinência urinária contínua, incontinência insensível, incontinência postural e incontinência por extravasamento. Todas estas têm causas, métodos de diagnóstico e tratamento diferentes, pelo que carecem sempre de uma cuidada avaliação médica.
As circunstâncias em que a incontinência ocorre e os sintomas associados variam consoante o seu tipo. Na incontinência de esforço, a perda ocorre associada a esforços (por exemplo no contexto de tosse, um espirro, movimentos ou esforços). É típica das mulheres de meia-idade, multíparas ou submetidas a cirurgias ginecológicas, mas também pode ocorrer nos homens submetidos a cirurgia prostática. Na incontinência de urgência, a perda involuntária de urina está associada a uma súbita necessidade de urinar. Este tipo de incontinência está integrado num conjunto mais vasto de sintomas, designados de bexiga hiperativa, que se caracteriza por urgência miccional, com ou sem incontinência, normalmente associada a frequência urinária aumentada diurna e noturna. Na incontinência mista, ambos os tipos de sintomas estão presentes podendo variar a sua intensidade.
A presença de sangue na urina, a dor e a má resposta aos tratamentos são alguns dos sinais de alarme para a possibilidade de a incontinência ser secundária a doenças mais graves, nomeadamente o tumor da bexiga.
Fatores de risco e Prevenção
A incontinência urinária é um sintoma que, nas mulheres, está frequentemente relacionado com a diminuição da função dos músculos pélvicos. Fatores de risco importantes e comuns são a
gravidez e os partos por via vaginal, sobretudo traumáticos, bem como o estado de pós-menopausa. A incontinência pode igualmente associar-se a prolapso de órgãos pélvicos (bexiga, reto ou útero “descaídos”), a cirurgias pélvicas e à obesidade. Nos homens, a hiperplasia benigna da próstata e as cirurgias prostáticas estão frequentemente envolvidas.
Tanto em homens como em mulheres, outros tipos de doenças podem estar na origem ou contribuir para o agravamento da incontinência urinária - são exemplos as infeções urinárias, diabetes, insuficiência cardíaca ou doenças neurológicas. Estas últimas são responsáveis por uma percentagem significativa das incontinências difíceis de tratar e que carecem de maior atenção. O tratamento ou controlo desses fatores pode ajudar a prevenir a incontinência. São exemplos o controlo de peso, hábitos de vida saudáveis, a ginástica pré-parto e o controlo das doenças concomitantes.
Diagnóstico e Tratamento
O diagnóstico é habitualmente fácil e quase sempre feito pela história clínica e pelo exame objetivo do doente, apoiados por exames simples, sendo que avaliações mais complexas reservam-se para casos complicados. Após o diagnóstico, a avaliação do impacto na qualidade de vida é um ponto crítico para a planificação da estratégia terapêutica.
A incontinência urinária tem tratamento em 85% dos casos, pelo que é essencial quebrar o tabu e a vergonha ligada a este problema e incentivar os doentes a consultar o médico. O tratamento desta patologia é muito variado e faseado. Revestem-se de particular importância os tratamentos conservadores, que devem estar sempre presentes em todas as fases da doença. Estes incluem mudanças do estilo de vida e reabilitação do pavimento pélvico (fisioterapia pélvica).
As mudanças do estilo de vida passam por alterações alimentares (evitar alimentos picantes, álcool, café, chá, bebidas gaseificadas) e treino vesical em doentes com incontinência de urgência; gestão de líquidos ingeridos; regularização da função intestinal - tratar a obstipação - e perda de peso.
A reabilitação do pavimento pélvico é utilizada para melhorar o seu suporte muscular e é efetuada com recurso a exercícios do pavimento pélvico. Os programas de reabilitação devem ser supervisionados e dirigidos por profissionais de forma a otimizar os resultados.
Como complemento aos tratamentos conservadores, existe para a incontinência de urgência e bexiga hiperativa o tratamento farmacológico (em comprimidos), que melhora os resultados. Nos casos em que não se alcança o resultado desejado, pode-se recorrer a técnicas cirúrgicas minimamente invasivas (injeção de toxina botulínica ou neuromodulação de raízes sagradas). A incontinência de esforço, quando não é possível ser tratada com medidas conservadoras, tem tratamento geralmente cirúrgico (colocação de fita para sustentação da uretra). É uma cirurgia minimamente invasiva e com elevada taxa de sucesso.
Mensagens finais
Infelizmente, a incontinência urinária é ainda um tema tabu. A maioria dos doentes não procuram avaliação médica por provável estigma social. Há inclusivamente uma franja significativa da população que acha que a incontinência urinária é “normal” a partir de certa idade e que, portanto, não há nada a fazer.
Por outro lado, muitos profissionais de saúde não estão ainda suficientemente sensibilizados para a importância e frequência desta doença, pelo que é uma condição subdiagnosticada, com um atraso de 6-9 anos no diagnóstico e tratamento.
Torna-se por isso premente alertar consciências para este problema, não só trazendo-o à discussão pública, mas também explicando que não é necessário sofrer diariamente com esta doença. Pelo contrário, há tratamentos eficazes que podem devolver qualidade de vida à maioria dos doentes que dela sofrem.