Opinião

A importância da psicologia numa Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental de Infância e Adolescência

Atualizado: 
01/08/2022 - 09:56
A intervenção psicológica com adolescentes e jovens em contextos de acompanhamento e internamento em unidades de saúde mental tem-se mostrado, cada vez mais, premente. Compete ao psicólogo contribuir para auxiliar o seu paciente na perceção e no encontro de estratégias auxiliadoras na dor e no adoecimento do mesmo, baseando o seu trabalho no respeito, na promoção da liberdade. da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano. O seu papel remete à etimologia da palavra "salvar almas".

A saúde mental de uma população é determinada por um vasto conjunto de fatores que transcendem, em larga escala, as respostas efetivas para cada população, sobretudo no caso dos cuidados continuados integrado em saúde mental na infância e na adolescência.

Sabemos que uma adequada intervenção numa fase inicial de um transtorno mental, tem benefícios, tais como: uma recuperação mais célere e evidente, conservação de aptidões e funcionalidades, suportes sociais e familiares e melhoria do prognóstico global. Estes benefícios refletem-se, consequentemente, na melhoria do prognóstico geral do paciente, nas taxas de internamento e mesmo na taxa de mortalidade em saúde mental. As pessoas que sofrem de patologias do foro mental, carregam, ao longo de toda uma vida, inevitavelmente, um estigma. Este acaba por interferir na sua procura de tratamento antecipado, o que resulta, muitas vezes, numa intervenção tardia em episódios de crise agravados por anos de patologia não diagnosticada e alvo de intervenção. Assim, urge elaborar estratégias que permitam a interferência antecipada dos profissionais de saúde mental, visando reduzir a incidência e a gravidade das consequências dessas patologias. Em suma, é evidente que, quanto mais cedo os transtornos mentais forem diagnosticados, melhor será o seu prognóstico. Neste âmbito, o modelo RECOVERY tem-se mostrado de real eficácia no que concerne ao tratamento de adolescentes e jovens. O conceito de recovery não tem uma tradução exata para o português, mas podemos assemelhá-lo, numa tradução literal, a recuperação ou terapeuticamente restabelecimento de funções. O princípio norteador deste modelo de intervenção assenta na premissa de que é possível que um indivíduo portador de um transtorno mental, ainda que grave, recupere uma vida significativa e funcional. Este processo fornece uma visão holística do transtorno mental que passa a concentrar-se no indivíduo como um todo e, não apenas, na sintomatologia decorrente da sua patologia. A recuperação de uma patologia psíquica grave é possível, trata-se de um caminho a percorrer e não de um destino inevitável de segregação. Não se trata de voltar a ser o que era antes do aparecimento da patologia, acontece com oscilações e, como a vida, tem muitos altos e baixos.

No que concerne à intervenção na infância e na adolescência, é primordial a existência de uma equipa profissional multidisciplinar (psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, enfermeiros, monitores, entre outros) que abranja todas as áreas da vida do jovem. É também necessária a intervenção e envolvimento do contexto familiar, assim como, o comprometimento dos pares. Pretende-se que esta população trabalhe e adquira conceitos como: a conexão, a esperança, a identidade, o significado e o empoderamento.

Centrando-me, agora, na Instituição RECOVERY IPSS, os jovens encontram dois espaços com respostas distintas, mas que se complementam.

A USO (Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental na Infância e Adolescência, unidade sócio ocupacional - ambulatório). Tem como objetivo principal desenvolver programas de reabilitação psicossocial em jovens com perturbações mentais (desenvolvimental ou de personalidade) com reduzido ou moderado grau de incapacidade psicossocial, estáveis do ponto de vista clínico O espaço físico situa-se em comunidade e a sua intervenção é realizada em articulação com os serviços de saúde mental da infância e da adolescência, beneficiando de serviços de consultoria e supervisão técnica. Esta unidade dispõe de uma equipa multidisciplinar com o objetivo de assegurar níveis adequados de qualidade dos serviços prestados

Outra resposta da RECOVERY IPSS é a UCCI-SM-RTA (Unidade de Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental) com o formato de residência de treino de autonomia em regime de internamento. Esta unidade também se localiza na comunidade e tem como foco principal o desenvolvimento de programas de reabilitação psicossocial e terapêutica em jovens que apresentam patologias mentais graves e moderado grau de incapacidade, clinicamente estabilizados. Neste espaço, os jovens treinam as suas competências no âmbito das suas rotinas, apoiados por uma equipa multidisciplinar que desenvolve atividades no âmbito terapêutico e assegurando a estes jovens os cuidados e supervisão que ainda necessitam nesta fase.

Focando o papel do psicólogo, sempre no contexto de uma equipa multidisciplinar, é fundamental ter como objetivo primordial melhorar a qualidade de vida e o bem-estar psicofísicosocial e relacional do paciente. Neste caso, dos adolescentes e jovens, acompanhando os comportamentos e funções cognitivas no que remete às dimensões da vida: individual, familiar, escolar, profissional social e comunitária em todos os contextos do desenvolvimento humano, tais como, na infância, na adolescência e na idade adulta, em situações de promoção da saúde mental e/ou gestão da doença mental. O trabalho do psicólogo engloba, também, o diagnóstico, o suporte, as condições de reabilitação, utilizando, para tal, recursos específicos.

Culmino, parafraseando Fernando Pessoa:

"A criança que fui chora na estrada. Deixei-a ali quando vim ser quem sou. Mas hoje vendo que o que sou é nada, quero ir buscar quem fui onde ficou.”

Autor: 
Vera Limpo Trigueiros - Psicóloga
Nota: 
As informações e conselhos disponibilizados no Atlas da Saúde não substituem o parecer/opinião do seu Médico, Enfermeiro, Farmacêutico e/ou Nutricionista.
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